Dizem
que há relação íntima entre
futebol e política. Não são poucos
aqueles que prognosticam sucessos eleitorais depois dos
resultados conseguidos nos campos, em particular em campeonatos
mundiais. Os argumentos quase sempre celebram as virtudes
ufanistas nacionais como forma de classificação
em disputas que atraem os olhos de todos os quadrantes do
globo. Chega mesmo a ser mecânica a associação
entre a vitória das Seleções com a
afirmação positiva dos governos que se legitimariam
nos gramados sob as bênçãos de gols.
O
lustro na auto-estima renderia votos. Principalmente em
tempos de Copa do Mundo quando se dá o embate entre
o campeonato mundial e as eleições, não
faltam aqueles que decretam que se a Seleção
ganhar os candidatos do governo teriam maiores chances de
também vencer. Em 2006, teremos tanto a Copa do Mundo
como as eleições presidenciais e parlamentares
e desde logo, retraçam-se os paralelos. E nenhuma
outra disputa política vai merecer tanta atenção
como esta, pois o que está em juízo é
mais do que a definição do Presidente, novo
ou velho, ou dos deputados e senadores, estreantes ou reeleitos.
O
julgamento público do PT estará em questão
e com ele a experiência democrática político-partidária
do pós-ditadura. E não faltam os que afiançam
que se o Brasil, favorito, vencer, as chances do atual governo
melhoram. Será? Um olhar no passado põe em
cheque este pressuposto rasteiro ainda que consagrado. Vejamos:
No
agitado ano de 1958, quando vencemos o primeiro campeonato
na Suécia, lançando o então menino
Pelé, depois de um conturbado, mas regenerador mandato
onde fermentavam na opinião pública acontecimentos
como: construção de Brasília, industrialização
“multinacionalizada”, cinema novo, vitórias
esportivas, com tudo isso somado, JK, o “Presidente
Bossa Nova” teve seu candidato derrotado para Jânio
Quadros, que obteve 48% dos votos contra 32% dados ao Marechal
Henrique Lott.
Em
1962, quando o Brasil vencia nos campos chilenos, o então
Primeiro Ministro Tancredo Neves viu-se obrigado a renunciar
com seu Gabinete e o substituto eleito, Santiago Dantas,
foi vetado pelo Congresso Nacional.
O
tricampeonato, na IX edição da Copa do Mundo
em 1970, na Cidade do México, se deu em plena ditadura
política. Pela primeira vez a competição
era transmitida ao vivo. Mas o fato do Brasil ter vencido
todos os jogos, com 19 gols memoráveis e com a consagração
de Pelé como “Rei do futebol”, não
favoreceu o governo do General Médici. Apesar do
uso exagerado da máquina de propaganda - que divulgava
sua imagem com um radinho de pilhas torcendo pela Seleção
-, o general teve naquele momento a primeira manifestação
contrária à ditadura, feita pela opinião
pública que não aceitava a manipulação.
Paradoxalmente,
a Taça Jules Rimet – dada definitivamente ao
Brasil que fora o primeiro país tricampeão
– foi roubada naquele mandato e provavelmente depois
fundida para venda em barra de ouro.
Em
1994, no tetra, vencido nos Estados Unidos, apesar de ganharmos
nos pênaltis, o que garantiu a vitória de FHC
não foram os gols e sim o combate à inflação
engendrado por Itamar Franco. No pentacampeonato, em 2002
no Japão/Coréia, feliz ou infelizmente, quem
venceu o candidato do governo, José Serra, foi Lula
apesar das celebrações patrocinadas por Brasília.
Não
sabemos dizer se será bordada a sexta estrela na
camisa canarinho. Na mesma correlação, não
é válido supor quem ganhará as eleições.
Mas convém ficarmos atentos à história
e avaliar os candidatos mais pelos seus programas do que
pelos esperados gols em gramados alemães. Tomara
que o governo Lula não imite ditadores que tentam
se apropriar da alegria do povo. E que renasça a
esperança em dose dupla: que vença o Brasil
e o candidato que tiver melhor projeto de recuperação
da moral brasileira.