O governo Bolsonaro parece ter dado uma boa afrouxada na sua anunciada política de moralidade e de combate intransigente à corrupção. Há sinais nesse sentido bastante claros. O primeiro e mais eloquente deles foi a decisão de fatiar o pacote anticrime, retirando do corpo principal da proposta a tipificação do crime de caixa 2. Mais grave foi o ministro da Justiça admitir que fez a concessão atendendo demanda de parlamentares. Um dos ícones anticorrupção do governo, Sergio Moro acrescentou que “crime de caixa 2 não é corrupção ”.
Caixa 2 é pior do que corrupção, porque o dinheiro desviado dos cofres públicos não vai para o bolso de quem o roubou, mas sim para financiar ilegalmente partidos políticos e campanhas eleitorais, manipulando a vontade do eleitor. Se corrupção é crime, caixa 2 deveria ser considerado crime hediondo. Por ou trolado, o governo que se elegeu prometendo mudar aforma de fazer política, não se submetendo a partidos e políticos, na primeira proposta enviada ao Congresso cedeu à vontade dos parlamentares.
Alguém poderia dizer que é assim que se governa e que Bolsonaro caiu na real. Verdade, governar é saber ceder. O problema é que, para aprovar leis contra milicianos e traficantes, o governo abriu mão da lei que alcançaria corruptos. Não dá para saber se os eleitores do presidente Jair Bolsonaro perceberam, mas parte substancial do compromisso assumido com eles durante a eleição foi abandonada. E este não foi o único episódio na linha de concessão à corrupção do governo.
O caso que culminou na demissão de Gustavo Bebianno do Ministério é outro exemplo de como Bolsonaro age erraticamente nessa questão. Numa das conversas com Bebianno tornadas públicas pela revista “Veja”, onde se refere ao laranjal do seu partido, o presidente sugere que o ministro estava jogando o caso no seu colo. Não reclamou do crime, mas sim de que poderia sair respingado. Bebianno explicou que cada diretório do PSL cuidava das suas próprias contas. Disse que no caso de Pernambuco, onde uma candidata do partido ganhou R$ 400 mil para a campanha e obteve apenas 274 votos, o responsável era o deputado Luciano Bivar (PSL-PE).
Bolsonaro com o ministro de Turismo: dois pesos, duas medidas
O ministro demitido muito provavelmente tem razão. Bivar licenciou-se da presidência nacional do partido entregando- a provisoriamente a Bebianno para concorrer a uma vaga na Câmara por Pernambuco, seu estado. Lá, quem dá as cartas no PSL é Bivar. E o que fez Bolsonaro? Brigou com Bivar? Detonou o deputado com o auxílio do seu filho nas redes sociais como fez com Bebianno? Nada disso. Antes mesmo de a poeira baixar, chamou o deputado pernambucano para almoçar com ele no Palácio do Planalto. Ao chegar para o almoço, terça-feira, Bivar disse aos jornalistas que a questão era “tão pequena que nem merecia seu comentário”.
Luciano Bivar, presidente do PSL, preservado por Bolsonaro
Outro envolvido no laranjal, o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, não teve sequer seu nome citado pelo governo ou seu porta-voz. Ele foi acusado por uma mulher usada como laranja em Minas Gerais de ser o principal beneficiário dos desvios do fundo partidário destinado ao PSL no estado. A ex-candidata Cleuzenir Barbosa disse ao jornal “Folha de S. Paulo” que Álvaro Antônio, presidente estadual do PSL, usou dois assessores para tentar convencê-la a transferir dinheiro da campanha para uma gráfica com a qual não tinha feito nenhum serviço.
E o que aconteceu? Nada. O ministro do Turismo, que não tem desavenças com filhos do presidente, segue ministro. Ao que parece, o governo vai aguardar as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público para só então tomar uma decisão sobre o seu futuro. Nesse ponto, o novo governo é a cara de quase todos os que o antecederam.