Em meu comentário sobre o CD Dia 16, titulado por mim “Odair José reinventado”, escrevi: “Odair José lançou seu 35o disco de músicas inéditas. Lá estão 12 faixas que ele criou para trilhar o caminho do rock’n’roll, deixando aflorar a sua porção roqueira”. 

Continuei: “Decisão corajosa de um artista que aturou a pejorativa alcunha de ‘terror das empregadas’, nos anos 1970. À época, alguns de seus sucessos foram avassaladores, caso de ‘Vou Tirar Você Deste Lugar’ e ‘Pare de Tomar a Pílula’ (…)”.

E segui: “Cada rock composto e gravado por Odair José de alguma forma simboliza a vida cotidiana, com suas ilusões e dúvidas. Assim, não foi à toa que a formulação estética e existencial do CD como que ‘pediu’ instrumentistas que compactuassem o desejo de Odair José de trazer a saudável ‘sujeira’ do som roqueiro para os arranjos (…)”.

Neste disco, gravado em 2015, Odair José cercou-se de apenas três instrumentistas. E agora, menos de um ano depois – relançando-se como roqueiro –, estão com ele apenas dois dos três músicos responsáveis pelos instrumentais no CD anterior: Junior Freitas, que dividiu a guitarra com Odair e ainda tocou baixo, teclado e piano; e Caio Mancini, na bateria e na percussão.

O álbum atual tem título bastante sugestivo para uma alma roqueira, Gatos & Ratos (Maximus Brasil). Para que se entenda o que vai pela cabeça de Odair José, ao trazer a guitarra e sua “sujeira” para seu mundo musical, vale a pena ler o que ele diz sobre o novo trabalho. Transcrevo respeitando as pontuações e os parágrafos do texto que está no release:

“Respeitar as diferenças e cada um no seu quadrado. Por trás dessa cortina além da fronteira, o futuro volta ao passado!

Somos o luxo do lixo, o lado indecente da mente, a contracultura. Moramos na rua… é Carne Crua!

A moral imoral de um preconceito não aceito e de repressão no olhar… Corre, chega, encosta e quer passar uma insana impunidade que não pode esperar!

Revelar o segredo sem medo, antes de chegar o inverno, pois o caminho pro céu passa perto do inferno!

A culpa é de quem julga, condena mas não justifica e nem explica…

Pra onde vão nossos impostos que de tudo e a todo momento são cobrados? Senta a pua, agora vão taxar até mulher que fica nua…

O mundo olha e não vê a cor do pecado!

Meu doce amargo de açúcar mascavo…

Quem diz pra você não errar, apenas sobrevive…

Faz tudo errado, preso ao sistema não vive…

Livre.”

O sangue roqueiro de Odair pulsa em suas veias. Sua cabeça gira ao som da guitarra. A música segue com ele. E assim, ele segue sua trajetória rumo (quem sabe?) às paradas de sucesso, mais uma vez.

Nas dez faixas de Gatos & Ratos, sente-se certa forçada de mão para ornar sua porção rock’n’roll. Contudo, tal como o seu vigor, sua sinceridade é dilacerante. Vejo em Odair José um cantor/compositor que não se detém diante de limitações que possam interromper sua busca pelo roquenrrol que o redimirá e o levará de volta aos braços da multidão.

Aquiles Rique  Reis, vocalista do MPB4