Por: Luiz Gonzaga Pinheiro - espesspei@uol.com.br

Adagio molto e cantabile

A meu lado, sim, ao meu lado tenho toda a grande Orquestra Filarmônica de Berlim tocando o que reputo como o ponto mais alto da música, esse adágio molto e, além disso, cantabile.
Flui, nada menos que isso, flui o adágio, esse longo discurso sobre a paz, profundo discurso sobre a paz do mundo, a paz interior das gentes,a paz da paz, paz essencial, muita e grande paz, ademais de paz, cantabile.
Sempre que minhas aflições me pedem calmante ou outra providência da Medicina, vou atrás da paz do adágio da nona sinfonia, ali encontrando o clima e o socorro de que sempre pre-ciso. Ele me vem como um anjo viria, se acreditasse em anjo e outros duendes da magia religiosa. Não só vem e me devolve ao melhor de mim, como vem presto, tão ou mais rápido que uma viatura dos bombeiros, com propósitos iguais, o de apagar meus incêndios de alma, que são muitos e constantes, como obriga a vida de quem vive no jornalismo e do jornalismo.
Sei que não falo de providências que têm a ver com o receituário mais comum de nossa farmacologia científica ou mesmo da “medicina rural”, da qual também sou próximo, por viver entre os meus, os caipiras, meus vizinhos. Eles tomam água com açúcar e outras mesinhas de igual simplicidade e poder. Eu, por mim, derivo para o luxo de poder me tratar com Beethoven, em seu melhor momento.
Tem sido assim. Assaltado pela doença da tensão emocional, embarco com toda minha bagagem, carregada de esperança e é certo que, além da cura, terei dezesseis minutos e vinte e oito segundos de uma terapia musical que faria a inveja dos doutos no as-sunto.
Depois de já curado, ainda posso deixar correr a gravação e gozar do supremo prazer de ouvir a “Ode à Alegria”, escrita por Schiller e musicada pelo mestre de Bonn. Assim, com esta gigantesca proclamação, ela começa: “Amigos, não sejamos ape-nas vozes/ mas, sim, entoemos nosso canto/ com mais prazer e mais alegri-a./Alegria, centelha divina..."
Sei que a musicoterapia faz milagres, curando os doentes de aflições de amor e outras de igual gravidade. A música faz mais do que curar. Ela, por “ser o barulho que pensa”, vai até onde pede a conveniência humana: ela “absorve o caos e o ordena”, como raciocinou Nogueira Moutinho. Mediquem-se, curem-se, ouçam música.


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