Entrevista sobre a retomada do julgamento pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pede a cassação da chapa Dilma Rouseff-Michel Temer e o afastamento do presidente da República
Quais são as perspectivas desse julgamento histórico, o primeiro em que a Justiça Eleitoral julga um presidente no Brasil?
JNêumanne: É a primeira vez em que a corte eleitoral julga a cassação de uma chapa presidencial. A análise da ação ocorre em um momento de agravamento da crise política após a divulgação da delação do empresário Joesley Batista, da JBS, que levou à abertura de inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) contra Temer. Para fazer garantir sua defesa, o presidente instalou um gabinete de crise, no 3.º andar do Palácio do Planalto, e, desde a delação, ampliou o núcleo que o assessora tanto na estratégia jurídica como na política O cenário político de agora é diverso do identificado há pouco menos de um mês, quando o governo confiava numa vitória na corte eleitoral. A perspectiva no Planalto era de placar favorável à tese do presidente de que é preciso separar as condutas dele e da ex-companheira de chapa. Diante disso, houve uma guinada na estratégia de protelar ao máximo o processo. Só que, de acordo com a reportagem de Breno Pires, Isadora Peron, Vera Rosa, Tânia Monteiro e Carla Araújo, delação de acionistas e executivos do grupo J&F – holding que inclui a JBS -, porém, revestiu de incertezas o julgamento no TSE – considerado sem precedentes na história do tribunal – e deixou o presidente acossado por uma investigação criminal, na qual é suspeito dos crimes de corrupção passiva, obstrução de Justiça e participação em organização criminosa.
Temer, Dilma e Lula quando eram felizes
Que mais?
JN: Outra notícia preocupante acaba de chegar para Temer e indica que não pararam as novidades que podem influir no julgamento que começa hoje no TSE e principalmente na decisão do Supremo sobre o primeiro caso de investigação de um presidente na História: o ex-ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves é alvo de um mandado de prisão em um desdobramento da Operação Lava Jato deflagrado agorinha mesmo. O ex-deputado Eduardo Cunha também é investigado. Ambos são do PMDB e foram presidentes da Câmara dos Deputados. Batizada de Manus, a operação investiga corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro na construção da Arena das Dunas, em Natal/RN. O sobrepreço identificado chega a R$ 77 milhões. São cumpridos, 33 mandados, sendo cinco mandados de prisão preventiva (sem prazo), seis de condução coercitiva, quando alguém é levado a depor, e 22 de busca e apreensão nos no Rio Grande do Norte e no Paraná. A investigação realizada se iniciou após a análise das provas coletadas em várias das etapas da Operação Lava Jato que apontavam solicitação e o efetivo recebimento de vantagens indevidas por dois ex-parlamentares cujas atuações políticas favoreceriam duas grandes construtoras envolvidas na construção do estádio.
O nome da operação refere-se a um provérbio latino, que vijrou brocardo em português: “manus manum fricat, et manus manus lavat”, cujo significado é: uma mão esfrega a outra; uma mão lava a outra. Viche, parece mau presságio.
Seja qual for o resultado desse imbróglio todo, este é um momento decisivo, não apenas de Temer, mas também do TSE. A Justiça Eleitoral tem sido muito questionada e sua própria razão de ser está em jogo. Se decretar a impunidade, como esperam o PT, o PMDB e agora até o PSDB, que a pediu, será desmoralizada de vez, superando todo seu histórico de omissão e as dúvidas existentes sobre sua efetividade.
Temer falou o tempo todo, nos bastidores
A Polícia Federal enviou um rol de 82 perguntas ao presidente Michel Temer no inquérito da Operação Patmos – investigação que põe sob suspeita o peemedebista no caso JBS. Na semana passada, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), deu 24 horas para o presidente responder às indagações dos investigadores. O que a PF quer saber de Temer?
JN: A Polícia Federal questionou o presidente sobre as razões que o levaram a receber no Palácio do Jaburu, na noite de 7 de março, o empresário Joesley Batista, da JBS – a quem o próprio Temer, em declaração pública, classificou de ‘conhecido falastrão’. O presidente afirmou que o áudio foi ‘manipulado, adulterado’. No questionamento ao presidente, a PF indaga ‘qual o motivo, então, para tê-lo (Joesley) recebido em sua residência, em horário não usual, em compromisso extraoficial e sem que o empresário tivesse sido devidamente cadastrado quando ingressou às instalações do Palácio’. Nessa conversa, Joesley narrou a Temer uma rotina de crimes, como o pagamento de contribuição de 50 mil reais mensais ao procurador da República Ângelo Goulart e mesada milionária da Eduardo Cunha, em troca do silêncio do ex-presidente da Câmara, preso desde outubro de 2016 na Operação Lava Jato. Segundo os investigadores, a reunião serviu para Temer ‘escalar’ Rocha Loures como seu interlocutor com a JBS para tratar dos interesses do grupo no governo. Temer alega que o áudio foi ‘manipulado, adulterado’. O áudio está sendo submetido a uma perícia no Instituto Nacional de Criminalística, braço da Polícia Federal.
Na parte final do interrogatório a Polícia Federal investiu na área econômica do Governo. Os delegados federais Thiago Machado Delabary e Marlon Cajado Oliveira dos Santos fizeram questionamentos ao presidente sobre o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e sobre o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), cuja presidente Maria Silvia Bastos Marques pediu exoneração em meio à crise política. Os delegados perguntaram ainda se Temer autorizou o empresário a apresentar ‘pontos de interesse’ a Henrique Meirelles e quais seriam esses pontos. Em outro trecho da conversa, o executivo da JBS fez menção a uma operação do BNDES e supostamente faz referência à ex-presidente do Banco. Os delegados consideram que Temer demonstrou ter conhecimento da operação e o questionam se fez alguma solicitação a ‘ela’. O ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) – condenado a 15 anos e 4 meses de prisão na Operação Lava Jato – foi alvo de uma parte do extenso questionário. Os delegados federais Delabary e Santos questionam Temer sobre o sentido da frase ‘tem que manter isso’.. A enigmática frase foi dita por Temer em conversa com o empresário Joesley Batista, da JBS. No meio do diálogo, gravado pelo executivo, na noite de 7 de março, no Palácio do Jaburu, o presidente aconselhou Joesley: “Tem que manter isso, viu?”
Temer acabara de ouvir de seu interlocutor um relato sobre Eduardo Cunha, preso desde outubro de 2016 na Operação Lava Jato.
Na reportagem do Estadão, assinada por Fausto Macedo, Fabio Serapião, Julia Affonso e Breno Pires ficamos sabendo que, ao decretar a prisão preventiva do homem da mala Rodrigo Rocha Loures, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, afastou a tese de ilegalidade no áudio Joesley/Temer. Segundo o ministro, a jurisprudência da Corte ‘é pacífica no sentido de que é lícita a captação ambiental de conversa feita por um dos interlocutores mesmo sem o conhecimento do outro’.
Após uma intervenção política do governador Geraldo Alckmin (PSDB) e um discurso inflamado do prefeito João Doria (PSDB), o diretório estadual do PSDB de São Paulo recuou e decidiu ontem não tomar uma posição oficial sobre o desembarque do partido do governo do presidente Michel Temer (PMDB). Que consequências essa confirmação de ficar em cima do muro influirá no desempenho dos tucanos em 2018?
Dilma e Temer, inseparáveis desde 2012
JN: Esse foi o segundo recuo do braço paulista do PSDB. Na semana retrasada, a Executiva do partido se reuniu, mas acabou por não chegar a uma decisão oficial. A expectativa da reunião plenária convocada para ontem, e que reuniu cerca de 200 pessoas, entre prefeitos, deputados, vereadores e lideranças na sede do partido na capital, era de que os tucanos paulistas pedissem oficialmente que o partido entregasse os cargos no governo, o que ampliaria em pressão sobre a bancada federal tucana.
Cerca de 1 hora e meia antes do início das audiências do patriarca da Odebrecht, Emilio Odebrecht, e do executivo da empreiteira Alexandrino Alencar, os advogados do ex-presidente Lula entraram com um habeas corpus, com pedido liminar, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) para cancelar os depoimentos. Que consequências teve esse pedido?
JN: As audiências começaram às 2 da tarde antes do anúncio da decisão do TRF4. Os executivos da Odebrecht prestaram depoimento em ação penal sobre propinas pagas pela empreiteira, no esquema que seria liderado pelo ex-presidente. Os valores teriam chegado a 75 milhões em oito contratos com a Petrobrás e incluíram terreno de 12 milhões e meio para o Instituto Lula e cobertura vizinha à residência de Lula em São Bernardo de 504 mil reais. O advogado Cristiano Zanin Martins argumenta que o juiz federal Sérgio Moro ‘deu ciência às partes’ nesta segunda sobre documentos juntados pelo Ministério Público Federal sobre delações de executivos do grupo Odebrecht. Segundo a defesa, há ‘impossibilidade de análise do material até as 14 horas’. O relator Gebran negou metade e aceitou metade do pedido da defesa de Lula. Manteve o depoimento de ontem e deu três dias de prazo para a defesa tomar conhecimento e reinquirir a testemunha se necessário. Moro disse que o advogado estava tentando humilhar a testemunha.
O TSE pode concluir que os dois são inseparáveis
Os procuradores da Lava Jato afirmam que Lula, enquanto ainda era presidente, recebeu o apartamento vizinho ao dele, em São Bernardo do Campo, e um terreno de 12 milhões de reais onde seria construída a nova sede do Instituto Lula. A obra não chegou a sair do papel. Os imóveis teriam sido oferecidos pela Odebrecht em troca da interferência do presidente em oito contratos da empreiteira com a Petrobrás. Ao ser questionado pelo juiz Sérgio Moro, o ex-executivo da Odebrecht, Alexandrino Alencar, declarou que a oferta dos imóveis à Lula tratava-se de um favor político.