Os tucanos
– pelo menos os daqui – violam os ninhos
e comem os filhotes, cortando caminho em direção
aos repastos, nada deixando para pais legítimos.
Os petês, que já foram os predadores dos
tucanos, arrasando sua estirpe e plumagem, em episódios
de poucos anos atrás, foram atingidos por estranha
doença, perdendo sua memória mais recente,
também a memória um pouco mais distante,
agora também perdendo sua memória remota,
só restando a memória sentimental, aquela
que o mal de Alzheimer deixa por último, para
que a criatura tenha uma derradeira forma de conexão
com a vida, agora a vida pregressa e longínqua,
a que fala de sindicatos heróicos, greves memoráveis
e eventos que orgulharam a nós todos.
Salvo uma clonagem milagrosa e não prevista ainda
pela Ciência, o óbito se aproxima velozmente.
O chupin (Molothus bonariensis) anda por perto dos tico-ticos,
em cujos ninhos põe seus ovos, assegurando a
criação de seus filhotes. São conhecidos
e odiados por não serem portadores de moral ou
ética, também se notabilizando pelo nenhum
trabalho. É um pássaro aproveitador, tipo
petebê, marginal e eficiente usuário de
vitórias alheias, além de cordial amigo
de toda forma de poder.
As raposas são uma forma elegante e folclórica
de rapina, servindo-se de galinheiros para devorar aves
e chupar seus ovos. Atacam à noite, de preferência,
quando o mundo dorme e também dormem seus alvos
prediletos. Costuma olhar parreiras de uvas, sabendo
quando os frutos ainda estão verdes. Penso que
haja mais raposas no Congresso que nestas matas amenas,
onde vivo.
Os corvos se servem de carne em estado de putrefação,
banqueteando sobre a morte, recente ou não, de
suas presas. Transformam-se em abutres, com sérias
variações em relação à
ética e a moral. Rondam as terras, onde tudo
vêem e cheiram de modo privilegiado. Vigiam os
céus e as terras, em seus vôos inteligentes
e, até, poéticos, exibindo beleza de movimentos,
servindo-se dos ventos para flanar sem esforço.
Há entre os homens subespécies que se
deliciam com a desgraça alheia, rondando seus
passos, à procura do momento certo para cair
sobre os despojos de seus semelhantes, apropriando-se
de bens e patrimônios, via lei e de modo legal,
embora sem amparo moral ou ético, coisas que
pouco importam aos abutres forenses, onde exercem sua
condição de rapinadores de seus assemelhados,
conservando poses e posições sociais,
para consumo externo.
Aves, bichos e os bichos-homem guardam semelhança
no fazer e no usar. São quase iguais, embora
os pássaros e os bichos vivam carregados de razões
que se avizinham de uma moral de sobrevivência,
nem sempre defensável, mas com defensores importantes,
como La Fontaine. Os abutres humanos não se salvam
nem em Balzac, mas sua punição tem a ver
com a consciência que não possuem.
Gosto do assunto e voltarei a ele.
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