A simples pintura de um prédio construído com dinheiro das Fundações Banco do Brasil e Odebrecht é suficiente para o prefeito reinaugurar a obra toda e, pior ainda, batizar com o nome da esposa o pavilhão inaugurado em 2000. “Cabotinismo em mais alto grau”, na opinião do ex-prefeito Bernardo Ortiz e “Ridícula!”, segundo Antônio Mário, ex-prefeito. Assim agindo, o prefeito Roberto Peixoto fez mais um milagre. Depois de conseguir unir tucanos e petistas na cidade, agora conseguiu aproximar Bernardo de seu arquiinimigo Antônio Mário.

Por Paulo de Tarso Venceslau

Explicações iniciais
Antes de mais nada, vamos esclarecer o que vem a ser cabotino para que nosso leitor entenda as palavras do ex-prefeito Bernardo Ortiz. Trata-se de uma expressão muito usada em política mas que há anos caiu em desuso. Segundo Houaiss, cabotino significa um cômico ambulante ou, pejorativamente, um ator ou comediante de categoria inferior. No sentido figurado, é um indivíduo presunçoso, vaidoso, que se comporta afetadamente ou tenta atrair sobre si as atenções, e alardeia as qualidades que pretensa ou realmente possui.
O dicionário Michaellis é mais conciso. Trata-se de cômico ambulante, mau comediante, aquele que procura sempre fazer efeito e chamar sobre si a atenção alheia e, finalmente, dissimulado, hipócrita, tartufo.
Deu para entender agora a opinião do ex-prefeito?


Aos fatos
Tudo começou com uma pequena nota bem humorada da coluna Temperos da Tia Anastácia que já estava redigida. Confira a nota original:
“Óleo de peroba deve ser o produto mais consumido na prefeitura. Exagero? Pergunte para Tia Anastácia sobre o susto que levou quando fazia seu passeio diário no Parque Monteiro Lobato que fica em frente à Ford, ao lado do Hospital São Lucas. A velha senhora defrontou-se com uma placa onde se lê:

“Pavilhão Profª Luciana Flores Peixoto idealizadora e madrinha de todas as crianças de Taubaté”.

Tia Anastácia ficou sem saber se havia entendido o que estava escrito na placa. Ela jura que nunca soube que a prefeita era idealizadora de todas as crianças de Taubaté.” Ofendida, Tia Anastácia passou a reportagem para seu sobrinho preferido que saiu a campo em busca de informações que transformaram a nota em reportagem.

Breve Histórico
Bastaram alguns telefonemas e boa vontade de um leitor assíduo de CONTATO para que a apimentada história viesse à tona. Segundo o ex-prefeito Bernardo Ortiz, o Parque Monteiro Lobato foi construído na segunda de suas três gestões. Ao lado do Hospital São Lucas havia um terreno que o velho Rechdan ou seus herdeiros teriam vendido para a imobiliária São José. Quando a empresa apresentou seu ambicioso projeto à prefeitura, em 1993, Bernardo exigiu que a mesma doasse cerca de 100 mil metros quadrados à prefeitura. Não deu outra. A imobiliária cedeu o terreno e Bernardo inaugurou o Parque Monteiro Lobato em 1994. A placa inaugural não faz qualquer referência pessoal. Apenas que foi o povo de Taubaté quem construiu.
Posteriormente, em 1998, por ocasião do cinqüentenário da morte do nosso escritor, as fundações Banco do Brasil e Odebrecht decidiram construir uma sede permanente para homenagear Monteiro Lobato. Taubaté, sua cidade natal, foi escolhida para sediar “O Brasil Encantado de Monteiro Lobato”.
A exposição fazia parte do Projeto Memória idealizado pelas duas fundações para celebrar anualmente “personalidades ou fatos históricos que marcaram a vida nacional”, informa o Jornal da Cultura, de março de 2000, publicado pela Área Cultural do departamento de Educação, Cultura e Esporte. No dia 9 de abril de 2000, Antônio Mário inaugurou o pavilhão construído com recursos dessas duas fundações.

Cacarejando sobre ovos alheios
Em de abril de 2005, por ocasião das comemorações da semana Monteiro Lobato, o prefeito recém-empossado Roberto Peixoto mandou dar uma demão de pintura no pavilhão, recuperar alguns documentos e letras do alfabeto que precisavam de manutenção. Essa informação foi fornecida pela corintiana Rejane, uma jovem monitora que atende muito bem os visitantes daquela exposição permanente.
Terminada a “obra”, eis que o prefeito, tal qual o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, decide reinaugurar o Parque. Isso mesmo. O Parque Monteiro Lobato foi reinagurado no dia 18 de abril de 2005. Parodiando recente frase de FHC sobre Lula, em Taubaté, nosso prefeito “cacareja sobre os ovos alheios”.
Para não deixar dúvida sobre sua responsabilidade, Peixoto mandou afixar uma placa na parede ao lado da porta principal do pavilhão. O leitor poderá conferir na foto o que a está escrito na placa:

Reinauguração do Parque Monteiro
Lobato 18 de abril de 2005
“Propiciar lazer, educação e cultura para as
crianças é semear um mundo melhor”
Adm Eng Roberto Pereira Peixoto
Depto Ação Social Profª Luciana Flores Peixoto
Depto Educação Prof José Benedito Prado


Não satisfeito em inaugurar uma pronta e acabada obra construída pelos governos que o antecederam, Roberto Peixoto decidiu dar o nome de sua esposa e diretora do departamento de Ação Social ao pavilhão inaugurado em 2000.
Na coluna “Temperos de Tia Anastácia” estava escrito: Tia Anastácia tirou os óculos para conferir a frase tão mal escrita onde a prefeita é idealizadora de todas as crianças de Taubaté. Foi preciso muita água com açúcar para acalmar a veneranda senhora.

Repercussão
Consultado sobre mais esse episódio, Bernardo Ortiz afirma que Peixoto nunca poderia ter feito o que fez. “Só se a sua esposa tivesse morrido há mais de 5 meses e através de uma lei municipal”, dispara Bernardo que em seguida relata todo o processo que antecedeu a construção do Parque Monteiro Lobato..
Mais comedido, Antônio Mário afirma que desconhece qualquer acordo para que as fundações banquem a manutenção do prédio assim como desconhece o paradeiro da exposição permanente montada pelos artistas Elifas Andreato e J.C. Bruno como base nas criações lobateanas dirigidas às crianças. Mas alfineta: “É ridículo pegar uma obra feita e colocar ilegalmente o nome de uma pessoa viva”. Pensa mais um pouco e arremata: “O conteúdo de minha frase é: sem comentário”.
Provavelmente o prefeito e seu séqüito de puxa-sacos devem pensar que os munícipes são um bando de ignorantes e iletrados. Afinal, na entrada do Parque Monteiro Lobato tem uma placa velha, sem qualquer sinal de que tenha recebido alguma manutenção nos últimos anos, que pode ser conferida na foto abaixo, onde se lê:

PREFEITURA MUNICIPAL DE TAUBATÉ
PARQUE MUNICIPAL
MONTEIRO LOBATO
O POVO DE TAUBATÉ CONSTRUIU
NO ANO 1994

Serviço

Veja o que diz a Lei Orgânica do Município na Subseção VII, sobre Da Denominação,

Art. 67. É vedada a denominação de próprios, vias e logradouros municipais com o nome de pessoas vivas.

Art. 68. É vedada a alteração de denominação de via e logradouro público, exceto para restabelecer denominação anterior.


 

 

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Jornal CONTATO 2006