Os dados são alarmantes: apenas 16% da população russa aprova a democracia; nos Estados Unidos, a campanha presidencial aponta o acirramento da disputa que pode colocar o ultraconservador Donald Trump no posto mais alto e consequente da maior economia do mundo; na Síria, o regime autoritário de Bashar al-Assad afugenta participações democráticas; países importantes do mundo árabe – como a Arábia Saudita – se impõem como modelo autoritário; Israel mantém um poderio que diminui as chances de participação democráticas dos países vizinhos e força a guerra permanente; na América Latina, os regimes de base popular sofrem os danos de desmandos e corrupção, após alguns anos de algum fulgor. Aliás, pelo reverso, na Argentina e no Peru, governos simpáticos às políticas neoliberais, despontam com vigor sendo contrastados com a penúria da Venezuela, Bolívia, Nicarágua.
A par de tais constatações, resta-nos questionar das razões gerais dessa virada, pois, afinal, como explicar o fenômeno em escala global? Será que a democracia representativa não tem mais lugar no mundo de hoje? Seria coisa do passado? O que se colocaria no lugar?
Bashar Al Assad, presidente da Síria
Não é desprezível considerar que a História se move em ciclos progressivos que, como espirais, implicam espécies de retomadas, sempre impulsionadas por valores antigos. Na mesma ordem, segmentos reacionários se assumem como baluartes do progresso e do desenvolvimento econômico que, em últimas análises, é medido pela conjugação do aquecimento do mercado material, combinando trabalho/emprego com o consumo ativo e sempre crescente. A garantia dessa comunhão consagra o capitalismo avançado em sua forma mais consistente, ou seja, sobrepondo a riqueza a outros valores que seriam coadjuvantes e nutrientes de um tipo de progresso. Assim, a educação, saúde, programas sociais em geral, funcionariam como suportes para o tal “desenvolvimento” que deveria vigorar a qualquer custo. A qualificação da prioridade do problema econômico coloca outro ponto importante na equação: como conduzir o processo político que ampararia tal projeto?
Vladimir Putin, presidente da Rússia
Em jovens democracias – como é o caso do Brasil – preside uma dúvida constante, ligada à presença de uma elite que não aceita mudanças no comando. E como a História pesa neste andamento! Depois de se valer do mais longo e duro processo escravocrata da humanidade, contando com cerca de 4,2 milhões de negros negociados da África para o Brasil, passados 400 anos daquele sistema, ainda não conseguimos integrar largos fragmentos da população que povoam favelas e prisões e vivem condenados à marginalidade. Os números, mais que reveladores, assustam, pois, segundo a Revista Carta Capital desta semana, mais de 60% da nossa população carcerária é composta de negros. E que dizer dos totais estampados pela CPI do Senado, sobre assassinatos de jovens negros, dando conta que por ano 23.100 deles, contando de 15 a 29 anos, são mortos. E note-se que perfazem o total de cerca de 63 por dia, um a cada 23 minutos. Frente a essa realidade doída ainda se pergunta com perplexidade, como alguém pode ser contra cotas escolares, de trabalho e lugares políticos? Como?
Vendo em perspectiva histórica, a hegemonia branca, machista, elitista ainda comanda a ação política comunitária nacional. Sem crítica o que se vê é a repetição de posturas autoritárias, pelas quais o que interessa é a riqueza nacional a qualquer preço. E isso tem sido lei no Brasil onde sucessivamente se repetem golpes contra a democracia, um atrás do outro, sucessivamente. E o pior, tudo acontece em nome dela própria, sob as vestes de interpretações constitucionais.
Mas, tem jeito disto mudar? pergunta-se. E a resposta vem a galope: tem. Tem se formos sérios na defesa de um regime que não pode ser confundido com governos. Governos erram sim e temos mostras evidentes disso. E erram muito, insiste-se, mas suas formas corretivas devem antes de mais nada respeitar as regras que, mais que qualquer coisa, legitimam as eleições. Sem o voto popular respeitado não há como evitar desmandos e sem ele, sem democracia, somos fadados à submissão autoritária. As eleições estão aí. Mais que escolher candidatos, cabe, com entusiasmo, escolher a democracia. Bom voto a todos.