Poucas vezes em minha produção de crônicas – e olhe que a lista é longa, passa de 500 – falo de política no sentido estrito do termo. Acontece que a coleção de tensões acumuladas ao longo dos últimos anos tem posto em questão o uso de espaços que precisam ser exercitados e exibidos como urgentes. Foi neste sentido que resolvi aproveitar minhas colunas semanais para ousar um pouco mais, sempre na busca de acertos. Depois de duas investidas recentes recebi comentários de alguns leitores amigos. E não foram bons…
A primeira crítica veio de uma ex-aluna que dizia “professor, não gostei dos seus comentários sobre política… seu estilo não combina com o conteúdo e a leitura não foi agradável”. Outra, mais contundente, revela que “suas opiniões não parecem sinceras porque se diz neutro, mas os comentários não disfarçam”. Confesso que fiquei cabreiro. Pensei em agradecer, pegar o chapéu (ou pendurar a chuteira) e voltar para as temáticas de sempre, para os acarinhados assuntos culturais ou de comportamento, menos políticas no sentido das opiniões eleitorais próximas. Não foram poucas as meditações sobre isso, e nem faltaram temas oportunos fora da agenda corrente.
Mas… mas, resolvi insistir ainda um pouco, e assim dar vasão ao conteúdo represado em comportas de silêncio, decepções e alienação. Por lógico, considerei as duas opiniões francas e procedidas na direção do diálogo. Frente ao primeiro caso, devo concordar, pois meu estilo (se é que posso dizer assim) é menos sóbrio ou neutro, sutilmente mais ameno e sempre tendente a sensibilizar os leitores. Gosto do jeito meio manso de explanar e. sei bem, isso não condiz com o conteúdo analítico que pretendi dar ao escolher tópicos. A outra observação remete à minha incapacidade de traduzir posições que se esgotam na imparcialidade. Esta doeu mais, pois atingia em cheio minha boa vontade em ponderar sobre a necessidade de falar de temas sem tomar partido. É claro que a contradição emergiu, pois me declaro publicamente contra a besteira que é indicada em posições como “escola sem partido”. Vesti a carapuça. E agora?
Somando e dividindo, acabei por fazer um exame de consciência e emoldurar tudo no quadro atual. Creio que achei uma resposta: continuar, mas sem me esconder. Meu impulso para alvejar o tema político se deve a dois fenômenos novos: a individualização da política e à mídia, ou seja, às soluções de divulgação das propostas dos candidatos. Antes de avançar, convém reconhecer que nenhuma das apresentações até o presente permitiu profundidade no exame de programas. Duvida-se mesmo que eles existam. Talvez o novo modelo de controle dos gastos eleitorais, o empobrecimento das participações sempre comprometidas com o dinheiro privado seja um dos responsáveis mais diretos pelo formato dos debates televisivos. Sem dúvida, isso aliado ao pouco tempo de campanha, tem produzido exposições aberrantes do caráter de cada candidato. A identificação dos prepostos com dizeres rápidos e demais personalizados tem produzido efeitos que valorizam pessoas e não questões político partidárias, nem causas sociais de implicações continuadas e amplas. Tudo é muito tópico, a favor ou contra (uso de armas, aborto, igualdade de gênero, cancelamento de dívidas no serviço de proteção ao crédito, indicação apressada de ministros). Desdobramento imediato dessa individualização remete a reprodução também em flashes fugidios nas redes sociais. Tudo é muito instantâneo e convida a polarização indesejável. Por certo, há novidades promissoras e entre algumas, seguramente, o papel das mulheres merece destaque. A mera constatação de que mais de 50% do eleitorado é feminino alenta muito.
Mulheres protestando contra o presidente Michel Temer em maio
A questão da mulher eleitora se torna vital não apenas pelo reconhecimento do papel social delas no conjunto da vida nacional, mas também, e até porque, elas representam elos fundamentais na problemática nacional. Veja-se sob esta chave a questão a saúde. Sendo que o ventre materno é o primeiro meio ambiente gestacional da vida, implica a mãe em situações como cuidado com a gravidez, parto, cuidados neonatais, vacinas. A multiplicação desses fatores eleva a relevância da mulher com ser político que tem protagonismo essencial. A educação formal, o acompanhamento dos filhos na infância e adolescência, o encaminhamento do trabalho pelo primeiro emprego, o zelo familiar até a senilidade, tudo passa pela mulher. Nessa linha, a meditação sobre o voto feminino convoca posicionamentos que vão além de preconceitos e da moralidade cínica do mercado de trabalho. A igualdade de direitos é um dever, não pauta temática isolada.
Em termos práticos, sabe-se que mais de 40 % dos lares brasileiros são conduzidos por mães de baixa renda e são elas que decidirão os resultados. É fácil ficar pasmado ao se ouvir que o grande contingente de intenções de votos nulos ou brancos são dessas mulheres. Acredita-se, contudo, que isto mude. E há de se transformar na medida em que os argumentos sejam expressos. Neste sentido, muito além de estilo de redação, tentativa de neutralidade, vale-se do diálogo para descer do muro e se posicionar claramente. A primeira certeza que tenho encaminha minha decisão pública a candidaturas que centralizem o papel da mulher como ser dotado de direitos políticos compatíveis com os homens. E que além de tudo são responsáveis pelos destinos políticos do nosso estado.