Centenas de contratações sem concurso, aumento real de salário demagógico em 2005 e despesas irresponsáveis em reforma de imóveis que abrigam diretores privilegiados são apenas alguns dos sinais mais visíveis de uma crise anunciada: a prefeitura não tem recursos suficientes para sequer empenhar a folha de pagamento dos seus funcionários, cortou gastos que afetam diretamente a população mais carentes: reduziu a merenda escolar dos alunos das escolas municipais, reduziu a compra de medicamentos pela rede pública municipal de saúde e deixa de adquirir até mesmo material de limpeza. Conclusão: crianças mal alimentadas, doentes mal atendidos e, por cima, pais de alunos são pressionados para ajudar na compra de material de limpeza.

Por Paulo de Tarso Venceslau

A gota d’água foi a drástica redução na quantidade e na qualidade da merenda escolar da rede pública. Mães desesperadas começaram a procurar nossa reportagem. Diretoras e professoras não escondiam sua decepção diante da realidade imposta pelo Executivo naquela quarta-feira, 14. Naquele dia, o prefeito Roberto Peixoto e Benedito Prado, diretor do departamento de Educação, reuniram-se com as diretoras das escolas municipais para informar sobre os cortes que seriam feitos na área de educação: merenda, medicamento e material de limpeza.
Na seqüência, foram cortados vários itens como bolacha, biscoitos e componentes do almoço servido às 12 horas. O cardápio entregue às escolas na segunda-feira, 19, é revelador. Só a quarta-feira tem uma refeição próxima do que era servido até então. O que é servido nos outros dias não satisfaz as necessidades das crianças em idade escolar.
Dona Maria (nome fictício) com dois filhos no ensino fundamental do Madre Cecília, perto da Imaculada, declarou à nossa reportagem: “Eles estão diminuindo tudo. Agora estão pedindo aos pais que ajudem a escola com material de limpeza. Essa situação começou na semana passada. Reduziram a merenda. Daqui a pouco, vão querer que nossos filhos comam livro”. Uma frase que revela o desespero das mães diante da situação criada pelo prefeito.
No domingo, 18, o Valeparaibano publicou uma longa reportagem do perdigueiro Max Ramon sobre a contratação de cerca de 700 funcionários municipais sem qualquer processo seletivo, pela administração de Peixoto. Essa é conclusão de uma investigação realizada pelo Ministério Público estadual. Infelizmente, a investigação ficou limitada a esse aspecto. Não vai nem às causas e nem à real dimensão dos seus efeitos.
A reportagem despertou a ira dos inquilinos do Palácio Bom Conselho. Na segunda-feira, 19, Peixoto e seus assessores mais diretos – Luis Rodolfo Cabral (Jurídico), Simões Berthoud (Segurança) e Gigli (Gabinete) decidiram pedir a remoção do Promotor José Carlos Sampaio de Taubaté. Informado por nossa reportagem, Sampaio riu e respondeu que não podia levar a sério essa informação.

Breve Histórico
Há meses que se anuncia a crise administrativa e financeira da gestão do ainda tucano Roberto Peixoto. CONTATO já imprimiu centenas de páginas com denúncias sobre a irresponsabilidade dessa administração com os limitados recursos municipais. Agora a crise é para valer. E quem anuncia não são os chamados críticos de plantão. A própria prefeitura foi obrigada a revelar sua dimensão quando, obrigada por lei, fez publicar no Diário de Taubaté, no dia 27 de maio, um sábado, seu Relatório de Gestão Fiscal, de acordo com os artigos 54 e 55 da Lei Complementar 101 de 2000.
LC 101/00 é nome burocrático da Lei de Responsabilidade Fiscal criada justamente para aumentar o controle sobre os gastos públicos em todas as esferas de governo: federal, estadual e municipal. Basta o parágrafo primeiro do primeiro artigo da Lei para tirar qualquer dúvida sobre seus objetivos.

“A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.”

Mais adiante, a Lei é muito clara quando afirma nos artigos 19 e 20 que para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, em 60% (sessenta por cento), no caso dos municípios e que esse total será repartido em 54% para o Executivo e 6 % para o Legislativo.
O Relatório de Gestão Fiscal quadrimestral publicado pela prefeitura é uma exigência da LRF para que a transparência das informações contribua para aumentar a fiscalização sobre as autoridades. Basta uma rápida leitura sobre o que foi publicado para se constatar que o governo de Roberto Peixoto está sob as lupas do Tribunal de Contas do Estado - TCE. O Relatório registra que as despesas totais com pessoal atingiram 52,57 % da receita corrente líquida, superior ao Limite Prudencial de 51,3 % estabelecido pela LRF, que corresponde a 95 % do limite legal de 54 %.
Traduzindo: as contas municipais foram pegas em flagrante delito e por causa disso sofrerão uma série de restrições e serão monitoradas mais rigorosamente pelo TCE.
A própria lei em si mostra os próximos passos da reportagem e do que poderá ocorrer com o governo de Roberto Peixoto.

Prefeitura engessada
A subseção II da LRF trata do controle da Despesa Total com Pessoal, no parágrafo único do artigo 22 afirma que caso a despesa total com pessoal exceda a 95% do limite, a prefeitura fica proibida de conceder vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título (...); criar cargo, emprego ou função; alterar a estrutura de carreira que implique aumento de despesa; prover cargo público, admitir ou contratar pessoal a qualquer título. Fica também proibida a contratação de hora extra.
O artigo 23 da LRF prevê uma série de medidas que poderão ser aplicadas para que o gasto com pessoal seja reduzido aos parâmetros estabelecidos por Lei. A extinção de cargos e funções quanto pela redução dos valores a eles atribuídos; a redução temporária da jornada de trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária são as medidas mais significativas.
Finalmente, caso não seja alcançada a redução no prazo estabelecido, e enquanto perdurar o excesso, a prefeitura não poderá receber transferências voluntárias; obter garantia direta ou indireta e nem contratar operações de crédito, ressalvadas as destinadas ao refinanciamento da dívida mobiliária e as que visem à redução das despesas com pessoal.
Diante dessa situação, pode-se prever que o governo de Roberto Peixoto entrou precocemente em fase terminal. Engessada como se encontra a prefeitura e a volúpia de boa parte dos inquilinos do Palácio Bom Conselho poderão conduzir a uma inusitada situação: a falência pura e simples do município.

Reflexos
Um funcionário que prefere manter-se no anonimato por temer represálias contou à nossa reportagem que um levantamento realizado na área de Finanças da prefeitura revelou a existência de R$ 30 milhões de dívida assumida sem dotação orçamentária. Perguntado sobre as causas, o funcionário apontou duas que considera mais relevantes:
1)reformas caríssimas nos prédios dos departamentos, com destaque para o de Ação Social (DAS) pilotado pela primeira-dama e o de Obras Públicas (DOP), sob o comando do engenheiro Gerson de Araújo. Curiosamente, os nomes mais recorrentes quando o assunto se refere às suspeitíssimas licitações.
2)No final de 2005, foram suspensos todos os empenhos e ao mesmo tempo foram transferidos para 2006. Essa seria outra causa do déficit orçamentário em 2006. Peixoto não se conformou com o orçamento herdado do ex-prefeito Bernardo Ortiz e gastou o que não tinha. E para completar, concedeu um demagógico aumento salarial que acelerou a quebradeira.
Diante desse quadro, o funcionário de carreira conclui que não existem mais recursos disponíveis para o orçamento de 2006. A folha de pagamento da prefeitura, em maio, atingiu 52,57 % (o limite é de 51,30 %) e a previsão é que no próximo quadrimestre atinja 60 % se não houver cortes drásticos com pessoal. Em janeiro de 2005, por ocasião da posse do novo prefeito, a folha estava em 44 %. Em junho, não existem recursos suficientes para que a folha de pagamento seja empenhada. Por causa disso, o TCE já emitiu alertas. Os primeiros foram desconsiderados pelo Executivo.

Merenda
Nossa reportagem foi pesquisar como era a situação da merenda nas gestões anteriores. Descobriu que além de garantir por quatro anos uma merenda balanceada e aprovada por nutricionistas, as crianças que apresentavam sintomas de desnutrição tinham um tratamento diferenciado: as famílias recebiam um reforço alimentar com leite vitaminado. Esse reforço deixou de existir no governo de Roberto Peixoto.
Apesar da pressão exercida pelo Palácio Bom Conselho para que a notícia ficasse restrita aos corredores palacianos, a vereadora e professora Pollyana rompeu a barreira com o Requerimento 1.041 no qual pede informações nas mudanças ocorridas no cardápio das merendas oferecidas nas creches e escolas de ensino fundamental da rede municipal de ensino.
Por outro lado, desde sexta-feira, 16, Associações de Pais e Mestres e diretores de escolas pressionam o professor Benedito Prado exigindo que fosse anulada a decisão de cortar parte substancial do cardápio escolar. A pressão foi tão forte que Prado foi obrigado a recuar, mas teve não sequer a dignidade de assinar o comunicado reproduzido ao lado.
Uma professora que havia se oferecido a relatar à nossa reportagem o que estava acontecendo foi pressionada e mudou o discurso porque teria recebido a confirmação de que a situação voltaria ao normal a partir de quarta-feira, 21. Ou seja, Peixoto só admitiu recuar sob intenso fogo cruzado.
Se o prefeito cumprir sua promessa, tomara que o faça, a saúde de nossas crianças estará menos ameaçada. Em compensação, muitos inquilinos do Palácio Bom Conselho devem estar se remoendo diante da redução da margem de manobra para realizar mais negociatas com cartas devidamente marcadas.

ASSUNTO: MERENDA ESCOLAR

Senhores Diretores, o Departamento de Educação, por meio do Solar da Educação, comunica que a partir do dia 21 de junho a merenda escolar, servida pela empresa SISTAL, voltará a ser servida conforme cardápio usado desde o início deste ano letivo de 2006. As mudanças ocorridas nos últimos dias devem ser desconsideradas.

Obs: A normalização da situação dos cardápios ocorre nesta quarta-feira, porém é possível que em algumas escolas o estoque de alimentos apresente a falta de algum item. Informamos que está sendo providenciado, o mais rápido possível, a reposição dos mesmos.

Profª Maria Consuelo F.C.Castilho
Coordenadora do Ens. Fund. e Médio

 

 

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Jornal CONTATO 2006