Renato Feder, secretário da Educação de São Paulo e ex-do Paraná, e o governador Tarcísio de Freitas
O que parecia ser um debate sério era coisa muito feia
No início de agosto, o secretário de Educação de São Paulo, Renato Feder, anunciou que as escolas públicas do estado abririam mão dos livros didáticos impressos do programa federal, entrando na modernidade do material eletrônico.
O doutor deu-se ao luxo de criticar os livros do Ministério da Educação, chamando-os de “rasos e superficiais”. Faltava dizer quem analisou as obras. Faltava dizer também:
1) Que a empresa da qual Feder é acionista tinha negócios com a secretaria.
2) Que dezenas de milhares de alunos não têm dispositivos capazes de acessar a internet.
3) Que mais da metade das escolas da rede pública não tem equipamento para imprimir as apostilas eletrônicas.
Parecia que Feder abria de forma truculenta e inepta um debate que algum dia haverá de chegar: o uso de livros eletrônicos na rede pública. Parecia, mas era ilusão. A modernidade de Feder, endossada por Tarcísio, era apenas uma cobertura para a estupidez.
O repórter Gabriel Mansur revelou que um slide de aulas para alunos do 9º ano informava que Dom Pedro II assinou a Lei Áurea e que “em 1961, quando ele era prefeito de São Paulo”, Jânio Quadros assinou “um decreto vetando o uso de biquínis nas praias da cidade”.
Em 1961 Jânio era presidente, ele nunca proibiu o biquíni, e São Paulo não tem praia.
Quem assinou a Lei Áurea foi a Princesa Isabel. Em maio de 1888, Dom Pedro II estava em Milão, entre a vida e a morte.
Erros desse tipo não deveriam ser cometidos pelos autores patrocinados pela Secretaria de Educação. Admita-se que um autor jejuno enganou-se, o que não é pouca coisa. Ninguém leu os textos errados, coisa que não acontece com os livros do MEC. Rasa e superficial é a gestão de Feder.
Do alto de sua prepotência, a secretaria disse que afastou os responsáveis. Só faltava que os mantivesse. Feder é quem deveria ser afastado, até que explicasse quem colocou essas besteiras nos slides e por que elas não foram corrigidas.
O governador Tarcísio de Freitas formou-se pelo Instituto Militar de Engenharia em 2002, quando o Brasil já havia se livrado da maluquice da reserva de mercado para a produção de computadores. Meia dúzia de militares e algumas dúzias de espertalhões haviam criado um regime pelo qual era mais fácil entrar no país com um quilo de cocaína do que com um laptop. O que parecia ser uma reserva de mercado era apenas uma mamata destinada ao fracasso. Tarcísio de Freitas sabe disso.
A entrada de material didático em plataformas eletrônicas é coisa séria, desde que os alunos tenham acesso aos equipamentos necessários. O que se tentou em São Paulo foi outra coisa. Livros impressos não precisam de manutenção. Plataformas eletrônicas precisam, e o doutor Feder sabe disso.
Uma plataforma eletrônica capaz de dizer que São Paulo tem praia e Dom Pedro II assinou a Lei Áurea é capaz de coisas que só um ex-aluno do IME pode imaginar. Sobretudo se, no serviço público, ele participou de uma faxina parcial na burocracia de transportes do governo federal.
O que parecia ser um debate sério era apenas estupidez, e o que parecem ser erros pontuais sugere que a coisa é muito mais feia do que se imagina.