No dia 15 de janeiro, uma sexta-feira, mais de 100 advogados, professores, juristas e integrantes da comunidade jurídica – entre eles o taubateano Gustavo Badaró – subscreveram carta aberta em repúdio à “supressão episódica” de direitos e garantias no âmbito da operação Lava Jato,e a publicaram na grande imprensa diária porque a operação seria marcada, entre outros, pelo “desvirtuamento do uso da prisão provisória” e pelo “vazamento seletivo de documentos e informações sigilosas”.
Segundo os signatários, “Nunca houve um caso penal em que as violações às regras mínimas para um justo processo estejam ocorrendo em relação a um número tão grande de réus e de forma tão sistemática.” Criticam também a “estratégia de massacre midiático” que tem como objetivo “incutir na coletividade a crença de que os acusados são culpados (mesmo antes deles serem julgados)”.
Polêmica instaurada
A primeira reação partiu do Ministério Público através dos dois principais procuradores da Operação Lava Jato, Carlos Fernando dos Santos Lima e Deltan Dallagnol, que ironizaram a carta/manifesto. “Eles (os signatários) violaram o princípio mais básico que eles defendem como advogados de defesa que é que não se façam acusações genéricas”, disparou Dallagnol, coordenador da força tarefa.
Em seguida, a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) rechaçou, em nota, o manifesto e o classificou como ‘ataques à atuação do Ministério Público Federal (MPF) e da Justiça Brasileira’. E vai além quando afirma: “A publicação paga, veiculada em vários jornais do Brasil, é de autoria de muitos dos advogados dos próprios investigados na Lava Jato, que se revelou como o maior caso de corrupção da história do país”. E mais adiante: “A carta dos advogados ataca indistintamente instituições e pessoas, sem qualquer tipo de especificação de fatos, o que contradiz o princípio que veda acusações genéricas. É inegável que as investigações promovidas pelos Procuradores da República e por policiais federais estão sendo criteriosas e culminam em provas robustas”.
Na carta/manifesto, os advogados chegam a comparar os métodos da Lava Jato a uma “espécie de inquisição”, em que já se sabe “qual será o seu resultado”.
Os juízes federais, através da AJUFE– Associação dos Juízes Federais do Brasil – reagiram afirmando que os signatários ‘querem pressionar a magistratura’, e que os críticos do juiz Sérgio Moro ‘gritam e esperneiam’. Na nota, a AJUFE em tom irônico rebate: “Quando há provas de um vício ou equívoco processual, o natural é apresentá-las ao Tribunal, para que se mude o curso do caso. Quando elas não existem, uma carta nos jornais parece um meio de dar satisfação aos próprios contratantes”. E, mais adiante, a Ajufe diz que a comparação revela um “escasso conhecimento histórico” e representa “um desrespeito com as verdadeiras vítimas históricas da inquisição”.
A prova dos nove é que Tribunais como o TRF-4, o STJ e mesmo o STF têm indeferido o grosso dos recursos ajuizados contra decisões tomadas pelo juiz da Lava Jato.
Com a palavra Gustavo Badaró, um dos signatários
Taubateano, com o direito no seu DNA (filho e neto de conceituados advogados, professor da Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, da USP, Gustavo Badaró é considerado uma das cabeças mais brilhantes no mundo jurídico nacional, requisitado, inclusive, para ministrar palestras em países do chamado primeiro mundo. Por que esse jovem promissor assinou a carta/manifesto juntamente com outros advogados?
“Primeiro, não trabalho em nenhum processo da operação Lava Jato. Como professor fui contratado para dar pareceres a respeito de determinadas questões. Não concordo com todos os termos. Mas assinei porque estou convencido que estão sendo violadas garantias constitucionais. Assinei com convicção”.
Perguntado sobre o posicionamento da Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE) e de entidades representativas do Ministério Público, Badaró argumenta que o mesmo sendo uma das partes nesses processos, o MPF faz campanha pública contra a corrupção o que favorece seu posicionamento nos processos. Por outro lado, os advogados são criticados por divulgarem a carta em questão. No seu entender, o MPF tem um posicionamento classista.
E sobre o paralelo que a carta estabelece entre a Lava Jato e a inquisição? Na sua opinião, “na inquisição os acusados eram inquiridos por juízes que não tinham imparcialidade. No caso da Lava Jato, houve violação do juiz natural que tem como finalidade assegurar a imparcialidade do julgador”.
Juiz natural? “Sim, é aquele cuja competência para julgar seja previamente estabelecida por lei”. Ou seja, o juiz federal Sérgio Moro estaria subvertendo esse conceito.