Espelhos (clique)

Por: José Carlos Sebe Bom Meihy


Sebe revira o baú das boas e gostosas lembranças de um passado recente e recorda, como se fosse hoje, marcas e produtos inesquecíveis para uma geração.

Outro dia me surpreendi pensando nos momentos de “passagens”. Falo de tempo, calendário, idade. Tentava lembrar-me de quando me senti rapaz, depois do período de adulto e finalmente quando percebi que já era alguém da “terceira idade”. Antes, devo dizer que tenho enorme orgulho de minha história e gosto imenso de me sentir com sessenta e dois anos de idade. Acho que não deixei de experimentar nada que me fizesse voltar atrás para viver diferentemente. Mesmo meus erros, que não foram poucos, ajudaram-me tanto.

Creio que ainda jovem, senti que não era mais garoto quando comecei a pagar ingresso completo no cinema. Logicamente, as transformações biológicas e a revolução dos hormônios contribuíram para tudo, mas o fato determinante mesmo foi o fim da “meia” entrada. Adulto, senti-me, de verdade, quando fui convocado para ser júri em um julgamento no Fórum. Não sei se sofri mais frente à sentença ou por ter de assumir o universo dos “responsáveis”. Alguma coisa aconteceu também quando fui pai pela primeira vez, pois um gosto de eternidade fez a vida diferente. “Senhor” foi quando alguém gentilmente cedeu lugar para mim em um ônibus lotado e acho que não soube recusar educadamente. Faço estas reflexões à luz de uma série de recordações que me assumem nos últimos tempos.

Imaginem que outro dia fiquei lembrando dos “colchões dragoflex”. Creio que ninguém mais se recorda daquelas camas dobráveis que existiam “antigamente”. Pois bem, para mim as camas “dragoflex” foram uma revolução, porque quando ia ao Rio, de férias, era nelas que minha tia deixava eu dormir (e sonhar). Mas não pensem que só as “dragoflex” freqüentam minha saudade. Não. Lembro-me sempre, sei lá porque, do “emplastro sabiá” e também do “óleo de fígado de bacalhau” (com o desenho de um homem carregando um peixe enorme) e tenho saudade do “grapete” (quem bebe grapete, repete), do “crush”, do “caçulinha” e até do guaraná Jati (que era mais barato por ser da cidade). O melhor, porém, era a “Groselha Milani”, um luxo...

Mas, engraçado, acho que a maioria das lembranças que me assumem agora poderia ser comprada em farmácias. Minha mente é invadida por produtos e refrãos de remédios como “um minuto” para dor de dente; “colírio Moura Brasil” (duas gotas, dois minutos, dois olhos claros e bonitos); Iparema (o amargo que cura); “pílulas de vida do doutor Ross” (fazem bem ao fígado de todos nós); Alivene (não se coce, é feio coçar). E os xaropes? Em casa sempre tinha um que me intrigava pelo nome “Alcatrão de São João” e lembro-me que mamãe usava uma coisa que se não me falha a memória tinha o nome de “Creme de Alface Brilhante Bromil” e também o “Creme Rugol” (as rosas desabrocham com a luz do sol, e a beleza das mulheres com o creme Rugol). Meu pai usava uma brilhantina chamada Glostora e eu me penteava com Gumex e meu irmão com “Brill cream”. Tenho certeza que quando as espinhas lotearam meu rosto, apliquei uma pasta chamada “Sardalina” (ou era “Antisardalina”?) e também gastei rios de “Minâncora”.

Tenho até vergonha de contar, mas achava distinto ficar doente. Quando precisava usar “Vick Vaporub” fazia questão de exagerar para ser notado e sempre deixava um bigodinho branco ladeando meus lábios quando sorvia “Leite de Magnésia Phillips”. O “Vinho Reconstituinte Silva Araújo” parecia algo para adultos e nunca tomei. Mas achava a palavra “Cafiaspirina” linda e ao pronunciar o “Sal de Fructa Eno” assentuava o “C” do “Fructa”. Ah!, não posso me esquecer das “Pastilhas Valda” e nem das “Balas de Cevada” que nunca entendi porque eram vendidas em farmácias. E lógico, acima de tudo, registro o “Memorex”, pois sem ele minha cabeça não poderia lembrar nada disso.

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