Por Paulo de Tarso Venceslau

Jacques Breyton: morte de um herói

Combatente da Resistência Francesa quando os alemães invadiram seu país nos anos 40, preso pela Gestapo e pela ditadura militar no Brasil, Jacques Breyton faz parte de uma galeria de heróis que nunca fez questão de holofotes.


Na terça-feira, 30, recebi telefonema de Ana Maria da Silva Dias informando que Jacques, seu marido, acabara de falecer no hospital Osvaldo Cruz, vítima de um enfarto. Depois de convulsivo choro, passei a rememorar os bons momentos de passamos juntos e o orgulho que sinto por ter sido seu amigo por tanto tempo.
Conheci Jacques Breyton em 1968 quando fui um dos organizadores das manifestações estudantis que marcaram aquele período. Eu e meus companheiros estranhamos a recorrente presença daquele gringo de cabelos brancos que participava ativamente de nossas passeatas. Não conseguíamos entender aquele homem (tinha 47 anos na época) muito bem vestido protestando contra a ditadura militar. Até descobrirmos sua história de vida, Jacques, foi seguido inúmeras vezes por estudantes que faziam parte do esquema de segurança do movimento estudantil da época.
Na França, Jacques combateu os nazistas alemães que invadiram seu país. Em Lyon, sua cidade natal, foi um dos chefes da Resistência Francesa local e é reconhecido como um “Ancien Combatent”, velho combatente, honraria que muito francês gostaria de possuir.
Foi preso pela Gestapo, polícia política alemã. Torturado, nada revelou e foi libertado, em Lyon, pelas tropas americanas no final da guerra. Em 2001, quando completou 80 anos, viajamos mais de 4.000 quilômetros pelo interior da França. Uma viagem inesquecível sob todos os aspectos. Em Lyon, nossos papos eram verdadeiras aulas ao vivo sobre detalhes da Resistência. Jacques conhecia cada prédio antigo e todas as ligações que possuíam entre si. Tinha prazer em relatar as emboscadas que fazia contra as tropas invasoras.
Nos anos de chumbo, no Brasil, embora fosse um industrial rico e bem sucedido, não abriu mão dos valores que o fizeram se engajar na Resistência Francesa. Nossa amizade já era tão grande que me acompanhou na militância mais radical. Foi preso e torturado pela repressão política. Foi torturado pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, juntamente com Nair Benedicto, sua esposa na época, mãe de seus três filhos brasileiros.
Nanette, Danni e Dido, seus filhos brasileiros, eu os tenho como sobrinhos. A relação sempre foi tão forte que minha irmã dizia que meus verdadeiros sobrinhos eram os filhos de Jacques. De fato, creio que convivi mais tempo com a família Breyton do que com a minha.
No final dos anos 70 e começo dos 80, Jacques, um industrial muuito bem sucedido no setor metalúrgico, apoiou abertamente o movimento sindical. Para ele, não seria possível construir um mundo socialista dos seus sonhos sem a participação direta dos trabalhadores organizados. O passo seguinte foi ajudar na criação do Partido dos Trabalhadores. Foram muitas as reuniões que Lula realizou em sua casa com lideranças políticas e sindicais. Jacques apenas queria colaborar.
Meu embate contra o compadre de Lula quase abalou nossa amizade. Jacques achava que eu teria exagerado na dose. Mais de uma vez ele me trouxe recado da cúpula petista que queria saber quais seriam minhas reais pretensões. Minha resposta sempre foi a mesma: apurar a verdade e punir os culpados.
Parei de fazer críticas ao PT na sua presença para preservar nossa velha amizade. Nossos jantares regados por longas conversas assumiram uma importância muito maior do que nossas possíveis divergências.
Suas últimas participações políticas estão registradas no livro autobiográfico que acabara de escrever e no seu depoimento para o documentário sobre o lendário Apolônio de Carvalho, um oficial do exército brasileiro que combateu ao lado das forças populares na Espanha e da Resistência Francesa, preso pela ditadura militar e um dos 40 presos políticos libertados em troca do embaixador alemão, em 1970.
Os escândalos envolvendo o PT que tomaram conta do noticiário político deixaram-no profundamente magoado. O partido que ajudara a fundar e construir precisava ser depurado. Jacques já havia entrado em cena com a invejável disposição e bom humor que sempre foram sua marca registrada.
Não se faz mais heróis como antigamente.


Reunião entre amigos na casa de Paulo de Tarso


Reunião entre amigos na casa de Paulo de Tarso

Jacques e Eliana

Jacques na intimidade de Ilhabela onde se refugiava com Ana

Jacques, Ana e Luis Betarello

Peta, Ana, Jacques e Eliana

 

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