É
bom saber que não sou o único a me emocionar
com Nova York. Não. Há deslumbrados mais ilustres.
Muitos. Nenhum, contudo, chega perto do nosso José
Bento Monteiro Lobato. Aliás, é bom tocar
neste tema para poder levantar questões que nem sempre
são presentes na consideração do nosso
escritor querido.
Creio ser Lobato, para os biógrafos,
um dos personagens mais difíceis de nosso quadro
literário. Desafio complexo, visto sempre como alguém
resoluto, firme e coerente, seus admiradores o cultuam de
maneira a jogar fora detalhes que, certamente, mostrariam
a complexidade de um brasileiro perdido entre a modernidade
pretendida – metaforizada pela busca do petróleo
– e a heranca conservadora – de um filho de
fazendeiros do Vale do Paraiba cafeeiro. De toda forma,
a marca mais evidente de Lobato e seu nacionalismo quase
nunca contestado. Como o mais completo “bandeirante
da brasilidade”, seus biógrafos nunca consideram
alguns textos seus, em particular as cartas, que apontariam
para um homem mais repartido do que se supõe na inocência
da laudação cristalizada.
A
fim de evidenciar a fecundidade do tema convém recortar
um momento da vida do nosso autor que depois de falido teve
a ajuda de amigos para se tornar Adido Comercial do Brasil
em Nova York. Entre 1927 e 1931, Lobato residiu em Queens,
em Astoria, exatamente na região onde hoje os brasileiros
se multiplicam alarmando um dos mais graves problemas de
nossa realidade. De lá também redigiu cartas
ao amigo querido Anísio Teixeira que aliás
conheceu quando este fazia seus estudos na Universidade
de Colúmbia. Nessas páginas Lobato delirava
e vertia em palavras sua paixão pela cidade. E haja
adjetivos, exclamações e outros recursos para
dar vazão ao amor por onde estava. Mesmo sendo breve,
vale recortar passagens que traduzem isto. É de Lobato,
por exemplo a frase estarrecedora de que “um dia
em Nova York vale uma vida no Brasil – pelo menos
ensina mais que ela” e é dele também
a descrição quase encantada “tenho
a impressão de que todas as estrelas do céu
se acamaram no solo de Manhattan e arredores. Lá
está Brooklyn! Lá está Queens!... mas
é um espetáculo único”.
E o que dizer da dor presumida de uma volta ao Brasil assim
registrada “estou gozando de tal modo Nova York
que receio isso seja presentimento de regresso à
pátria no próximo ano. Que pena será.
‘Never more’ Times pela manhã, nem rádio
(e estou com um excelente rádio novo), nem a inalação
diária destes fluidos eufóricos sobre os quais
tanto conversamos aqui”.
E foi o próprio Lobato que em um de seus arroubos
corriqueiros não vacilou ao anunciar que abriria
um restaurante em Nova York. Situando-o no número
60 da Greewich Street, o suposto estabelecimento funcionaria
com o nome de “Brazilian Garden Coffee House”
fato, aliás, que sugere o intuito emigratório
da família.
Fato concreto é que Lobato voltou
em 1931. Tendo escrito depois muitos textos sobre os Estados
Unidos, sem dúvidas “América”,
mais que todos merece destaque. Na mesma linha é
de apontar que se estes aspectos fossem considerados, certamente,
teríamos não só um Lobato mais completo,
mas também, um personagem mais humano. Afinal, quem
não se apaixona por Nova York?