Na terça-feira, 30, recebi telefonema de Ana Maria da Silva
Dias informando que Jacques, seu marido, acabara de falecer no hospital
Osvaldo Cruz, vítima de um enfarto. Depois de convulsivo
choro, passei a rememorar os bons momentos de passamos juntos e
o orgulho que sinto por ter sido seu amigo por tanto tempo.
Conheci Jacques Breyton em 1968 quando fui um dos organizadores
das manifestações estudantis que marcaram aquele período.
Eu e meus companheiros estranhamos a recorrente presença
daquele gringo de cabelos brancos que participava ativamente de
nossas passeatas. Não conseguíamos entender aquele
homem (tinha 47 anos na época) muito bem vestido protestando
contra a ditadura militar. Até descobrirmos sua história
de vida, Jacques, foi seguido inúmeras vezes por estudantes
que faziam parte do esquema de segurança do movimento estudantil
da época.
Na França, Jacques combateu os nazistas alemães que
invadiram seu país. Em Lyon, sua cidade natal, foi um dos
chefes da Resistência Francesa local e é reconhecido
como um “Ancien Combatent”, velho combatente, honraria
que muito francês gostaria de possuir.
Foi preso pela Gestapo, polícia política alemã.
Torturado, nada revelou e foi libertado, em Lyon, pelas tropas americanas
no final da guerra. Em 2001, quando completou 80 anos, viajamos
mais de 4.000 quilômetros pelo interior da França.
Uma viagem inesquecível sob todos os aspectos. Em Lyon, nossos
papos eram verdadeiras aulas ao vivo sobre detalhes da Resistência.
Jacques conhecia cada prédio antigo e todas as ligações
que possuíam entre si. Tinha prazer em relatar as emboscadas
que fazia contra as tropas invasoras.
Nos anos de chumbo, no Brasil, embora fosse um industrial rico e
bem sucedido, não abriu mão dos valores que o fizeram
se engajar na Resistência Francesa. Nossa amizade já
era tão grande que me acompanhou na militância mais
radical. Foi preso e torturado pela repressão política.
Foi torturado pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, juntamente
com Nair Benedicto, sua esposa na época, mãe de seus
três filhos brasileiros.
Nanette, Danni e Dido, seus filhos brasileiros, eu os tenho como
sobrinhos. A relação sempre foi tão forte que
minha irmã dizia que meus verdadeiros sobrinhos eram os filhos
de Jacques. De fato, creio que convivi mais tempo com a família
Breyton do que com a minha.
No final dos anos 70 e começo dos 80, Jacques, um industrial
muuito bem sucedido no setor metalúrgico, apoiou abertamente
o movimento sindical. Para ele, não seria possível
construir um mundo socialista dos seus sonhos sem a participação
direta dos trabalhadores organizados. O passo seguinte foi ajudar
na criação do Partido dos Trabalhadores. Foram muitas
as reuniões que Lula realizou em sua casa com lideranças
políticas e sindicais. Jacques apenas queria colaborar.
Meu embate contra o compadre de Lula quase abalou nossa amizade.
Jacques achava que eu teria exagerado na dose. Mais de uma vez ele
me trouxe recado da cúpula petista que queria saber quais
seriam minhas reais pretensões. Minha resposta sempre foi
a mesma: apurar a verdade e punir os culpados.
Parei de fazer críticas ao PT na sua presença para
preservar nossa velha amizade. Nossos jantares regados por longas
conversas assumiram uma importância muito maior do que nossas
possíveis divergências.
Suas últimas participações políticas
estão registradas no livro autobiográfico que acabara
de escrever e no seu depoimento para o documentário sobre
o lendário Apolônio de Carvalho, um oficial do exército
brasileiro que combateu ao lado das forças populares na Espanha
e da Resistência Francesa, preso pela ditadura militar e um
dos 40 presos políticos libertados em troca do embaixador
alemão, em 1970.
Os escândalos envolvendo o PT que tomaram conta do noticiário
político deixaram-no profundamente magoado. O partido que
ajudara a fundar e construir precisava ser depurado. Jacques já
havia entrado em cena com a invejável disposição
e bom humor que sempre foram sua marca registrada.
Não se faz mais heróis como antigamente.
Reunião entre amigos na casa de Paulo de Tarso
Reunião
entre amigos na casa de Paulo de Tarso
Jacques
e Eliana
Jacques
na intimidade de Ilhabela onde se refugiava com Ana
Jacques,
Ana e Luis Betarello
Peta,
Ana, Jacques e Eliana
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