Pois é…
Somada a loucura do mundo todo – Donald Trump, Kim Jong-un, Vladmir Putin – à vertigem dos acontecimentos brasileiros regados a balas perdidas, greves, descobertas diárias de escândalos, explosões de caixas eletrônicos e níveis de corrupção inimagináveis, tudo junto, me faz perguntar: e a Copa do Mundo? Onde foram parar a alegria e a TPC (Tensão Pré-Copa)? Não é preciso muito exercício para notar a consternação que envolve nosso país e que cobre de tristeza e desapontamento corpos e mentes que deveriam estar eufóricos, ostentando as berrantes cores do Brasil. Por certo, muitos estão envergonhados por ter usado a camisa da Seleção em atos políticos vãos, e agora têm pudor em vesti-las como faziam antes. “Nem se ouve mais cantar canções/ e nos corações saudades e cinzas/ foi o que restou…” será que Vinicius de Morais errou trocando o Carnaval pelo Futebol? Onde estão as bandeirolas, as paredes desenhadas com alusões aos “Campeões do Mundo”. A “Taça do Mundo é nossa!” É? Não há mais quem possa? “Sou brasileiro/ com muito orgulho”. Sou?
Vinicius de Moraes teria trocado do Carnaval pelo Futebol?
A agonia tomou conta da gente, roubou as risadas fáceis, furtou a esperança sempre pronta, descoloriu os eufóricos arroubos e tirou o som do “somos os melhores do mundo”. E vai demorar para expurgar tanta desgraça. Ai, como dói ver as mudanças das coisas afeitas ao nosso antes acarinhado “mundo da bola”. Por ironia, no “país do futebol”, dada a ressignificação simbólica daquela que um dia foi chama de “gorduchinha”, podemos avaliar como fomos esfalfados de perenes aleluias. E das probabilidades sempre alvissareiras, também.
Sabe, quase chorei quando soube que o nosso Ronaldinho, o protótipo perfeito do herói problemático, o Fenômeno, aquele por quem tanto vibramos e sofremos, está prestes a comprar o time do Valladolid, da segunda divisão espanhola, isso pela bagatela de 30 milhões de euros. Negócio puro, produto de outra esfera, capitalista. Tudo compõem cifras formidáveis. Isso, aliás me faz pensar na prática de troca do nome afetivo dos jogadores – onde foram parar os Didi, Diamante, Cabeção, Feijão, Dinamite, que agora são solenemente referenciados também pelo sobrenome, já pensando na venda para times estrangeiros. Imaginemos que se fosse hoje, Pelé seria chamado de Edson Nascimento, Cafu seria Marcos Morais, tudo na mesma toada dos Zlatan Ibrahimovic, ou do Andrés Iniesta. E nem é para diferenciar como é o caso do nosso Ronaldinho Gaúcho, Toninho Cerezo. Aliás, os diminutivos também sumiram e assim não temos mais referências como antes – ah! saudade do Zizinho…
Toninho Cerezo fez parte de uma seleção que irradiava alegria
E que dizer das regras que proíbem o festejo de gols com a torcida? Não se pode mais sair do campo, não senhor e não senhora, e saibam que isso não é permitido “por questão de segurança”. Ai de quem ousar tirar a camisa em campo. Também não pode jogar com a meia abaixada. É nessa lógica disciplinadora daquilo que de jogo virou “esporte”, e agora “futebol-ciência”. Sim, o futebol se globalizou em grandíssimo estilo, a ponto de as taças entregues aos vencedores serem televisionadas em solenidades espetaculares, dois dias depois da vitória. E as seleções de ternos de grifes, especialmente desenhadas para embarque e chegada?! Os programas sobre o futebol agora viraram talk shows e são recheados de “outros quadros”, com “convidados especiais”, complementados por cantores, atrizes, políticos. Os jogadores transformados em “atletas” são elevados à categoria trabalhista de “profissionais do esporte” e alguns merecem rótulos como “atletas diferenciados”, ou “distinguidos no ramo”. Também se reclama de o time ser do fulano de tal como se fosse a “Seleção de Neymar”, ou o “escrete do Tite”. Sumiu o “esporte das multidões”. Sumiu…