Por Pedro Venceslau

Exclusivo: Nadja Haddad, a repórter da Band baleada no Rio, desabafa:

"Boto minha mão no fogo pela Band"

Antes de debutar como repórter, Nadja Haddad quase se tornou bailarina e advogada. Ainda adolescente, chegou a trabalhar na Globo ao lado de Marlene Matos, como assistente de palco da apresentadora Xuxa. Alguns anos depois, aos 16 anos, deu uma guinada na vida e se matriculou no curso de direito da Faculdade Cândido Mendes. Mas esse ainda não era o seu destino. Pouco antes de conquistar o título de bacharel em direito, Nadja desistiu da carreira de advogada e ingressou no curso de jornalismo. Foi amor à primeira vista. Sua carreira como repórter foi fulminante. Depois de passar pela Rádio Tupi e Canal 21, ela foi contratada, no auge dos seus 22 anos, como repórter da Band Rio. No último dia 29 de agosto, Nadja Hadad deixou a redação para uma pauta de rotina: cobrir uma ação policial no morro Dona Marta. Chegando ao local da ação, ela foi surpreendida, enquanto se preparava para colocar o colete à prova de balas, com um tiro que perfurou seu pulmão. Nesta entrevista exclusiva ao Portal Imprensa e jornal CONTATO, Nadja conta detalhes da pauta que quase tirou sua vida, comenta a polêmica entre o Sindicato dos Jornalistas do Rio e a Band em torno de caso e avisa: “eu voltaria lá”.

CONTATO – Como você está se sentindo hoje?
Nadja – Estou bem melhor. Até pouco tempo atrás estava afônica, devido à operação, mas estou melhor. Quer dizer, não posso cantar uma ópera ainda...


Nadja entrevista o ministro Gilberto Gil

CONTATO – Quando você volta para a ativa?
Nadja - Vou ficar um mês em reabilitação antes de voltar para a Band. Depois disso, devo ficar um tempo trabalhando internamente, passando por uma reambientação. Lá para o final de outubro volto para a minha vida normal.

CONTATO – Você cobriria outra ação policial como aquela?
Nadja – Sim, eu voltaria lá. Sinto medo, é natural. O medo é constante para quem mora no Rio. Infelizmente, faz parte do nosso dia-a-dia. Vou tirar esse mês para refletir sobre isso tudo. Mas, se pintar outra pauta como aquela, eu faço a matéria. Tenho um compromisso com o público.

“Sim, eu voltaria lá. Sinto medo, é natural”

CONTATO – Conte um pouco sobre o momento em que você foi baleada.
Nadja - Eu estava na rua São Clemente, que é uma via de acesso, um lugar público, cheio de crianças, me preparando para colocar o colete (à prova de balas). Aquela rua não era nem a entrada da favela, não era uma zona de risco. A gente estava procurando a concentração da imprensa quando ouvi os primeiros fogos. Só para você entender: quando os traficantes soltam fogos é porque a imprensa ou a polícia estão chegando. Então eu virei para o cinegrafista, o Moabe Ferreira, e disse: “Hoje a bala vai comer”. Aí eu ouvi o primeiro barulho de tiro, que foi o que me atingiu. Ouvi o estouro do vidro e senti algo quente, não senti dor nenhuma, só algo quente. Nem chorei. Depois, vi o sangue e ouvi um barulho estranho, tipo gelo na água quente. Aí falei para o cinegrafista: “Tomei um tiro”. Ele respondeu: “Não brinca”. “Me ajuda...”. Entramos no carro, rezando muito, e fomos aos bombeiros, que era o que tinha mais perto. Mas um soldado disse que não podia fazer nada, que não havia viatura disponível e que ele não tinha autorização para abrir caminho para nós. Então fomos para o Hospital da Lagoa, que é público, mas eles não têm emergência. Depois tentamos o Miguel Couto. Lá fui prontamente atendida.

CONTATO – Foi por pouco...
Nadja – Os médicos me disseram que foi um milagre. Não fiquei tetraplégica por milímetros. Se não fosse Deus, eu não estaria aqui.

“Os médicos me disseram que foi um milagre. Não fiquei tetraplégica por milímetros”


Jornalista Nadja Haddad em serviço

CONATO – Você chegou a perder os sentidos?
Nadja - Eu perdia os sentidos de vez em quando, mas depois voltava. Senti muita aflição e dificuldade de respirar. Demorou muito para a gente chegar até o pronto socorro.

CONTATO – Enquanto você estava internada, esse episódio gerou muita polêmica entre a Band e o Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro que acusou a emissora de expor a vida de seus funcionários a risco na cobertura da violência carioca. Como você avalia a postura da Band?
Nadja – O Sindicato se aproveitou disso... Sou repórter, não heroína. Essa pauta foi factual. Eu podia dizer não. Não fui obrigada a nada. Eu sei as conseqüências dos meus atos. Não sou nenhuma alucinada. De qualquer forma, aquilo poderia ter acontecido com qualquer um, já que era uma praça, uma via de acesso. Eu boto a mão fogo pela Band. Nunca deixei de ser resguardada. Eles proíbem atos heróicos. Além disso, a Band é a única emissora que tem coletes à prova de bala para os repórteres. A Band pagou todo o tratamento, me deu assistência emocional, eles foram maravilhosos, uma família. Os diretores me acolheram, me acompanharam o tempo todo.

 

 

 

Confira a nota divulgada no site do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro em resposta às críticas de Ricardo Boechat, diretor de jornalismo da TV Bandeirantes-Rio, em relação à carta enviada à imprensa pelo sindicato, na qual a entidade comenta o caso da jornalista Nadja Haddad, baleada durante a cobertura de uma ação policial na favela Dona Marta.

“Em seu programa de hoje (01/09) na rádio Band News, o apresentador Ricardo Boechat, diretor de Jornalismo da TV Bandeirantes, atacou com virulência o Sindicato de Jornalistas do Rio, com agressões pessoais ao seu presidente. Foi uma reação à nota divulgada pelo Sindicato com críticas aos veículos que se recusam a discutir medidas de segurança para a cobertura da guerra nos morros cariocas. [...] Em nenhum momento o Sindicato atacou os chefes do jornalismo da Band, em especial Boechat, que sempre mereceu nosso respeito como profissional. [...] O acidente com a repórter da Band impõe a inclusão de mais um item nesse debate [...]: a blindagem dos carros de reportagem deslocados para as regiões conflagradas. Insistimos na urgência desta discussão, antes que se multipliquem tragédias como a de Tim Lopes, da TV Globo, torturado e morto por traficantes [...]”.

“Nenhuma notícia vale sequer um ferimento leve”

Por Pedro Venceslau e Thaís Naldoni


Ricardo Boechat

Diretor de jornalismo da Band-Rio e colunista do Jornal do Brasil, o jornalista Ricardo Boechat comenta o incidente envolvendo a repórter Nadja Haddad. Do incidente, surgiram questões sobre a segurança dos jornalistas em coberturas de risco. O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro (SJPMRJ), divulgou comunicado, que Boechat taxou de oportunista. Entenda um pouco mais dessa polêmica e das medidas de segurança utilizadas pela Band, na tentativa de garantir a integridade de seus jornalistas.


CONATO - Existe na Band normas padrão de segurança em relação aos seus jornalistas?

Boechat - Há rigorosas instruções minhas no sentido de não se ousar em coberturas policiais. Há o princípio, sistematicamente repetido, de que nenhuma notícia vale sequer um ferimento leve. Há incontáveis pautas derrubadas por oferecerem risco, mesmo hipotético. Há imutável recusa ao eventual desejo de repórteres e cinegrafistas de ultrapassarem, nesta ou naquela ocasião, a fronteira da segurança. Não há normas técnicas escritas - que, sem compromisso ético das chefias, de nada valeriam.Todos os jornalistas e estagiários da TV Bandeirantes contam com seguro de vida fornecido pela empresa. Não há apólice específica para determinadas equipes, já que todas podem ser designadas para coberturas policiais. É constrangedor ter que expor detalhes da relação privada entre a empresa e um funcionário para desmascarar sindicalistas "bacaninhas".

CONTATO - É verdade que a Band/Rio comprou coletes à prova de balas para sua equipe de jornalismo?
Boechat - Sim. Há cerca de um ano e meio. Uso obrigatório por todas as equipes em coberturas policiais.

"E o que aconteceu à jornalista poderia acontecer a qualquer um dos milhares de cariocas que passam por aquela movimentada via Zona Sul"

CONTATO - Como o senhor avalia a nota divulgada pelo Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, que comenta o caso de Nadja Haddad?
Boechat - Enviei resposta ao presidente do Sindicato, repudiando a hipocrisia da nota. Foi ato de deplorável oportunismo tentar usar o grave ferimento sofrido por Nadja Haddad como gancho para criticar empresas de comunicação que negligenciam segurança de seus profissionais. A Band não age assim. E o que aconteceu à jornalista poderia acontecer a qualquer um dos milhares de cariocas que passam por aquela movimentada via da Zona Sul.

 

 


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