A execução da vereadora carioca eleita pelo PSOL tem semelhança com o assassinato de José Ismael Pedrosa, ex-diretor do Carandiru, em Sampa, e da Casa de Custódia de Taubaté
Na quarta à noite, quando a notícia sobre a execução da vereadora do PSOL, as memórias ressurgiram aos borbotões. Os anos 1960/70 voltaram à paisagem carioca. Nos anos de chumbo, para quem lutava contra a ditadura, ficamos acostumados com a notícia sobre o desaparecimento e morte de um companheiro. E a morte em tiroteios montados ou sob a tortura tinha como origem algum aparelho da repressão política.
As vítimas não tinham rosto. Porém, os crimes cometidos pela ditadura, aos poucos, estão sendo desvendados. Eles são imprescritíveis. Assim como a execução de Marielle. A violência contra setores mais vulneráveis, em geral, é palatável pela elite que representa os interesses do sistema.
Marielle Franco em seu último evento na quarta-feita, 14
Negra, moradora da Maré, vereadora e bissexual
Marielle estava na fronteira. Era socióloga, formada pela PUC-Rio, e com mestrado em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense (UFF) com tese sobre o impacto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) nas comunidades cariocas. Moradora do Complexo da Maré, ela se apresentava como “cria da Maré” e, em sua estreia na política, durante as eleições 2016, elegeu-se como a quinta vereadora mais votada do Rio. Ao lado de Marcelo Freixo, seu colega de PSOL, que disputou a prefeitura carioca e foi derrotado por Marcelo Crivella no último pleito, Marielle coordenou a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Politicamente, com essas características só poderia ser um partido de esquerda. Depois do desastre petista, as opções se estreitaram. Optou pelo PSOL, um partido criado por petistas que se desiludiram do messianismo do PT e de seu guia supremo.
Marielle fazia parte desse novo esforço por um mundo mais justo. Na Câmara, dedicou seu mandato à causa negra e aos direitos das mulheres.
Vereadora Marielle com o deputado federal Chico Alencar
Na terça-feira, 13, publicou nas redes sociais: “Quantos mais vão precisar morrer para que essa guerra acabe?”
No dia seguinte, leu em português e inglês a famosa citação da escritora americana negra, feminista e gay Audre Lorde, e encerrou sua participação no debate Jovens Negras Movendo as Estruturas, organizado pelo PSOL, e que acabara de mediar na noite desta quarta. E a fez lembrar, disse, como a autoidentificação é fundamental: “O lugar de mulher, mulher negra, bissexual, agora estou casada com uma mulher, mas tenho uma filha. Dessas muitas representações a gente vai aprendendo, conhecendo e estudando mais.”
Esse crime aconteceu nas barbas da força responsável pela intervenção militar/federal da capital fluminense.
Sob perícia: carro onde Marielle e seu motorista Anderson Gomes foram executados
PCC teria nascido em Taubaté
É um alerta para os taubateanos que testemunham a inércia das autoridades locais. Há indícios acachapantes sobre a construção de um poder paralelo nas “comunidades” locais controladas por milícias, policiais civis e militares.
Assim como já existem registros literários sobre a criação do PCC (Primeiro Comando da Capital) no sistema penitenciário nas fronteiras de Taubaté, Tremembé e Pinda.
Pedrosa foi diretor do Carandiru até o massacre de 1990
O ex-diretor do antigo presídio do Carandiru, em São Paulo e da Casa de Custódia local, José Ismael Pedrosa, negava essa versão. Pouco dias depois de uma entrevista exclusiva ao Jornal CONTATO, no dia 23 de outubro de 2005, um domingo, ele foi assassinado na rua 15 de novembro, quase esquina com a rua Coronel Augusto Monteiro. Pedrosa dirigia seu carro quando foi atingido por diversos tiros, disparados de um carro ocupado por três criminosos.
A participação de agentes de Prefeitura na desocupação forçada de moradores de dois conjuntos habitacionais na região do Barreiro para abrigar policiais civis e militares pode ser o embrião do poder paralelo comandado por milicianos.
O assassino de Pedrosa nunca foi desvendado. Tomara que não aconteça o mesmo com os atores e mandantes da execução de Marielle Franco.