Por Paulo de Tarso Venceslau

Tem um “pobrema”
O telefonema de um “amigo” que você não conhece avisando sobre um acidente com o filho pode ser a senha para um seqüestro. Em Taubaté. A contra-senha foi o “pobrema”, uma expressão que jamais seria usada pelos amigos da filha. Restou uma única dúvida: informar ou não informar a polícia?


Dr. Paulo Pereira é uma pessoa muito querida em Taubaté. Incapaz de elevar o tom da voz, ele está sempre pronto para atender o chamado de alguém. Não importa se é amigo, rico ou pobre. É inimaginável que alguém em Taubaté queira que algo de ruim lhe aconteça. Tampouco à sua família que é obrigada a conviver com ausências inesperadas por tempos imprevisíveis. Essa é a rotina de quem cumpre religiosamente o juramento de Hipócrates que fez no momento em que recebeu o diploma de médico na Faculdade Medicina da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro.
Na terça-feira, 15, o telefone de sua residência tocou. Coisa mais natural para quem exerce 24 horas por dia a profissão que abraçou com amor e dedicação. Quem atendeu foi Nicelma, sua mulher, acostumada com os mais diferentes tipos de pacientes que ligam diariamente para sua casa.
Na terça, porém, havia algo diferente no ar. Do outro lado da linha, uma voz nervosa confere tratar-se da casa do médico para, em seguida, informar que a filha havia sofrido um acidente, mas que não precisavam se preocupar.
__ Como não vou me preocupar? Quem é o senhor? Onde minha está hospitalizada?
__ Sou colega da sua filha. Não se preocupe. Ela está bem.
__ Se ela está bem, porque está me ligando? Qual é o seu nome?
__ Fique calma. Meu nome é Pedro. O pobrema é...
Nicelma desliga o telefone com um único golpe.
__ Amigos de minha filha não falam pobrema.
Nervosa, ela relata ao marido que a tudo assistia sem entender o que estava acontecendo. Antes de contar os detalhes, toca o telefone celular de Paulinho Pereira.
__ Dr. Paulo, sua filha sofreu um acidente, mas está tudo bem com ela. Eu preciso do seu telefone fixo...
Imediatamente, Paulinho desliga o telefone. Liga para sua filha que lhe conta que está tudo bem. A neta também está tranqüila. Recuperando o número que havia ligado a cobrar para seu celular, o médico descobre que se trata de um celular com código de área do estado do Rio de Janeiro. Trata-se de um golpe bastante conhecido. Se Nicelma não conhecesse tão bem as filhas que têm, poderia ter sido enganada e, assustada, ter se deslocado para o endereço fornecido pelo bandido, onde estaria a filha “acidentada”. O raciocínio rápido e frio contribuiu ainda mais para fazer o que tinha de ser feito.
O telefone usado tem código de área do Rio, mas poderia estar sendo usado por um bandido protegido nos presídios mantidos com o meu, o seu, o nosso suado dinheirinho. Vai saber!
Perguntado sobre as providências que tomaria, Pereira afirma que não fará coisa alguma. Teme que sua denúncia chegue ao conhecimento dos bandidos.
Aí mora o perigo. O silêncio é tudo o que esses marginais querem. E nós pagamos impostos exatamente para que o Estado, através de suas instituições como a polícia e a Justiça, proteja cidadãos honestos e trabalhadores.
Ninguém, em sã consciência, é capaz de afirmar que todos os policiais sejam honestos. As instituições são constituídas por pessoas com qualidades e defeitos. Não importa se a instituição seja uma igreja, um quartel, delegacia ou uma instância de poder. Temos de municiar a polícia com informações. O silêncio das vítimas é tudo que os bandidos – fardados ou não, marginais ou de colarinho branco, de batina ou pai de santo – querem.
A inteligência precisa de informações para traçar suas ações que poderão levar à prisão dos bandidos e da rede de apoio que, muitas vezes, envolvem colegas de trabalho. Dr. Paulo ficou de consultar um policial amigo para saber o que fazer. Uma atitude acertada.



 

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