Os discursos moralistas sapecados pelos deputados amorais
no palco mais privilegiado do país têm
levado o povo a um crescente assombro diante do que
vê, ouve, lê e, em seguida, pode falar.
Monteiro Lobato, que nos ensinou o caminho do escrever,
falar, ouvir e ver, por meio da leitura, deve dar pinotes
em seu túmulo, vendo, ouvindo, lendo o que falam
os deputados amorais sobre pregações moralistas
dignas de cursos de oratória da mais reles periferia
cultural brasileira.
Não me embalo em maior erudição
(até porque não freqüento essa área),
mas pregar implicava fazer chegar a palavra do Senhor
aos seus fiéis, por meio de um pregador, quase
sempre um sacerdote. Também significava fazer
chegar uma tábua a outra, porque pregar vem de
plicar, que resultou em chegar. O que se observa é
que o verbo tem o mesmo significado, mesmo quando usado
em acepções diferentes.
O que pregam nossos congressistas? O que fazem chegar
a nós, atônitos ouvintes desse campeonato
de bandalheiras? Talvez provoquem um sentimento de saudade
do Padre Vieira e de um Rui Barbosa grandiloqüente
e chato, mas posto do lado da verdade. Essas figuras,
na versão 2005, atendem por nomes menos prestigiosos
de Roberto Jefferson e Waldemar da Costa Neto, os atuais
arautos da sabedoria, contando com platéias que
matariam Jesus de inveja.
Estamos atentos ao que dizem e nos filiamos como torcedores
de suas posições, sempre celebrando que
inventaram um neologismo, propondo uma nova palavra
“mensalão” à nossa combalida
língua portuguesa, assaltada por toda forma e
vocabulário inglês. Não desta vez,
contudo, pois o neologismo deriva do melhor latim, mensis.
Só isso, já me dá um orgulho que
faz arrebatar meu patriotismo vocabular.
Há muitas virtudes nesse constrangedor debate,
a começar pela virtude da franqueza, quando um
deputado chama o outro de mentiroso, sem que a face
ofendida mova um só músculo, para horror
da memória de meu pai, inconciliável com
o termo e suas práticas.
O torneio de mentiras prosseguirá em outros púlpitos
de nossa civilização movida a depósitos
bancários, caixa 2, mas não estamos atentos
ao aval que emprestamos a esses atores de um teatro
que envergonharia os gregos e suas tragédias,
quase sempre atrás de dramas provocados pelo
amor.
Creio que nenhum dos personagens agora pilhados do outro
lado do caixa do varão Marcos Valério
é novato nessas artes, mas têm renovado
seus mandatos por nós, os eleitores. Diante disso,
não parece lógico que os punidos sejamos
nós, os eleitores cínicos que os reconduzem
ao parlamento? Em nome da moral, ética, bons
costumes, cassem nossos títulos. Por favor.
|