Por Pedro Venceslau
pedrovenceslau@portalimprensa.com.br
Fotos: Paulo Figueiredo (Record)
Boris
Casoy:
"O PT pressionou a direção
para me tirar da Record"
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Boris
Casoy tem 63 anos, sendo 48 como jornalista profissional.
Filho de judeus russos, Casoy começou a trabalhar
aos 15 anos, como locutor na Rádio Piratininga. Teve
passagens como narrador de jogos de beisebol, foi assessor
de imprensa de políticos, chefiou a redação
da Folha de S.Paulo durante a transição para
o regime democrático, comandou o TJ Brasil, no SBT
e, atualmente está na Record.
No
comando do Jornal da Record, tem feito a cobertura mais
incisiva da escândalo do "mensalão".
Nesta entrevista exclusiva para Jornal CONTATO e Portal
IMPRENSA, Casoy revela que o PT pressionou violentamente
a direção da Record para que ele fosse demitido.
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CONTATO
- Você sofreu muita pressão do governo e do PT?
Boris – Muita... Mas muita mesmo...No começo da administração
do PT, pressionaram a direção violentamente para me
tirar da Record. Ameaçaram até a cortar a publicidade.
A diretoria me pôs ao par o tempo todo. Só acabou no
dia 13 de fevereiro, quando aconteceu o caso Waldomiro.
CONTATO
- Por que?
Boris – As razões da pressão eram as mais estúpidas
possíveis. Eles me atacaram muito no caso do BANESTADO. E
agora eu entendo porque... pelo menos eu suponho.
Fizeram um grande pressão...Não sei se a diretoria
vai gostar... Queriam que eu não cobrisse mais o caso Celso
Daniel. E olha que eu cobria de maneira absolutamente neutra. Eu
não podia ligar o Roberto Texeira ao Lula. Nem dizer que
era amigo do Lula.
CONTATO
- Eles chegaram a te processar?
Boris – Não, porque não fiz acusação
nenhuma. Eles, no começo do governo, não suportavam,
por exemplo, que nós pusemos um debate no congresso no ar,
onde, ao invés de terminar com o PT, a discussão terminava
com a oposição, com o [senador Arthur] Virgílio
(PSDB). Foram reclamações diárias. Diziam que
eu era tucano.
CONTATO
- Em termos de verba publicitária, houve cortes? As fontes
em Brasília secaram?
Boris – Houve ameaças. Em termos de fonte tive que
me virar, mas acho que todo mundo teve que se virar. Menos a Globo
que teve todas as fontes. O presidente na noite em que ele ganhou
, disse "Bom, eu preciso sair porque estão me esperando
num outro compromisso", e ele saiu pra dar entrevista na Globo,
sentou na mesa do Jornal Nacional. [Mas] Isso é um problema
dele, virtude da Globo e incompetência nossa.
CONTATO
- Sua relação com o governo melhorou?
Boris – Melhorou. Eu converso sempre com o Gushiken. Ele não
é acessível, foi ele que me procurou. É uma
pessoa que eu gosto.
CONTATO - Existem muitas coincidências entre o escândalo
de 1992, que culminou no impeachment do Collor, e o escândalo
do mensalão. Essas denúncias podem derrubar o presidente
Lula?
Boris – Existe uma diferença extremamente forte entre
os dois processos. O Collor, em 1992, tinha rompido praticamente
com toda a elite brasileira. Já o Lula tem o apoio decidido
das elites. Os interesses dos grupos que permeavam os dois processos
políticos eram opostos. O Collor havia desafiado os bancos,
a FIESP, a indústria automobilística... Ele tinha
contra si a elite brasileira. Aí apareceu o Pedro Collor,
o motorista, e as coisas esandaram. Hoje, não há interesse
da elite brasileira em prejudicar a administração
do Lula.
CONTATO
- Quando você fala em elites, você inclui os donos dos
grandes meios de comunicação?
Boris – Não, eu estou falando na elite em geral. Os
donos dos meios de comunicação na maioria são
neutros.
CONTATO - Em 1997, FHC passou batido pela crise e se reelegeu. Aquela
crise foi tão grave ou maior do que esta agora?
Boris – O Fernando Henrique estava muito bem blindado diante
daquela crise. As figuras que estavam no front da crise eram menores.
A habilidade dos "operadores do Fernando Henrique" também
era maior do que a habilidade dos operadores do Lula.
CONTATO
- Segundo muitos petistas, se existe "mensalão"
para comprar deputados, isso aconteceria em nome de um projeto político.
Boris – Vou avançar... Eu fui surpreendido, nos meus
últimos 40 anos de jornalismo, por pessoas nas quais eu acreditava
e, repentinamente, foram cercadas por um mar de corrupção.
Como eu tinha conversas francas com essas pessoas, me sentia à
vontade em questioná-las. E cheguei à seguinte conclusão:
existe um mecanismo de auto-defesa, um sistema imunológico,
que supostamente protege o caráter de quem está fazendo
isso. Todos eles, sem exceção, estavam usando essas
armas da corrupção dizendo que não era para
eles. Eu vivo dizendo: "todos os partidos são iguais",
inclusive o PT. Tudo começa com a campanha eleitoral.
CONTATO - Você acredita ideologicamente no PT?
Boris – Não. A máquina está lá,
de boca aberta. É aquilo mesmo que o Jefferson disse, sobre
a "síndrome da bstinência": ‘os pásssaros
de biquinho aberto esperando a comida".
CONTATO
- Será que só é possível construir uma
maioria sólida no parlamento usando esse tipo de esquema?
Boris – O país precisa de uma reforma política.
Não agora, porque seria apenas um socorro. É preciso
que a reforma política não seja fatiada, mas sofisticada.
O que não pode acontecer é o Brasil ter um presidente
da república refém.
CONTATO
- Você acredita que existem indícios para que seja
levantada a bandeira do "Fora Lula"?
Boris – Eu não vou falar em um "Fora Lula!",
não defendo isso. Deve haver um processo em que as pessoas
se convençam de que isso é verdade. Quando você
fala em prova testemunhal, você fala em prova com valor jurídico.
Collor foi absolvido em todos os processos Segundo a decisão
da justiça, o Collor pode voltar moralmente para o Palácio
do Planalto. O processo de impeachment é político.
Tem nuances jurídicas, mas é político. Quer
dizer: basta a maioria da CPI do Plenário estar convicta.
O processo é político e se dá dentro do parlamento.
CONTATO
- Você acha que o Lula conseguiu se descolar da crise?
Boris – Ele é o Presidente da República. Tem
um passado correto, honesto. Não quero incriminá-lo.
Mas existem algumas perguntas não respondidas. Se é
verdade que o Roberto Jefferson falou alguma coisa sobre isso, por
que o Lula não tomou nenhuma providência? Se ele tomou
algumas providências legais, porque elas não apareceram
até agora? Ele se omitiu? Ele não sabe o que se passa
sob o nariz dele?".
CONTATO
- Prevaricação?
Boris – Não. Se ele não sabe o que se passa,
ele é um incompetente.
CONTATO
- Ou ele prevaricou ou ele é um incompetente?
Boris – Eu não vejo outra saída. Seria menos
pior ser só incompetente. O governo está em pane.
Veja o que conteceu...O Roberto Jefferson fez aquela ameaça
e 48h depois o José Dirceu sai, sem que esteja escolhido
seu sucessor. Eu não sei o que os olhos do Roberto Jefferson
disseram naquela advertência. Não sei como o planalto
recebeu. Eu sei que funcionou. Essa história de que o José
Dirceu saiu pra poder se defender... Não existe melhor lugar
para se defender do que na altura do poder. Eles estão blindando
o Lula.
CONTATO
- José Dirceu foi irresponsável em 1997, ao pedir
o "Fora FHC!"?
Boris – Claro que foi. E ele reconhece que foi. Como eles
dizem: "quem está na oposição faz bravatas".
CONTATO
- O PSDB está sendo mais responsável ou é tudo
uma estratégia?
Boris – Não sei. Até esse instante, está
sendo mais sério do que foi o PT. Não interessa para
o PSDB, nesse instante, colocar em risco a democracia brasileira.
Aliás, não interessa pra ninguém. Também
o PSDB tem que olhar o entorno e ele é favorável ao
governo Lula. Os números da economia são bons. A economia
é a mesma que o PSDB fez. Os bancos estão com o Lula.
Não estou dizendo isso de uma forma pejorativa, mas existem
vários apoios que o Collor não tinha. O PSDB não
pode também romper com todo mundo.
CONTATO
– Vieram até com aquela história de que você
era do CCC (Comando de Caça aos Comunistas, no final dos
1960)?
Boris – Nunca fizeram ataque pessoal. Até porque muita
gente que estava lá, sabe que era mentira.
CONTATO
- O poder pode mudar o caráter das pessoas? O Zé Dirceu
de hoje parece o mesmo de antes?
Boris – Eu sempre tive uma relação respeitosa,
boa com ele, apertei ele também. Acho ele muito inteligente.
Eu não sei se aconteceu. Mas o comportamento não é
o mesmo. Houve gente que me disse, "Olha, vai ser um governo
mais autoritário", gente ligada ao PT, gente que disse
"você não sabe o que vai acontecer" e aconteceu,
e eu não acreditava. Eu achei que iria ter uma certa camaradagem.
Uma outra pessoa que não rompeu foi o Genoíno.
CONTATO
- Com o Fernando Henrique era mais tranqüilo?
Boris – O Fernando Henrique tem uma visão diferente
da imprensa. Tanto que nunca processou ninguém. Não
reclamava, não pedia a cabeça. Nem o Collor, nem o
Sarney, nem o Tancredo. O Tancredo me telefonava no jornal chorando
pitangas, mas é normal. Diziam, "olha que manchete e
tal".
CONTATO
- No filme "Entreatos", tem uma cena em que o José
Dirceu diz "Tire esse cara daqui!", que era o cineasta,
"não dá para confiar em ninguém".
Boris – Eu soube disso, mas eu perdi esse filme. No começo,
pensei que essa era uma blindagem natural de quem ia ser presidente
da república. Mas o Fernando Henrique não era assim.
Quando eu falo isso vão dizer que eu sou tucano.
CONTATO
- Você acredita que o PSDB e o PT, uma vez no poder, preferem
fazer acordo com a direita?
Boris – Do jeito que está, eles precisam fazer acordo
com quem tem voto. Não tem outro jeito. [Quando] o cara senta
naquela cadeira, ele quer fazer alguma coisa. Eu acho que o Fernando
Henrique, o Sarney, o Lula, possuem boa intenção.
Ninguém está lá dizendo, "quem é
que eu vou estrepar hoje?". Não existe isso. O cara
quer marcar o nome dele na história. Agora, ele chega lá
e vê aquele plano que ele mesmo classificou de 300 picaretas.
Como é que o cara vai fazer? Ele fez aliança com quem
ele pôde. E eu não vejo mal nenhum em ele fazer aliança
à direita. Mas aí tem essa circunstância, não
justifica, mas é assim, o cara fica refém. Ou então
ele não governa e vão derrubar o cara. Vide o Jânio
Quadros.
CONTATO
- Essa crise vai acabar em pizza, em reeleição...?
Boris – Não sei, eu não tenho um prognóstico.
Eu estou assustado. Eu sempre me assusto com esse processo. Quando
ele começou a ocorrer com o Collor, o Ulysses [Guimarães]
dizia "olha, temos que tomar cuidado, os milicos podem voltar".
Talvez essa coisa de dizer que é golpismo é mais pra
assustar as pessoas. O PSDB nunca dá golpe. Nem é
da matriz do PSDB. Ele não tem nenhuma tendência autoritária.
CONTATO
- O PT tem uma capacidade maior em aumentar as crises?
Boris – A crise surgiu dentro da base governamental. O Roberto
Jefferson não teve uma palha movida pela oposição.
O congresso estava paralisado pelo próprio PT [desde que]
elegeu o próprio Severino. Onde é que já se
viu perder uma eleição para presidente da Câmara
tendo maioria e ainda com o descontentamento do pessoal fisiológico
e também não-fisiológico, que concorre com
os fisiológicos, que precisa se eleger. O PT não deu
a devida atenção à base parlamentar e se afastou
da sua base social.
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