Para Isa Márcia pelo dia de hoje

Pois bem… nasci em março, precisamente no dia 15. Minha mãe, devota fervorosa de São José, torcia para que eu segurasse um pouco mais e viesse ao mundo quatro dias depois, no dia do santo. Não sei se esperava um milagre ou uma manobra uterina de última hora, mas a verdade é que cheguei antes do planejado. Talvez tenha sido meu primeiro ato de independência ou apenas impaciência mesmo.

A questão dos nomes na família sempre foi um capítulo à parte, com enredos dignos de um romance realista cheio de tragédias e simbolismos. Meu irmão mais velho, por exemplo, foi batizado como Nazo, em homenagem à tia Naza, que morreu dramaticamente no dia do casamento. A pobre coitada foi velada com o vestido de noiva, numa cena digna de novela mexicana. Como se não bastasse a carga emocional, o pequeno Nazo, que herdou seu nome, também teve um destino trágico, partindo antes mesmo de completar um ano de vida. Minha irmã, por sua vez, teve um nome escolhido com antecedência: Mirna. A inspiração veio de uma prima que se afogou prematuramente. O destino, talvez num raro momento de ironia benevolente, permitiu que ela nascesse exatamente no dia de Nossa Senhora Aparecida, o que garantiu um complemento celestial ao nome.

Já no meu caso, a escolha do nome foi uma verdadeira batalha campal. Meu pai, seguindo a tradição libanesa, queria que eu me chamasse Nagib, como meu bisavô. Minha mãe, mais preocupada com a adaptação da família ao Brasil do que com honras ancestrais, torceu o nariz e lutou bravamente pelo direito de escolha. O acordo final foi Carlos, nome imponente, que significa “senhor forte” ou “valente” — talvez na esperança de que eu compensasse as tragédias familiares. Para equilibrar o peso da responsabilidade heroica, minha mãe incluiu José, garantindo a bênção do santo e fechando a questão: José Carlos.

Sempre tive respeito pelos nomes. Para mim, nomes contam histórias, revelam traços do destino e até determinam a personalidade de seus portadores. Talvez por isso eu sempre tenha gostado da ópera Lohengrin, de Wagner, aquela em que um cavaleiro misterioso salva a princesa Elsa sob uma única condição: ela jamais poderia perguntar seu nome. Ora, isso para mim sempre pareceu um crime! Como confiar em alguém sem nome? Como alguém pode existir sem ser devidamente batizado pelo universo?

Com essa reverência aos nomes, é claro que desenvolvi um carinho especial por São José. Mas sejamos francos: nunca fui de novenas, velas ou procissões. Tenho imenso respeito por essas tradições, mas minha devoção segue outros caminhos… menos convencionais. E eis que, um belo dia, sentado na sala de espera do dentista, assisto a Ana Maria Braga revelando um ritual poderoso em homenagem a São José. Era uma mandinga digna de nota: escrever todos os nomes de frutas que viessem à cabeça, sortear uma, fazer um pedido e, em seguida, passar um ano inteiro sem tocar na fruta escolhida. Se o pedido fosse justo, São José daria um jeito de realizá-lo.

Vida plena ou prato cheio de frutas? Mestre Sebe prefere os dois

Ora, sou um homem de mente aberta, e se a Ana Maria Braga recomenda, quem sou eu para duvidar? Afinal, há anos ela convive pacificamente com um papagaio falante na televisão, o que já indica um grau elevado de sabedoria cósmica. Resolvi, então, que este ano colocaria o ritual em prática, em homenagem à fé da minha mãe. Só tinha um problema: o que pedir?

Passei um bom tempo refletindo sobre minhas carências e desejos. Revi minhas frustrações, as dívidas que a vida me cobrou, os sonhos adiados… e não cheguei a nada que valesse um sacrifício frutífero. Minha saúde anda capenga, mas a cabeça segue em ordem; nunca passei fome ou frio, o que já é motivo de gratidão; minha família está bem, cheia de planos e saúde; amigos, tenho de sobra, e todos são generosos. Não guardo mágoas de ninguém e, mesmo meus desafetos, podem dormir tranquilos, pois não lhes rogo pragas nem desejos obscuros. O que mais poderia querer?

Foi então que percebi: eu já tinha tudo o que realmente importava. São José já me abençoava sem que eu precisasse abrir mão de um inocente cacho de uvas ou de uma fatia de melancia. Então, que me perdoe Ana Maria Braga, mas não posso sacrificar nenhuma fruta em nome de algo que já recebi de graça. De todas as mandingas possíveis, a melhor é a gratidão. E, francamente, entre uma vida plena e um prato cheio de frutas, prefiro ficar com os dois!