Por
Paulo de Tarso Venceslau
e
Jorge Fernandes
Transporte
público
Ninguém
se entende
Tarifa
unificada e sistema de bilhetagem eletrônico dominaram a audiência
pública feita pela Câmara Municipal para apontar soluções
para o setor de transporte público de Taubaté. A crise
no sistema ganhou novos contornos desde que a prefeitura decidiu
por decreto unificar a tarifa.
A
audiência pública expôs à população
as falhas do transporte público de Taubaté e ainda
serviu para exibir a falta de união entre as partes envolvidas
para solucionar a questão: prefeitura, empresa ABC Transporte,
permissionários do TCTau, motoristas e cobradores com o respectivo
sindicato e os mototaxistas. Esta foi a imagem que ficou da audiência
pública promovida pela Câmara Municipal para discutir
a crise no setor, realizada na noite de quarta-feira, 29.
Cada lado defendeu seus interesses próprios sempre colocando
no pedestal a população – este sim, o setor
mais afetado pela carência do o transporte público.
Diferente de outras audiências, desta vez o plenário
da Câmara foi disputado palmo a palmo. De um lado, permissionários
do TCtau, com familiares, exibiam cartazes cobrando reivindicações.
De outro, cobradores e motoristas da ABC, que estão na iminência
de sofrer demissões, também ostentavam cartazes. Um
princípio de conflito entre os dois setores foi logo controlado
pelo efetivo da polícia militar, que fez a segurança
dentro e fora da Câmara.
A audiência pública começou com quase meia hora
de atraso e a ausência mais sentida, segundo os participantes,
foi do Ministério Público.
Prefeitura
Carlos Eugênio Monteclaro César Júnior, diretor
do Departamento de Trânsito, foi o primeiro a falar sobre
o tema, o suficiente para virar o principal alvo de críticas,
principalmente por parte do TCtau. Para Monteclaro, Taubaté
possui a “abrangência do sistema de transporte”,
mas carece de “uma ampliação do serviço
de transporte público”.
O diretor de Trânsito frisou que a prefeitura espera “esforços
concentrados e responsabilidade das partes” para apontar diretrizes
ao sistema de transporte público.
Com base em um estudo desenvolvido por técnicos do Trânsito,
Monteclaro César Júnior explicou o porquê de
unificar as tarifas e fez um diagnóstico dos gastos de manutenção
e arrecadação do transporte complementar. “O
TCtau está bem pior do que vocês imaginam”, pontificou
o burocrata que quer ser mais realista que o rei.
De acordo com o estudo técnico, os 88 permissionários
do TCtau arrecadam por dia uma média de R$ 248,26, se levados
em consideração o valor de R$ 1,50 cobrado, desrespeitando
decreto do prefeito Roberto Peixoto (PSDB) que estipulou tarifa
única de R$ 1,80. O Tctau arrecada quase R$ 7.500 por mês
que, segundo Monteclaro, a fica abaixo do custo de manutenção
do transporte complementar de Taubaté.
“O valor da tarifa atual não suporta os gastos. Talvez,
nem com [valor de] R$ 1,80 suportaria”, afirmou a autoridade
do Trânsito de Taubaté. Para ele, se a legislação
do transporte complementar fosse aplicada e com isso os permissionários
transportassem 14 passageiros por dia como manda a lei, o quadro
ficaria ainda pior. A arrecadação mensal cairia ficando
na casa de R$ 3.822 aproximadamente. O valor foi feito, de acordo
com o estudo, tendo como base o preço de R$ 1,50. Ou seja,
o desrespeito pelo cidadão contribuinte tem a conivência
de nossas autoridades.
Com a tarifa unificada, imposta por decreto pelo prefeito Roberto
Peixoto, a cifra mensal passaria a ser da ordem de R$ 4.586,40 –
levando-se em consideração a legislação
atual. “Não paga o custo operacional do sistema e vão
trabalhar no vermelho mesmo”, disse Monteclaro. Segundo o
estudo, as vans consomem mensalmente cerca de R$ 5.600 e os micros
quase R$ 7.750. O chefe do Trânsito defendeu uma atualização
da lei. “Não foi a atual administração
que fez essa lei. Ela [lei] deve ser atualizada”.
O diretor de Trânsito apontou ainda outras duas soluções
para equacionar o problema: horário e itinerário revistos
e trabalho em conjunto. “Ninguém vai ficar rico, mas
dá para pagar as contas decentemente. Queremos mostrar que
há espaço para todos”, afirmou. Por fim, ressaltou:
“Não há crise no sistema de transporte de Taubaté”.
ABC
Transportes
Laércio Antônio de Oliveira, diretor operacional da
ABC Transportes, falou logo em seguida. Segundo ele, à empresa
interessa “contribuir para o desenvolvimento da cidade”
e a “ABC vem cumprindo toda a legislação”.
Vereadores contestaram a afirmação porque, segundo
estudo técnico da Câmara, a ABC cobra tarifa de pessoas
que acompanham, por exemplo, deficientes físicos que têm
passagem livre.
O diretor da ABC afirmou que a empresa está dois anos sem
reajuste tarifário e que nesse intervalo houve redução
de 18% de passageiros e 26% de veículos. Mesmo assim, salientou
Laércio, a “ABC continua investindo e buscando qualidade
no sistema que opera”. A empresa investiu, segundo o diretor,
“R$ 12 milhões em frota”, que é renovada,
em média, num período de cinco anos.
Laércio disse ainda que a ABC transporta por mês cerca
de 800 mil passageiros e que, desse total, 14% são estudantes
que pagam tarifa com desconto e outros 8% que tem passagem livre.
Por fim, afirmou que a empresa “já apresentou à
prefeitura projeto de modernização do sistema”.
Críticas
Se até aquele momento o clima era mormo, apenas com manifestações
esparsas do plenário, o ambiente ganhou nova coloração
com o pronunciamento dos representantes do (TCtau) Transporte Complementar
de Taubaté e do sindicato dos motoristas e cobradores.
O advogado da TCtau, Carlos Silva, partiu para ofensiva e escolheu
o diretor de Trânsito como alvo principal. De forma irônica,
disse que a ABC Transportes teve mais tempo de apresentação
porque Monteclaro César Júnior agiu como “advogado”
da empresa. Silva lamentou o que classificou como “escorregão”
do titular da pasta de Trânsito.
Depois, foi a vez da presidente da Associação do TCtau,
Silvana Fontes, que também direcionou suas críticas
ao diretor do Departamento de Trânsito. Usando da mesma ironia
do advogado Carlos Silva, Silvana disse que “Monteclaro [está]
muito preocupado com o TCtau” e que não consegue entender
a matemática aplicada pela prefeitura para unificar as tarifas.
Ressaltou ainda que a categoria briga pela livre concorrência.
Silvana desqualificou o estudo feito por técnicos do Departamento
de Trânsito e afirmou categoricamente que os permissionários
do TCtau têm condições de ope-rar com tarifa
reduzida. Para ela, a situação não é
de conflito com os motoristas e cobradores da empresa ABC Transportes.
“Estamos preocupados porque não queremos ser esmagados
e nem que os motoristas da ABC percam o emprego”. Segundo
Silvana, o conflito é “patronal”.
José Carlos de Souza, presidente do Sindicato dos Condutores
do Vale do Paraíba, acusou a ABC de guerra psicológica
ao ameaçar de forma recorrente a categoria com demissões.
“Se a empresa demitir, o transporte de Taubaté pára”,
desafiou Souza, que culpou a administração pública
pela crise no setor.
Câmara
Os vereadores defenderam o cumprimento da legislação
ao mesmo tempo em que pediram revisão da lei do transporte
complementar de Taubaté. “Lei foi feita para ser cumprida
se não vira bagunça.
Essa lei do Tctau deveria ser mudada há muito tempo. Falta
fiscalização por parte do Departamento de Trânsito”,
disse Luizinho da Farmácia (PDT). Jeferson Campos (PT) chamou
a responsabilidade da discussão para a Câmara Municipal
e disse que já recomendou à presidência do Legislativo
a contratação de uma consultoria para analisar e apontar
soluções para o transporte público.
Após quase quatro horas de debates, chegou-se a um desfecho.
Uma comissão, composta por representantes da Prefeitura,
Câmara, ABC Transportes, Tctau e sindicatos, foi nomeada para
dar fim ao impasse do transporte público de Taubaté.
Falta
de criatividade
Paris,
na época em que a França era governada por Charles
de Gaule, esteve à beira de um colapso no seu sistema de
transporte público. Diante da dimensão da crise, o
velho marechal convoca representantes dos três setores diretamente
interessados: o Estado que tem a obrigação de oferecer
transporte público para garantir o direito de ir e vir; os
empresários que têm interesse que seus funcionários
não cheguem atrasados nos locais de trabalho; e os usuários
que querem ser transportados de forma eficiente e decente por um
preço compatível com seu bolso.
Dessa reunião resultou a formação de uma Câmara,
denominada de sindicato em francês, com autonomia para gerir
o sistema. Ou seja, ali o Estado tem apenas 1/3 do poder para aprovar
ou vetar. Duas medidas tomadas foram decisivas, além da autonomia
para resolver o problema e criar um dos sistemas mais modernos e
eficientes do mundo, desde então.
A primeira foi dividir igualmente as responsabilidades, ou seja,
o custo do sistema de transporte público foi rateado em três
partes iguais e cada qual ficou responsável pela sua. Os
usuários dividiram sua cota pelo número estimado de
passageiros. Portanto, 1/3 viria do bolso de cada usuário.
O Estado bancaria o outro 1/3 e os empresários se cotizariam
para cobrir a sua parte.
A segunda medida, decorrente da autonomia, foi a gestão tripartite
que decide, desde então, o planejamento para prover Paris
de moderno sistema de transporte. E quando se fala de planejamento,
gente séria fala de recursos e despesas. Naquele caso, a
Câmara decide o que, quanto e como investir em cada modo de
transporte, basicamente composto por trem, metrô e ônibus.
O sistema é tão integrado que até mesmo nos
pequenos bondes que atendem pontos turísticos o mesmo ticket
é usado.
Seria muito interessante que nossas ôtoridades freqüentassem
os bancos de escolas no Brasil onde essas experiências são
estudadas e debatidas. E um dia, quem sabe, fossem com seus próprios
recursos conhecer in loco com funcionam. PTV
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