Tela de El Greco legou uma das imagens mais exuberantes do santo, pintado com o rosto emagrecido no jogo claro escuro e Madalena ao fundo

Fechando o mês de junho, depois da saudação a Santo Antônio e a São João, temos as celebrações de São Pedro. O mais velho dos discípulos de Jesus ostenta um lendário repartido entre o divertido e o devoto. Digno dos personagens mais reverenciados da cultura ocidental, sobre ele há uma lista de piadas e muitas orações. O nome Pedro, sabe-se, figura entre os mais apelados e perfila junto a três outros no topo das preferências. Por certo, a evocação da idade avançada lhe garante destaque posto ser universal o respeito aos idosos. Mas também, Pedro é aclamado como protetor dos nadadores, banhistas, viajantes de navios. Sim, além da óbvia referência aos velhos, ele é ligado a água.

É fácil justificar os vínculos de São Pedro com os pescadores pelo fato dele ter sido um deles, mas não só. Também por uma fantástica passagem bíblica onde Cristo apareceu em mar revolto, andando por sobre águas, os embarcados discípulos, amedrontados, pediram comando de Pedro que, perguntando para a intimidante figura quem era, sabendo ser Jesus, demandara que ele também pudesse fazer o mesmo. Autorizado, já sobre as águas, ao sentir um vento fortíssimo, Pedro questionando a eficácia do Mestre começava afundar. Mediante o acontecido Cristo teria dito que Pedro fraquejara na fé, mas, clemente, mesmo assim, o salvou. E não falta iconografia saudando as longas barbas brancas do santo sublimado. Nessa linha, aliás, reina a tela de El Greco, pintor que viveu o ambiente barroco espanhol e legou uma das imagens mais exuberantes do santo, pintado com o rosto emagrecido no jogo claro escuro e Madalena ao fundo. Pedro também foi imortalizado por pintores do quilate de Caravaggio, Rubens, Rembrandt e principalmente Velásquez com o impressionante “Lágrimas de São Pedro”. Isso sem esquecer do nosso Portinari, é claro. Ainda no campo visual, temos a espetaculosa estátua de São Pedro no túmulo do Papa Júlio II, em Roma, feita por Michelangelo, mas talvez a mais imponente seja a de Bernini no conjunto das imagens dos apóstolos na Praça de São Pedro.

Símbolo da fé e religião para os católicos

Nada, porém, marca mais a presença de Pedro que as famosas chaves. Ainda que em muitos casos se fale de uma só, muitos contam três. Por uma ou outra versão, São Pedro “das chaves” tornou-se importante símbolo do Cristianismo. E, diga-se, as chaves, para os católicos, significam o poder dado por Cristo, poder esse estendido aos sucessores, Papas. Significando a possibilidade de abrir ou fechar as portas do céu, há também referências a outros cadeados. Nesse sentido, diz a lenda que há uma chave de ouro que simboliza o poder espiritual que abre o céu. A outra de prata significando o poder temporal e a autoridade, na Terra, dos Papas, sucessores de Pedro, aliás, esse atributo está registrado no Evangelho de Mateus 16:19 que diz “Eu te darei as chaves do reino dos céus; o que ligares na terra será ligado nos céus, e o que desligares na terra será desligado nos céus”, e, finalmente a chave de ferro que simboliza a justiça e o poder de julgar e condenar os pecadores que não se arrependem.

A missão de São Pedro

Se me perguntassem qual passagem mais me impressiona da história de Pedro, sem dúvida diria que a referência ao papel de São Pedro negando Cristo. Durante a Última Ceia, Jesus declarou que os discípulos iriam se dispersar pela possível condenação dele. Arrogante, Pedro disse que nunca o abjuraria, mesmo que todos os outros o fizessem. Olhando para Pedro, Jesus foi fatal “Em verdade vos digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, três vezes me negarás”. Mediante a prisão de Cristo, interrogado Pedro por três vezes negou ser discípulo. O importante é que na última vez um galo cantou sonoro, e isso foi bastante para o arrependimento. Mais interessante é que essa passagem rendeu ao galo o símbolo da vigilância e da misericórdia de Deus.

Pois é, aprendendo algo sobre o “Porteiro do céu”, resolvi entender brasileiramente o sentido de São Pedro e mediante o currículo dele me autorizo pedir uma coisinha: já que ele é uma espécie de guardião das águas, dos peixes, nadadores e viajantes do mar, não caberia deixar que “tubarões” dos negócios imobiliários privatizem nossas praias, cobrando dos banhistas. Bem que poderia usar suas chaves para, mais que lhes trancar a porta do céu, abrir as do inferno para essa gente. Aliás, viva ele, São Pedro. E que nas próximas eleições continue nos salvando do tormentoso mar dos que usam o nome do Senhor para naufragar a democracia…