Nem mesmo a hierarquia militar está rendo respeitada. A demissão do general Santos Cruz pelo capitão Bolsonaro é o sintoma mais evidente que o pirão desandou de vez. Não há qualquer luz no fim do túnel
General Carlos Alberto Santos Cruz é uma das raras cabeças pensantes nessa democracia militar. Um homem preparado e talvez um dos poucos generais que participou de combates. Os generais de plantão e ou de pijama não sabem o que é um combate real. O Brasil já teve marechais, patente que só heróis da guerra mereciam. Mas é outra história.
Escolhido pela ONU para assumir o comando da missão de paz na República Democrática do Congo (MONUSCO), comandou 23,7 mil militares de 20 países. Ali trabalhou até 2 de dezembro de 2015.
Gaúcho de Rio Grande, família de poucas posses, nunca deixou de ler e estudar todos os livros que tinha acesso. Esse fato que poderia passar ao largo permitiu que se destacasse nas fileiras do Exército Brasileiro. Entre 2001 e 2003 foi adido militar junto à Embaixada do Brasil em Moscou, Rússia. Como general de brigada desde 2004 comandou a missão de paz no Haiti (Minustah) entre setembro de 2006 e abril de 2009, comandou 12 mil militares. Atingiu o posto de general de divisão de março de 2009.
Santos Cruz, uma rara cabeça pensante na selva verde-oliva
No retorno ao Brasil, comandou a 2ª Divisão de Exército. Passou para a reserva em novembro de 2012. Em seguida tornou-se assessor especial do Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. foi comandante do Comando de Operações Terrestres. Passou para a reserva em novembro de 2012. Em seguida tornou-se assessor especial do Ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.
No Congo, o helicóptero em que viajava foi derrubado pelos insurgentes. Santos Cruz saiu ileso. Em abril de 2014, à Folha de S.Paulo que “a ONU não é onipresente e não pode ser responsabilizada por crimes que não pode impedir”, “os grupos que atuam na região são puramente criminais” e que “a gente nunca se acostuma com o sofrimento humano”.
Essa é um dos fatores de o diferenciam dos outros generais.
Substituto e justificativa
Assume o cargo o general Luiz Eduardo Ramos Baptista Pereira, comandante militar do Sudeste. Detalhe: general da ativa. Bolsonaro justificou a decisão por uma “falta de alinhamento político-ideológico” e embates com outros integrantes do próprio governo. Leia-se, o núcleo ideológico capitaneado Olavo de Carvalho e os filhos do presidente.
Santos Cruz vinha sofrendo um processo de fritura há pelo menos dois meses. Bolsonaro já teria decidido exonerar o general no início de maio, quando mencionou que haveria “um tsunami”. Mas teria cozinhado o galo até criar um consenso entre a equipe que a permanência do ministro era insustentável. Bolsonaro estaria emitindo sinais de “irritação” com a reação em grupo dos militares às críticas de Olavo de Carvalho, que comandou os disparos contra Santos Cruz e o vice-presidente Hamilton Mourão.
De acordo com auxiliares do presidente, Bolsonaro teria aumentado seu descontentamento ao ver a imagem de uma conversa por Whatsapp, supostamente escrita por Santos Cruz, na qual o ministro o chamaria de “imbecil” e sinalizaria aprovar a “solução Mourão”. General Heleno entrou em cena para colocar panos quentes e revê sucesso quando Santos Cruz acompanhou o presidente em uma viagem a Dallas, nos Estados Unidos, em meados de maio.
Fogo “amigo”
Em maio, passou um dia sob ataques nas redes sociais. A hashtag #ForaSantosCruz se tornou um dos assuntos mais comentados do Twitter. Santos Cruz se reuniu com Bolsonaro. Na conversa no Palácio da Alvorada, o ministro teria argumentado que não se tratava de um ato espontâneo, mas que era alvo de uma ação coordenada, com a participação dos filhos do presidente, o chefe da Secretaria de Comunicação, Fábio Wajngarten, e assessores ligados a Olavo de Carvalho.
General Mourão desperta cenas de ciúme entre os seguidores de Olavo de Carvalho
Hoje – quinta 13 -, Santos Cruz ainda participou da audiência na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle do Senado quando saiu em defesa do ministro da Justiça, Sergio Moro, ao comentar a troca de mensagens entre o colega e o procurador Deltan Dallagnol.
Oficialmente, o Planalto ainda não se manifestou. Mas uma coisa é certa: o governo federal perdeu uma das poucas e raras cabeças que analisam politicamente o cenário nacional.
Aparentemente, trata-se de mais batalha vencida pelo guru da Virgínia. O caldo de cultura engrossa. Mas vale recordar as proféticas palavras de Emílio Odebrecht reproduzidas pelo O Globo, em 18 de novembro de 2018. Valendo-se de décadas de experiência no trato com políticos, o capo tem dito que o general Hamilton Mourão se tornará o presidente da República em menos de dois anos.
Senhores passageiros, apertem os cintos!