Após
os deboches contra a inteligência cidadã, nos “depoimentos”
de Silvio Pereira e Delúbio Soares, pensemos sobre dois nomes:
Celso Daniel e Paulo de Tarso Venceslau. O primeiro foi assassinado
por questões que hoje exibem no PT algo mais do que a hegemonia
política. Trata-se de atentado à fé pública.
Recebi ofício da Câmara Municipal de Diadema (número
902) com a “Moção de Apoio ao Prof. Roberto
Romano, da Unicamp, por suas críticas ao posicionamento do
governo federal na condução da investigação
do caso Celso Daniel”. Assumido pela Câmara, o voto
foi encaminhado pelo vereador José Dourado. É preciso
lutar contra a impunidade, inclusive na “esquerda”.
Paulo de Tarso Venceslau precisa ser convocado para depor nas CPI’s,
visto que, em 1995, ele escreveu uma carta ao então presidente
do PT, Luiz Inácio da Silva, denunciando crimes contra o
erário em prefeituras petistas. Os denunciados por Venceslau
nada sofreram, mas o acusador foi expulso do partido por ordens
de Lula. O fato mostra que o presidente da República reserva
o castigo para quem denuncia falcatruas e incentiva o erro. Daí,
para o que se passa atualmente no PT e no governo, não existe
solução de continuidade.
Elias Canetti, em Massa e Poder, analisa o poderoso enquanto sobrevivente.
A paixão o leva a praticar traições e vilanias
para garantir o trono. Traição é técnica
comum dos príncipes. Canetti cita o caso de Flávio
Josefo, o historiador judeu que lutou contra o imperialismo romano.
Em certo momento, na companhia de outros guerrilheiros, ele só
encontrou abrigo num buraco sem saída. Cercado o grupo, ocorre
um pacto de morte coletiva “para não perder a honra”.
Josefo, astuto poderoso, convenceu os seus pares de que a matança
eficaz seria a de cada um após o outro. Os indivíduos
em fila terrível matavam o próximo da lista. Josefo
arrumou as coisas para ser o último. Entregou-se aos romanos
e viveu bom tempo. Todo poderoso sobrevive ao modo de Flávio
Josefo. Quanto maior o seu Estado, mais gente segue para os braços
da morte confiando em suas palavras. Hitler e Stalin levaram milhões
para o Nada, mas não foram os únicos.
Luis Inácio da Silva sobrevive. Mesmo a hagiografia de sua
origem humilde traça o roteiro ao modo de Canetti. Ele sobreviveu
aos operários do ABC, esquecendo-os e deixando suas antigas
reivindicações para trás. Se Josejo aderiu
aos romanos, ele aderiu às “negociações”
com a Avenida Paulista. Enquanto mantinha para as massas a fala
de um radical (chegou a cogitar luta armada, já no regime
civil), com os empresários ele usava o discurso conciliador.
Jogando com essas duas faces, conseguiu, gradativamente, galgar
os vários níveis de poder. Analistas do PT afirmam
que ele sempre esteve acima das várias tendências que
se matavam no partido. Na verdade, ele sobreviveu com a técnica
de Josefo: enquanto as facções se destruíam,
ele subia na escala do poder. Na presidência, silenciou quando
foram expulsos os “radicais” em processos comandados
pelo grupo “Genoino assinei sem ler”, “Dirceu
nada vi de Waldomiro”, “Delúbio só eu
somos o culpado” e “Pereira Land Rover”. Ele aceitou
o “apagão” sobre Celso Daniel, inclusive, os
atos de Dirceu para intimidar a imprensa e o Ministério Público.
Todos assistiram a um triste espetáculo quando ele fugiu
do debate sobre a morte do prefeito Toninho. Josefo rendeu-se aos
romanos, ele rendeu-se às finanças. A Febraban o considera
um herói, os empresários nem tanto. O último
ato de sobrevivência, talvez o seu erro fatídico, foi
a “entrevista” de Paris na qual o roteiro é o
mesmo usado por Delúbio e Valério. Ele manda o PT
às urtigas (“fui presidente do PT há muito tempo”,
“o PT precisa se explicar”) e tenta… sobreviver.
As oposições, a imprensa, as pessoas sérias
do Brasil precisam ter cuidado com o mestre da sobrevivência.
É temerário aceitar “negociações”
propostas por ele para “salvar a governabilidade”. Quando
recebe ajuda de “companheiros” ou da oposição,
Lula age como Josefo. Acuado, manda a polícia prender oponentes,
para “equilibrar” as notícias fedorentas que
vêm da sede petista. A sua polícia invade escritórios
de advocacia. Confiar na sua palavra diplomática é
seguir, como os amigos de Josefo, rumo ao desastre. Cautela deve
ser empregada no seu possível impedimento. Sobrevivente,
ele radicalizará a tese ridícula, mas sempre eficaz
quando se trata de inteligências pequenas, de um “golpe”.
E se for defenestrado sem evidências cabais de sua parceria
na farsa imunda que seus subordinados representam nas CPI’s,
um sebastianismo idiota (os sebastianismos sempre são idiotas)
pode preparar seu retorno ao poder. Então, para que ele sobreviva,
muitos brasileiros serão jogados nas águas de Caronte.
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