Foi rápido, muito rápido. 2024 já está indo embora, como se tivesse sido um borrão no tempo. Uma frase de Clarice Lispector parece perfeita para descrever esse ano que se comprime em instantes: o segundo dentro de minuto, dentro da hora, dentro da semana, do mês e do ano que cabe no segundo presente. E 2025 já se aproxima, cauteloso, carregando as heranças pesadas do ano que alonga sua sombra.

Pensando nisso, decidi não fazer promessas irreais nem me perder em utopias improváveis. Resolvi me centrar no que não quero para o próximo ano. Porque, no fundo, a verdadeira mudança não nasce de listas de desejos, mas do abandono do que nos prende, sufoca e confunde. É no “não quero” que mora a libertação.

Não quero mais perder tempo com bobagens. Não quero viver no desalinho das redes sociais, tampouco me deixar arrastar pela superficialidade dos likes e das opiniões que evaporam ao menor sopro. Não quero distrações que não somam, nem bajulações que corroem a honestidade. O silêncio que busco não é o vazio da indiferença, mas aquele que fala. O silêncio do paradoxo: discreto, mas profundo, que ouve antes de responder, que permite o espaço necessário para pensar. Não quero me sentir obrigado a reagir a toda provocação, como se todo estímulo externo exigisse um eco.

“Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam”, Clarice Lispector

Não quero acumular mais papéis, roupas, objetos inúteis, nem, sobretudo, relações vazias. Tudo o que não serve, o que pesa, ficará para trás. Lembro, com ironia, da frase de Sartre que animou meus verdes anos: “da vida só quero os excessos”. Hoje, percebo que o excesso, longe de ser libertador, é uma prisão disfarçada. Não quero mais demasias; quero o essencial.

Não quero uma vida atolada de pendências. Quero (ou melhor, não quero deixar de) organizar os armários da casa e da alma. Não quero a falsa sensação de segurança que vem do acúmulo. Quero abrir espaço para o que realmente importa. Desapegar não é perda; é descoberta.

E no mundo das ideias, o que não quero? Não quero alimentar o ódio, a raiva, ou as hostilidades que enfraquecem a alma. Não quero fazer parte das trincheiras ideológicas que apenas reforçam divisões. As contradições das instituições continuam lá, e é verdade que elas muitas vezes nos exasperam. Mas não quero engrossar os gritos de quem semeia tumulto sem propósito, de quem ergue o caos apenas para garantir sua própria voz.

Também não quero cair no silêncio alienante. Prefiro o silêncio que reflete, que permite conexão e clareza. Não quero respostas prontas, mas perguntas que inquietem e inspirem. Quero argumentar com os bons e sábios, com aqueles que procuram, não com os que acham que já encontraram todas as verdades.

E a arte? Não quero mais a arte alienante, que reduz nossa sensibilidade à mera contemplação vazia. Mas tampouco quero uma arte aprisionada em sectarismos, que sintetiza sua essência ao panfleto. Não quero arte que se fecha em dogmas, mas aquela que nos abre ao mundo e a nós mesmos, que nos desafia, emociona e faz crescer.

Não quero correr sem direção, nem revisitar sempre os mesmos lugares. O novo faz sentido quando nos transforma. Não quero apenas acumular milhas; quero viagens que me levem para dentro de mim mesmo, que revelem o que ainda não conheço.

Não quero amizades de fachada, relações que se medem por quantidade. Prefiro poucos amigos, mas profundos. Aqueles que sabem que a verdadeira festa está na simplicidade, no momento compartilhado, no riso despretensioso, no abraço sincero. Não quero a felicidade quimérica que vem e vai. Quero a alegria serena, aquela que se instala devagar e permanece.

Silvio Tendler, um utopista inveterado e militante, amigo do Mestre Sebe

E quanto ao dinheiro? Não quero mais. Nem mais posses, nem mais poses. Não quero a corrida insana por coisas que parecem essenciais, mas que apenas capitalizam o vazio. Não quero um ninho assediado por aves barulhentas, mas um espaço pequeno, acolhedor, onde só cabe o que realmente tem valor.

O que não quero para 2025 é essa busca sem fim por mais. Não quero a pressão de responsabilidades que não escolhi. Quero menos pressa, menos caos, menos confusão. Assim, 2025 será o ano de aprender a viver com menos: menos distrações, menos excessos, menos ruído. Não quero seguir os mesmos caminhos de sempre. Não quero me perder na busca pelo que não importa. Não quero repetir os erros do passado.

Sei que isso exige coragem. Abrir mão é mais difícil do que pedir. Mas é no “não quero” que pretendo encontrar o que realmente faz sentido.

E você, o que não quer?