Por
Pedro Venceslau
Entrevista com
o cantor e compositor Lobão
Lobão
não tem papas na língua. Fala o que pensa.
Ainda mais quando conversa de forma descontraída,
em mesa de bar, a bordo de um chopp. Recomenda-se que os
mais recatados e puritanos dispensem a leitura. Copiou?
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Entre
shows, gravações do programa “Saca Rolha”,
no Canal 21 – onde divide a cena com Marcelo Tas e
Mariana Weickert –, e eventos de divulgação
de seu novo CD “Canções dentro da noite
escura”, o rebelde número um da cena musical
brasileira encontrou um tempo para receber Pedro Venceslau
(editor de CONTATO), Lina Garrido e Gabriela Miranda, membros
da equipe de reportagem da revista IMPRENSA. O papo rendeu...
O bate papo foi no último dia 22 de agosto, no bar
do hotel Meliá, QG do artista em São Paulo.
A entrevista foi no estilo "pinga-fogo", e mesclou
perguntas nossas com outras, enviadas para a redação
de outros veículos de comunicação.
Ligado o gravador, Lobão não perdoou Chico
e Caetano, Zezé e Luciano, mensalão, PT, Lula
e tudo o que estava ao alcance do seu pensamento.
CONTATO reproduz, com exclusividade, os melhores trechos
da entrevista, publicada por IMPRENSA em sua edição
de setembro:
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Pedro
Venceslau – Você votou no Lula??
LOBÃO – Eu não só votei no Lula como
fiz campanha para ele desde 1989. E eu não sou do PT. Eu
estou achando uma merda o que está acontecendo. Foi uma decepção
terrível desde o início, quando deram o Ministério
da Cultura para o Gilberto Gil. Puseram uma raposa em um galinheiro.
Além disso, um presidente não pode ser fã do
Zezé di Camargo e Luciano. Não pode, não pode,
não pode...
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Lina
Garrido – Por que essa birra com o Gil?
LOBÃO – Porque ele é um contratado de multinacional,
está a serviço das multinacionais – tanto
ele como o Caetano.
Gabriela
Miranda – Você odeia música sertaneja?
LOBÃO – Eu não. Só acho o Zezé
di Camargo o cocô do cavalo do bandido. Um tomateiro de
terceira, que joga no time da UDR (União Democrática
Ruralista). É um fazendeiro que entra e sai do Planalto
a toda hora. Fizeram um filme deles agora que é uma porcaria!
Thales
de Menezes, redator-chefe da VIP – Você não
acha que está perdendo tempo vendendo CD em bancas de jornais?
Não seria melhor pular essa etapa e vender direto os arquivos
de música pela Internet?
Lobão – Eu não quero saber de arquivo na Internet.
A pergunta é descabida. É como falar para o autor
de um livro disponibilizar um capítulo na Internet. Não.
Meu trabalho é autoral. Eu acredito no álbum, no
fetiche do álbum. Um cara que gosta de iPod, eu prefiro
que não vá nem no show.
Ana
Paula Souza, da CartaCapital – Se, anos atrás, a
rebeldia o transformou num excluído, hoje não é
ela a responsável pela sua presença na mídia,
pela caminhada do seu selo e pelo fato de a sua voz ecoar até
no Ministério da Cultura? Não é a rebeldia,
no fundo, o que mantém você vivo como artista?
Lobão – Eu só sou rebelde porque eu preciso
ser. É uma defesa. Não é marketing. Não
seria mais fácil, se eu fosse um homem tão marketeiro,
pagar logo o jabá? Porque esse é o marketing mais
eficaz. Eu não toco em rádio. Então de que
adianta eu ficar aqui dando apartes inteligentíssimos,
se neguinho fala que ‘esse cara é um babaca e um
péssimo músico porque nem faz música mais’?
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Fernando
Bonassi, escritor – Em sua opinião, qual a maior
façanha humana de todos os tempos? E a melhor posição
sexual? Por quê?
LOBÃO – A maior façanha humana de todos os
tempos é continuar acreditando no próprio homem.
A melhor posição sexual é aquela que você
consegue realizar. Não adianta nada, por exemplo, seguir
um Kama Sutra e tentar uma posição de “cruz
suástica em V”, uma posição esdrúxula...
Existem hoje parâmetros olímpicos para o sexo que
não se coadunam com a minha vontade sexual. Por exemplo:
eu acho que um “papai e mamãe” pode ser muito
mais sem-vergonha do que essa moda bem classe média de
“vamos fazer um swing”. Não há nada
mais classe média do que um swing. A promiscuidade mais
barata é o swing.
Dib
Carneiro, editor do "Caderno 2", de O Estado de S. Paulo
– Participar de um talk-show na TV, atuando como comentarista
de assuntos atuais, é uma atividade bem próxima
da função jornalística, na modalidade de
jornalista opinativo. Essa novidade na sua vida (estar do "outro
lado") alterou de alguma forma o jeito como você vê
o trabalho dos jornalistas, sobretudo os críticos?
Lobão – O meu trabalho jornalístico vem de
antes do "Saca Rolha". Minha relação com
o jornalismo foi uma coisa marcante a partir do Júlio Barroso,
um grande jornalista, que foi o primeiro cara que fez a ponte
secreta dos segredos – porque existe uma relação
muito atritosa entre esses dois mundos (música e jornalismo).
E eu aprendi muito com o Júlio. E entendo bastante o crítico
hoje.
Rodrigo
Manzano, crítico de livros da revista IMPRENSA –
Você, de fato, assistiria ao seu programa na Rede 21? Sem
dormir?
Lobão – Você está dizendo que o meu
programa é muito sonolento, é isso? Mas eu não
assisto. Eu moro no Rio. Quando eu assisti, eu achei muito interessante.
Venceslau
– Você fatura mais com o quê? Com os shows,
o programa "Saca Rolha" ou a revista?
Lobão – Não faturo com porra nenhuma!
Eliane
Brum, repórter especial da revista Época –
Como você acha que o Lula e o PT vão entrar para
a História do Brasil?
Lobão – Eu não vejo com bons olhos a imagem
do Lula a médio e longo prazo. Com o distanciamento histórico,
eu acho que o governo do PT, nesse primeiro processo, entra na
história como pífio. O governo Lula foi absolutamente
decepcionante. Na verdade, eu nunca acreditei nos valores deles.
Eu só apoiei porque era a única coisa ética
que tinha.
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Gabriela
Miranda – Você é um cara religioso?
LOBÃO – A fé é covarde, é uma
espécie de remorso. A esperança vem de dentro. A
fé é você pensar que, fazendo algo bom, vai
ganhar algo em troca ou em dobro. A pior miséria é
você querer ganhar com a divindade. O plural de fé
deveria ser fezes.
Venceslau
– Você gosta de funk?
LOBÃO – O funk é maravilhoso. Adoro Tati Quebra
Barraco. O funk é uma revolução.
Lina
– Até o Serginho e a Lacraia são uma revolução?
LOBÃO – Sim. “Vai Lacraia” é o
máximo! Isso sim é bom. Já Tom Jobim... Dá
vontade de tomar um tiro de tédio. Entre Edu Lobo e Lacraia,
eu prefiro a Lacraia. Edu Lobo é parnasiano. O som dele
é uma bosta! Eu quero sentir o cheiro de cu da população.
Isso é Lacraia. Elis Regina, Edu Lobo, Chico Buarque e
Caetano são o que há de pior na nossa música.
Venceslau
– E por que você não gosta de Chico Buarque?
Lobão – Chico é parnasiano. É uma ótima
pessoa, mas não podia existir. Chico é sinônimo
de ditadura militar. Ele é um cara que nasceu velho. São
músicas depressivas. A gente se masturba com isso e se
embevece com os rococós proparoxítonos (referência
à música "Construção", de
Chico). O subdesenvolvimento da língua é o subdesenvolvimento
do pensamento. Por isso o funk é ótimo. É
original. A Lacraia é ótima. Porque na música
funk não tem barroquismo. Chico é o contrário
do funk.
Venceslau
– Você continua com a cocaína?
LOBÃO – A cocaína é como se fosse um
suéter velho, cafona, da Lacoste, que eu não gosto
mais de usar, mas se você disser que tem aí... Olha,
a minha cultura é a maconha.
Venceslau
– Você é a favor ou contra o desarmamento?
Disseram que você seria mascote da campanha...
LOBÃO – Mascote eu sou é do Comando Vermelho.
E falo isso por causa do Belo (cantor). Eu fui preso várias
vezes. Tive 132 processos. Um dia eu estava andando de motocicleta,
em meados de 1992, e não me reconheceram. Então,
fui preso. A carteira de motorista que portava eu tinha ganho
do Comando Vermelho. Quer dizer, minha carteira era do Comando
Vermelho. Há 20 anos eu falo isso: “Eu sou do Comando
Vermelho!”. E se fosse o Belo falando, estava preso.
Gabriela
– O que você acha de músicas engajadas politicamente?
LOBÃO – É uma coisa que sempre esteve fora
de moda. A música engajada no Brasil é muito cafona.
Música de protesto! Quer coisa mais maníaco-depressiva
que a música “é bonita, é bonita...
viver e não ter a vergonha de ser feliz...”? É
o hino do maníaco-depressivo! Não digo a música
do Gonzaguinha, mas a cultura em que nós nos colocamos
é inapropriada.
Venceslau
– O que você achou do filme que fizeram sobre o Cazuza?
Lobão – Uma merda. Não passa nada do que foi
verdade. Eu fui o melhor amigo do Cazuza e não apareço
no filme. Ainda bem! O Frejat apareceu e se fodeu.
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