O Quarteto em Cy acaba de lançar Janelas abertas (Fina Flor). Bem, isto posto, eu devo alertá-los, prezados leitores, para não esperarem de mim nenhuma isenção
Vamos combinar: onde já se viu ter em mãos o trabalho de duas quase irmãs sem qualificá-lo como algo admirável? Algo capaz de produzir um tal estado emocional que me faz temer não conseguir ajuntar em frases palavras ornadas com as mais finas sedas?
Assim sendo, leitores, peço licença para fazer deste comentário um relato histórico. E assim, descaradamente, sem um pingo de sentimento de culpa, vamos ao que interessa neste momento.
Desde muito, reconheço as vozes de Cyva e Cynara – assim como também reconhecia as vozes de Cybele e Soninha – só pela respiração. As vozes de Keila e de Corina ainda não, mas tenho a pretensão de viver mais para ouvi-las sempre, e assim também reconhecê-las à distância.
Bom, essa audição foi a primeira vez em que ouvi a formação atual do Quarteto, com Corina no lugar de Soninha. Um arrepio me varreu desde o cérebro até o coração, percurso este que comumente qualificamos como “chegar à alma” – tudo o que nos atinge e não sabemos explicar tendemos a qualificar como “alma” –, uma espécie de síndrome que atinge quem, diante da beleza, tem o privilégio de sentir arrepios, suores frios e lágrimas impertinentes.
As Cys sempre primaram pelo bom gosto na escolha do repertório e pelo talento com o que interpretam…
Aqui parei de escrever. Fui em busca da biografia das baianinhas (como Vinícius de Moraes chamava), As meninas do Cy (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo), escrita por Inahiá Castro, sobre a qual eu escrevi: “[A biografia] me fez viajar no tempo, quando, dentre outras situações, relembra as quatro voando para Los Angeles, Cyva casada com [dono da gravadora Elenco] Aloísio de Oliveira (…). [Lembrou-me] ainda de outro momento importante, em que o Teatro Carlos Gomes foi todo reformado por nós, apenas para o show ‘Cobra de Vidro’. [Por fim] me pergunto: depois das lembranças, o que resta? Restam os dias de quietude saudosa e da desconsolação? Ora bolas, tudo isso restará. Mas principalmente restará o canto, pois, para quem sempre viveu dele, ele será eterno”.
Abrir janelas, como hoje faz o Quarteto em Cy, é belo por confrontar o desconhecido, que pode conter encantos; é belo por abrigar as graças do mundo, que podem, sem medos nem aflições, a cada mirada, mostrar novas formas de beleza. E por fim, como diz João Cabral de Melo Neto: “(…) É tão belo como as ondas em sua adição infinita (…)”.
De sua janela, o Quarteto em Cy abre a cantoria e agora voa numa lufada de brisa benfazeja… “Ei, ei, Aquiles, e o comentário sobre o disco novo das Cys? Esqueceste?” Xiii, confesso que me perdi por entre as frestas da memória.
Sendo assim, quando agora me resta pouco espaço, tomo uma decisão: por hoje é só. Mas na semana que vem eu me aterei a Janelas Abertas, o CD recém-lançado pelo Quarteto em Cy.
Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4