O carnaval de 2020 promete vingança contra o baixo astral de 2019
Prepare-se porque vai ser o carnaval da revanche, do quebra-quebra-gabiroba no lombo daqueles que passaram 2019 querendo acabar com o tanto riso e a tanta alegria que nos eram inerentes. As águas vão rolar. Recomendaram a dieta do ódio, do luto de três dias e da abstinência dos bons sentimentos – agora empurra a carrocinha que a vingança será quentinha.
Lá vem o Zé Pereira armado com seu bumbo insaciável, seu bigorrilho incomensurável, e ele está pronto para cobrar a conta por um ano inteiro de tristeza e decepção. Segura a chupeta, general da banda. No turbilhão desta galeria chamada Brasil, o Zé Pereira, e mais a mulata bossa nova, e ainda mais o “seu” China na ponta do pé, todos querem realizar o castigo momescamente implacável de instalar a desordem, beijar sem preconceito todas as bocas de gêneros e, seguindo os ensinamentos de Paulo Freire, tirar o cavaco do pau.
Lança-perfume rodo metálica encantou os salões até meados do século passado
As negas malucas vão enfrentar as milícias do condomínio com a prise orgiástica de suas garrafas de lança-perfume. O bloco dos pigmeus de boulevard, pó de mico em riste, fará coçar quem, em nome de Deus, tentou censurar a felicidade de ser brasileiro, se orgulhar de Fernanda Montenegro e respeitar meninos de rosa, meninas de azul.
Já aconteceu no carnaval de 1920, quando os que sobreviveram à gripe espanhola de 1919 (mais de 15 mil mortos no Rio) deram a resposta ao medo e fizeram o maior carnaval de todos os tempos. Vai ser assim de novo, o ronca ronca da cuíca, o pirulito que bate-bate, o recordar é viver, em 2020. O índio que sempre quis apito, desta vez vai ter. Não vai faltar mais um zero no ordenado de ninguém.
Em 2019, um ano a ser esquecido, o gafanhoto deu na minha horta, a jardineira nunca esteve tão triste e Madureira chorou. Reinou a grosseria do pirata da cara de mau, um sujeito sem noção do que seja esse mundo de zinco que é Mangueira – e um dia será capaz de cantar em rede nacional a marcha do “coelhinho se eu fosse como tu”. A resposta a esse ano infeliz da nossa história começou ontem e se estenderá pelo inédito calendário de 50 dias de uma folia inesquecível. O velhinho da porta da Colombo há de aguentar.
2019, um ano a ser esquecido
Estão para chegar também as Piranhas de Madureira de braços dados com os batuqueiros do Cacique de Ramos. Depois de lhes terem roubado o sossego, depois de lhes terem roubado a santa paz, todos trazem no peito a obsessão de ir à forra. A Lapa vai voltar a ser a Lapa. Se a radiopatrulha chegasse aqui agora submeteria o responsável por toda essa infelicidade a um duro interrogatório de nacionalidade. Você conhece o pedreiro Valdemar? Você sabe a que horas o Zé Marmita pega o trem? E desses confetes e serpentinas, o energúmeno também nada saberia.
Beth Carvalho, uma perda irreparável para o samba e o carnaval
Beth Carvalho, outra maldade que 2019 fez com o Brasil, não estará mais à frente do carro de som, mas a Maria Candelária, o moleque bamba, a turma do funil e até o gato na tuba, eles vão festejar o teu sofrer, o teu penar. Te cuida, seu Queiroz, porque, se essa porra não virar, a multidão enfurecida vai realizar a maravilhosa vingança, carnavalescamente constitucional, de voltar a rosetar.