“Simples como habitualmente são as grandes obras; profundos como costumam ser os trabalhos que se perpetuam; simples como voo de passarinho; profundo como amor incondicional; singelo como canto de ninar; intenso como fogo de lamber a alma…”

Foi com estas afirmativas que comecei o texto da coluna anterior, na qual comentei o primeiro CD da jovem cantora Alice Passos. Mais do que afirmações, são expressões do desejo de que os jovens prossigam na busca por belezas simples e profundas. Quando um disco mexe com minhas emoções, corro a buscar palavras que digam do meu contentamento por ter em mãos um trabalho arrebatador, mas que, ao mesmo tempo, revelem a angústia por crer que o novo nome dificilmente chegará ao grande público.

Pois bem. Recentemente, ao ler uma matéria no Globo assinada por Leonardo Lichote em que ele apresentava alguns nomes da nova cena musical pernambucana, tomei conhecimento da obra da moçada. Dentre eles estava o compositor, pianista e cantor Zé Manoel, pernambucano de Petrolina (fiz contato com o jornalista, pedindo dicas de onde comprar os discos citados na matéria).

Hoje, depois de ouvir os novos pernambucanos, decidi falar do meu entusiasmo com Delírio de um Romance a Céu Aberto (Joia Moderna), álbum de José Manoel de Carvalho Neto, o Zé Manoel. Idealizado pelo DJ Zé Pedro, com produção executiva de Thiago Marques Luiz, reúne onze músicas – algumas em parceria, sendo três inéditas, cantadas por grandes intérpretes e acompanhados por Zé Manoel ao piano.

Virtuoso, seu piano aclara a facilidade com que as notas saltam de suas teclas, transformando-se em acordes que remetem às harmonias de nossos grandes harmonizadores. As melodias vão por onde as palavras levem. Imagens bem talhadas afloram. E a música brota prenha de fantasias. E de amor, de dor, de água e de fogo. Canções de dar canseira nos olhos de tanta lágrima, de trazer paz aos ouvidos, ávidos por se aninharem em música de qualidade. (Dói-me saber que Alice Passos e Zé Manoel, assim como acontece com Guinga e Celso Viáfora – uma grande cantora e três grandes compositores –, podem não chegar aos tantos ouvidos que merecem escutá-los.)

Lindas canções de um talento exuberante, que agora as vê acrescidas de encantos, já que cantadas por Fafá de Belém (grande interpretação), Elba Ramalho (em grande forma), Ayrton Montarroyos (bela voz), Ana Carolina (cantando bem), Célia (intensa como sempre), Tiganá Santana (voz poderosa), Ná Ozzetti (linda interpretação), Amelinha (bela voz, pura emoção), Arthur Nogueira (canta e declama os versos com voz profunda) e Jussara Amaral (como canta!).

Piano e vozes, simplesmente ardentes, eloquentes; belezas candentes; sentimentos envolventes… Epa! O que é isso? Ora, são rimas indigentes louvando um CD de brilho resplandecente.

Mas a palavra final cabe a Zé Manoel: piano e cello o amparam para que cante, feche e assine o CD – um verdadeiro songbook desse craque pernambucano, de apenas 35 anos.

 

Aquiles Rique Reis, vocalista do MPB4