Espelhos (clique)

Por: José Carlos Sebe Bom Meihy


Sebe aceitou o desafio feito por um leitor e aborda um tema considerado tabu por muitos que, tal qual a avestruz, diante do perigo, preferem enfiar a cabeça no buraco.

Dia destes, recebi mensagem de alguém que reclamava duas coisas. Depois de ler meu artigo sobre a história do beijo, argumentou que eu havia esquecido de falar do lado oriental desta prática e, não sem uma alfinetada, perguntava-me se eu conhecia o Kama Sutra.
Outra questão indicada na mensagem dizia respeito ao uso da expressão “história inútil”. Com a mesma fúria, outra alfinetada feriu meus brios de historiador e mais doeu quando depois do desprezo pela “inutilidade” do assunto, o ex-aluno sugeria que escrevesse algo “de real interesse”. A história da camisinha era indicada como alternativa. Demorei alguns dias para aceitar a proposta. Mas fui valente, busquei ler sobre o assunto e resolvi que responderia tanto sobre o beijo no oriente como a história da camisinha. Resolvi começar por esta, pois acho que em termos de utilidade este tema é mais premente.
Visitando alguns sites na internet e lendo o que encontrei, aprendi que o tema sempre foi polêmico. Atentamente registrei os argumentos defendidos por ortodoxos, principalmente católicos. Devo dizer que a veemência da oposição ao uso do preservativo chocou-me. Falo como professor que passou a vida entre jovens e que cedo aprendeu a validade da lição do bom uso do sexo em vez de simplesmente supor que a abstenção seria uma questão de educação ou regra imposta. Devo dizer que não aprovo a promiscuidade e nem o sexo livre, mas sou contra a pura e simples discriminação do sexo. Com certeza, acho que a informação e a liberdade de escolha são fatores fundamentais para as experiências de jovens. Ademais, a eficiência dos produtos colocados no mercado mostra que a melhor maneira de combate as DSVs (doenças sexualmente transmissíveis) ainda é esta. Então, defendo a informação instruída e o direito de escolha de cada um. E viva, pois, a camisinha!
As primeiras notícias da existência destes preservativos datam de mais de 1350 AC. Desenhos egípcios revelam o uso masculino de invólucros, talvez de peles de animais ou fibras de papiro. Há possibilidade dos romanos terem levado para a Europa esta prática que também sugere que era difundida para evitar a natalidade. Pelo uso da expressão “camisa de Vênus”, sabe-se que os gregos tinham conhecimento dela.
Independentemente disto, há notícias de preservativos usados pelos chineses que os faziam na base de papel ou seda. Os japoneses usavam algo com couro ou mesmo chifres. De toda forma, na Europa, há registros de desenhos nas cavernas de Combarelles, na França. O que se tem com segurança é que principalmente na época das chamadas “grandes viagens”, em torno de 1500, um anatomista italiano de nome Gabrielle Fallopius (de onde deriva a palavra “falo”) difundiu o uso de uma espécie de tecido de cambraia chamado “saco de linho” que servia para proteger da sífilis.
A primeira grande generalização do uso da camisinha se deu no inicio do século XVIII quando concluiu-se que o intestino de carneiro era o melhor material para a fabricação de protetores. Um segundo momento fundamental na divulgação dos preservativos ocorreu em paralelo à Revolução Industrial inglesa, exatamente em 1843, quando Hancock Goodyear, conseguiu a fórmula para a vulcanização da borracha e assim baratear o custo dos protetores. Por esta época, houve as primeiras campanhas em favor da vulgarização do uso dos preservativos e sabe-se que figuras míticas como o “incansável” Casanova – o amante sublime – se valia destes protetores. Uma outra fase de divulgação da camisinha se deu quando o látex líqüido substituiu a borracha na década de 1930. Depois de 1981, com os primeiros registros de casos de HIV, deu-se outra virada na fabricação do produto que passou a ser de poliuretano, mais resistentes e moldáveis.
Há fatos curiosos cercando a história da camisinha. Um deles é sobre o termo em inglês “condon” que teria originário do latim onde “condus” significa contenção. Outra curiosidade decorre do termo “capote anglaise” com o qual os franceses agridem os ingleses que achavam que o uso da camisinha era sofisticação tola. Os britânicos, claro, revidaram dizendo que o não uso correspondia a “french disease” (doença francesa), como eram chamadas as doenças sexualmente transmissíveis. De toda forma, entre uma polêmica e outra, repete-se: e viva a camisinha. E para finalizar, imaginemos o que seria o mundo sem elas.

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