Meu
querido filho.
Tudo pronto: terno novo, a melhor gravata, camisa a ser
estreada, os sapatos coordenados com o cinto, o lenço
branco que não poderia faltar em face da promessa
de muitas lágrimas. Tudo, tudo, arrumado, dobrado,
bonito. Basta agora o gesto final: colocar na mala. Olhando
esses pertences, me emocionei pensando na metáfora
do arranjo das coisas materiais e em seu significado espiritual,
profundo. De certa forma, o conjunto da roupa escolhida
parecia olhar para mim e querer me envolver com outra roupagem,
vestes da nossa história pessoal, de uma relação
feliz de pai e filho. Então senti que a vida me dava
um sorriso cálido, afetuoso, e que tudo aquilo era
apenas o ápice de uma legenda que escrevemos, vida
afora, juntos. Dei asas à imaginação
e, num rompante veloz, redesenhei nossos caminhos. E que
trajeto bem resolvido, quase perfeito nas imprecisões
vivenciais, nas idas e voltas que o existir impõe.
Caçula, fiquei prenhe de
ternura ao receber a notícia da gravidez que o traria
ao mundo. Foi algo diverso de outras duas experiências
de paternidade que, aliás, preparam a serenidade
com que recebi a sua. Depois, veio a decisão do nome
e esta foi prerrogativa de sua mãe. Seu avô
Abrahão batalhou muito para que outra fosse sua designação,
e, creia, chegar ao veredito Pedro Charbel foi um ingente
ato de diplomacia parental. Aprendi, então, que seu
papel na história familiar, seu destino, seria exatamente
este, de conciliador, de alguém que serve para juntar
partes. E ao longo de nossos dias desenvolvemos a prática
“dos panos quentes”. Pois é, quantas
vezes nos chamamos e dissemos “é chegada a
hora, converse com todos, acerte os passos desencontrados”.
E sempre resolvemos tudo.
Mas houve também trabalhos físicos que clamaram
cuidados especiais. Ainda com meses de vida, precisamos
da interferência ortopédica; a fartura de dentes
demandou cirurgias; o crescimento precoce e exagerado trouxe
tantas preocupações. De todos estes problemas,
porém, outras características suas afloraram:
paciência e resignação. Tenho aprendido
muito com você sobre o verbo aceitar, sobre recomeços
e retraços de atalhos equivocados. E me engrandeço
no reconhecimento das formas de contornar o inevitável.
Há, contudo, uma outra marca que o registra como
especial: saber escolher. E aí entram os predicados
da noiva. Beleza, energia e sapiência se harmonizam
em Nely de forma a completar da maneira mais perfeita o
quadro das noras encantadoras, filhas que não tive.
Nem dá para descrever o quanto minhas meninas preenchem
o sonho de um sogro. E Nely veio de Minas, com o sotaque
que contagia nossa paulistanidade caipira. Cheia de “uais”,
“trens”, se ajustou ao exótico nosso
como se apenas fosse um tempero adicionado. Ela já
é parte do que sempre fomos.
Resta agora a cerimônia. Acompanhei os detalhes que
se estenderam ao longo de um ano. Nada sairá diferente
dos sonhos seus: música, flores, doces, convivas.
Todos os mínimos pormenores foram tratados como se
fosse o centro do mundo. E como tivemos que nos submeter
à potência dos sonhos de vocês dois.
Agora resta esperar pelo melhor. E que as lágrimas
que hão de rolar fertilizem o solo do seu futuro,
de sua mulher e de quantos gostam de você.
Fique com o beijo abençoado do seu pai.