“A essência do meu progresso estava em poder aceitar a minha decadência. Ou seja, progredir até morrer, porque viver é morrer. E não me arrependo de nada” Antônio Abujamra

 Em novembro de 2005, Antônio Abujamra concedeu entrevista exclusiva ao nosso editor Pedro Venceslau. Um dos atores mais respeitados da cena brasleira, Abú, como é conhecido na classe artística, além de apresentar o programa “Provocações”, aos domingos, na TV Cultura, foi o líder e fundador do grupo de teatro “Fodidos Privilegiados”, que nasceu inspirado no movimento “Os privilegiados”, que reúne artistas, jornalistas, professores e atores com o objetivo de reacender a chama do teatro carioca.

Reproduzimos a entrevista porque ela é um retrato fiel dessa figura ímpar na cultura brasileira que nunca teve papas na língua.

 

CONTATO – Que avaliação o senhor faz da crítica cultural?
Abujamra
 – Eu tenho 74 anos de idade, 57 de profissão como diretor de teatro e uns 17 como ator. Nunca vi um crítico de teatro ajudar na evolução do teatro ou na formação do ator. O Bernard Shaw, com sua acidez e seu humor característico, dizia “Quem sabe faz, que não sabe, ensina. Quem não sabe ensinar, ensina a ensinar. Quem não sabe ensinar a ensinar, vira crítico”. A pior coisa para um ator é o gosto artístico de um crítico. Quando eu estava nos Estados Unidos, um jornalista entrava para me entrevistar sabendo tudo de mim. Aqui no Brasil, ele pergunta : o que você faz? Os jornais literários de hoje são uma grande mediocridade.

“Os jornais literários de hoje são uma grande mediocridade”


CONTATO – Existe muito patrulhamento ideológico no jornalismo brasileiro?
Abujamra
 – Isso sempre existiu. O crítico, quando vai ver uma peça de teatro, quer ver a peça que ele queria dirigir, e não a que o diretor dirigiu. O jornalismo, em geral, faz mais ou menos isso. Eles (jornalistas) querem que a pessoa fale aquilo que o jornal quer que ele fale. Isso realmente é uma mediocridade espantosa.

CONTATO – Você se decepcionou com o governo Lula?
Abujamra
 – Eu considero o Lula um personagem brasileiro. Ele é uma pessoa a ser compreendida. Achar que ele é desonesto é uma loucura. Mas eu acredito que o deslumbramento faz parte de qualquer pessoa popular que assuma tanto poder.
Todo poder corrompe. O poder absoluto corrompe absolutamente, já dizia Voltaire.

 

Achar que o Lula é desonesto é uma loucura

CONTATO – Você se considera uma pessoa de esquerda?
Abujamra
 – Claro. É muito difícil um artista não ser ligado à esquerda. O que é a esquerda? Nós não queremos a pobreza, nem a infelicidade.

CONTATO – O colunista da Veja, Diogo Mainardi, disse que o dinheiro público para financiar cultura tolhe a liberdade criativa. O que você acha disso?
Abujamra
 – O Diogo Mainardi é um autor polêmico, que quer lutar, discutir…Eu só não queria que ele tivesse tantas certezas. Seria melhor se ele começasse a ter dúvidas. Eu idolatro a dúvida. Não dá para dizer: “a cultura tem que ser privatizada, o cinema tem que ser privatizado”. Meu Deus do céu…E quem não tem capacidade para conseguir dinheiro?
E quem tem só o talento? O que faz? Morre?