Não se trata de um aniversário, o meu,
objetivamente, mas de uma Primavera, como ensaio e anúncio
do Verão.
No reduto das flores, árvores ver-des de suas
energias, pastos quase refeitos, queimadas sendo deixadas
para trás, inicia-se a Primavera, ante-cedida
pela majestade dos ipês e suas florações
copiosas, um exagero amarelo que põe tudo e todas
as flores como coadjuvantes de seu amarelo apaixonante.
Algumas vezes somos pontuados por acontecimento que
se localizam acima de nossa cabeça, em condição
superior ao que imaginaríamos como paisagem.
Mesmo assim, escalando cores e árvores, somos
deixados para trás do amarelo espontâneo
invasor de nossos olhos e, quem sabe, de nossos corações.
O amarelo se im-põe, como se nos governasse de
modo imperial, sugerindo ouro claro e vibrante, coisa
de rei.
Na Primavera, já recebemos nossas quotas de calor,
mesmo que tímido, para os cultores de sol e praia,
mas um calor mais de alma que de corpo, pois a sensação
é menos térmica do que estética
ou psicológica. Além disso, é um
calor que nos invade sorrateiro, tomando conta de nosso
corpo, que se deixa invadir como se recebesse um bálsamo.
Gosto especialmente desta época do ano, contanto
que me mantenha por aqui nesta Mantiqueira só
de encantos e, algumas vezes, de toda a Primavera.
Tivemos também nossa primavera política
quando nos jogamos nos perfumes e cores atraentes dessa
sugestão de alegoria, imaginando-nos em uma nova
condição, aquela que mandava acreditar
nos novos homens do país, saídos de florações
mais recentes, limpas e puras.
Uma tempestade de granizo, menos que um vendaval ou
ciclone, menos ainda que um furacão, liqüidou
com as flores e deixou as árvores nuas, exibindo
o esquálido de seus corpos, agora sem a virtude
de uma carnação em forma de flores cheirosas
e abun-dantes de cores.
Ficamos órfãos de nossos sonhos floridos
e sem novos tutores para o delírio que nos injetou
beleza, espe-rança. Somos, hoje, órfãos
de nosso lirismo, filhos da desesperança, árvo-res
sem flores, viço, perfumes. Fomos conduzidos
a uma nova realidade que nos repôs onde sempre
estivemos. Agora, as flores e a esperança foram
substituídas por gente pouco hábil e inteligente.
Perdemos a Primavera, mas ficamos com o que restou de
Lula, uma gro-tesca flor de ferro, oxidada, cheia de
ferrugem. Uma flor antiflor, uma bo-bagem.
|