É verdade: existe uma História
útil outra nem tanto. Uma é com solene “H”
maiúsculo; a com “h” minúsculo
refere-se às invenções tolas, mentiras,
fábulas. Há mesmo os que preferem usar “estória”
para diferenciar a grande História. Recentemente
reinventou-se o termo “memória” para
significar o que não é produto da História,
mas que corre como versão não oficial de fatos
passados. Discussão erudita de lado, vamos a uma
curiosidade interessante: a história do beijo.
O beijo na cultura ocidental ocupa lugar de destaque nos
comportamentos amorosos. Parentes, amigos e principalmente
amantes têm no beijo uma das expressões máximas
de seus sentimentos. E há variações
incríveis que vão do beijo convencional nas
faces, ao “selinho” que implica mera aproximação
dos lábios nos lábios, há ainda o famoso
beijo de língua e outros mais ousados. E como são
complicados os rituais que encerram regras culturalmente
definidas na base de quantos beijos dar, lugar, hora, posições,
duração.
Lembro-me de quando fazia pesquisa entre os índios,
ficar algo chocado pela não existência ou sequer
conhecimento do beijo entre eles. Contrariamente, achava
estranhíssima a demonstração máxima
de amor se resumir no fato dos amantes defecarem juntos.
Então, comecei a supor pesquisas sobre a tal História
(ou seria estória) do beijo. Logo que apresentei
o problema a alguns pesquisadores do comportamento, ouvi
explicações inteligentes que se resumiam nas
seguintes alternativas:
O beijo teria surgido em priscas eras, nas cavernas,
quando os pares precisavam se lamber para retirar da
pele do outro o sal necessário à composição
dietética básica;
Também
teria sido nas Cavernas que as dedicadas mulheres mastigariam
os alimentos para seus pares e filhos;
Darwin
defendia a origem do beijo apoiado em teorias evolucionistas
que mostravam o aperfeiçoamento das mordidelas
dos macacos que se preparariam para o ato sexual com
jogos de aproximação;
Segundo
alguns, o beijo na boca teria derivado de uma prática
romana onde os maridos ciumentos, amedrontados pelos
possíveis efeitos do vinho nas mulheres enfiavam
a língua em suas bocas a fim de verificar se
elas teriam bebido, ou não. |
Mesmo
que seja impossível saber a gênese do beijo,
existem elementos históricos que permitem alguma
instrução sobre o assunto. Sabe-se, por exemplo,
que Platão escreveu sobre o gozo produzido pelo beijo.
Da mesma forma são conhecidas as regras gregas do
século IV AC que permitiam apenas aos pais/filhos
o beijo na boca. A origem da palavra pode ajudar a compreensão
do fato, pois em latim existe três vocábulos:
o “basium”, aquele trocado fraternalmente, o
“osculum” dado na intimidade e o mais sofisticado
que era o “suavium” praticado por amantes. Também
é certo que a prática do beijo difundiu-se
ao ponto de os reis permitirem aos nobres o beijo nos lábios,
sendo que os plebeus deveriam apenas beijar-lhe as mãos
ou os pés. Logicamente, desde então, a Igreja
Católica assumiu a proibição reconhecendo
ser o beijo uma das práticas mais excitantes ou lascivas
e por isto condenáveis. Vale também lembrar
que atualmente há um dia – 13 de abril –
dedicado ao beijo. De toda forma, o beijo está aí
e serve, inclusive, para que eu termine esta breve viagem
à inutilidade da história enviando um beijo
respeitoso aos meus leitores.