As fotos de centenas de balsas obstruindo o rio Madeira, um desafio explícito às autoridades e à ordem constituída, e o incêndio de 131 delas correram o mundo
Os primeiros registros de ouro no rio Madeira datam de 1826. O crescimento do garimpo se deu a partir da década de 1970, em pleno regime militar. O DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) estimava a presença de 1.200 garimpeiros no leito do rio com uma produção de 817 quilos do metal. Na época, a operação era semimecanizada, e as balsas dependiam de mergulhadores para posicionar os tubos sucção.
Pepitas de ouro atraem milhares de garimpeiros
Com o passar dos anos, a extração do metal em toda a Amazônia passou a ser feita com maquinário pesado: balsas, dragas, pás-carregadeiras e escavadeiras hidráulicas que custam milhões de reais.
“Os índices de ilegalidade na atividade são alarmantes. O ouro, ativo financeiro de enorme importância estratégica para as finanças nacionais, esvai-se pelas fronteiras com pouco ou nenhum controle das agências públicas, ao mesmo tempo que recursos hídricos são contaminados por mercúrio e parcelas da floresta são postas abaixo na busca por novos veios, e o tão prometido desenvolvimento econômico não chega“, ressalta o documento produzido pelo Ministério Público Federal, publicado em 2020.
No início dos anos 1980, Serra Pelada parecia um formigueiro humano
O garimpo do rio Madeira é uma extensão fluvial do que ocorreu em Serra Pelada, a partir de dezembro de 1979. Os registros indicam que ao final do primeiro semestre de 1980, cerca de 30 mil garimpeiros já se haviam deslocado para a área. Imediatamente, o presidente general João Figueiredo nomeou o major Sebastião Curió para gerir o garimpo.
Em 1984 Serra Pelada abrigava 80 mil residentes. A produção despencou para 3,9 toneladas e a cava atinge 200 metros de profundidade, impossibilitando a atividade manual. Assim mesmo, suas atividades bastante reduzidas ainda atraem garimpeiros e aventureiros.
Passar a boiada
Para Danicley de Aguiar, Sênior Campaigner no Greenpeace Brasil, a aglomeração das balsas onde elas são proibidas é um reflexo simbólico do momento que o país vive. “Os infratores ficam à vontade pra fazerem o que quiserem porque não serão punidos. Eles não têm licença ambiental, mas têm licença política”, afirma, mencionando o discurso pró-garimpo do presidente Jair Bolsonaro e dos governadores.
Balsas, dragas, pás-carregadeiras e escavadeiras hidráulicas
Para o militante do Greenpeace, “a crise econômica levou para pobreza milhares de pessoas. Precisamos de um debate sério que promova a reorientação do sistema econômico brasileiro, que considere a floresta e seus rios como um ativo, e não como problema”, argumenta.
As balsas de garimpo se dispersaram e estão subindo o rio no sentido de Humaitá, considerada refúgio histórico dessas embarcações no estado. Foi lá que, em 2017, prédios do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Icmbio, e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis, Ibama, foram incendiados por garimpeiros.
Centenas de balsas impedem a navegação
Ninguém coloca 300 balsas num lugar sem organização. Mas diante da repercussão internacional, os militares capitaneados pelo general Mourão, vice-presidente, encenam uma reação após o tempo necessário para que muitos garimpeiros de retirassem. A encenação ainda não terminou.
Major Curió elegeu-se deputado federal. Para onde irá o general Mourão?