Sim,
acho chato citar coisas em línguas estrangeiras. Mas
há algo em “So this is Christmas”,
do insuperável John Lennon, que me faz ceder à
tentação. Isto por dois motivos principais:
a lembrança de sua morte dia 8 de dezembro de 1980
e a canção natalina que fez retomando a sua
utópica esperança de um mundo melhor, de igualdade,
sem racismo e com solidariedade.
Parece
incrível, mas vinte e cinco anos se passaram desde
o assassinato cruel do mais celebrado dos Beatles.
Essa data foi chocante e para muitos significa um antes
e um depois. Sempre me comovo com a recordação
daquele dia e com as imagens trágicas estampadas
em jornais do mundo todo.
Lembro-me
também que, no ano 2000, eu estava em Nova York no
dia 8 de dezembro e então vi, juntamente com uma
multidão que não deixa de passar pelo local
do crime nesse dia, na janela do apartamento, no Edifício
Dakota em pleno Central Park, a viúva acendendo uma
vela. Na mesma ocasião, a fim de reafirmar o sonho
utópico de um mundo sem violência, Yoko Ono
pagou por uma campanha contra o uso de armas de fogo. Os
out-doors eram lindos, estampados com os dramáticos
óculos do marido, lentes quebradas e sujas de sangue,
e com o seguinte letreiro: “Mais de 676.000 pessoas
foram mortas por armas nos Estados Unidos desde que John
Lennon foi morto a tiros em 8 de dezembro de 1980”.
Confesso
que um dos meus passeios favoritos sempre que volto a Nova
York é visitar ainda que rapidamente o jardinzinho
em sua memória no Strawberry Fields. Sabe,
isto é como render homenagem ao grande sonhador que
ousou verbalizar “Imagine”. Há mesmo
algo de quase religioso nisto, posto ser um ato de memória
e reflexão sobre a minha geração e
o papel histórico de alguns de nossos ícones.
Diga-se, tudo se justifica pela força da melodia
utópica de Lennon, que sempre se mostrou mais resistente
do que se esperava. E sua história pessoal prova
isto. Abandonado primeiro pelo pai que nunca o reconheceu,
depois pela mãe que o deixou com uma tia para trabalhar,
ainda que ela o visitasse e fosse quem lhe ensinou as primeiras
notas, Lennon nunca deixou de supor um mundo de harmonia.
Além
do farto repertório solo ou em parceria, “So
this is Christmas” é uma de suas canções
que muito me enternece e que se mostra apropriada para os
dias em que vivemos. Como uma prece, não se deixa
corromper pelo tom comercial da celebração
natalina esvaziada de espiritualidade. Claro apelo à
paz, usando o calendário universal como motivo para
a reciclagem de propostas afetuosas, assim declama: “So
this is Christmas/And what have we done/Another year over/And
a new one just begun/And so this is Christmas/I hope you'll
have fun/The new dear one/The old and the young/A very merry
Christmas/And a happy new year/Let's hope it's a good one/Without
any tears/And so this is Christmas/For weak and for strong/For
the rich and the poor ones/The world is so wrong/and so
happy Christmas/For black and for white/For yellow and for
red ones/Let's stop all the fight”.
Não
vejo necessidade de traduzir a canção porque
acho que todos entenderam. Mesmo os que não falam
inglês. Também não tenho porque me alongar
para dizer que outra vez é Natal e que devemos estar
atentos à grandiosidade de pensar um mundo melhor,
um mundo como sonhou John Lennon.