Dilma e Lula perderam uma excelente oportunidade para se fingir de mortos depois da estrondosa vaia (clique aqui) que a presidente levou de mais de 60 mil torcedores que lotavam o Arena Corinthians e que por três vezes repetiram o refrão lançado no show do Rappa e repetido, naquela ocasião, por um público estimado em cerca de 40 mil pessoas: “… ei, Dilma, vai tomar no c…” (clique aqui)
Mas, criatura e criador não conseguiram manter a boca fechada. Antes de tudo, é preciso lembrar que a realização da Copa Brasil e sua formatação foram decisões dos governos Lula e Dilma. Vale recordar também que vaias fazem parte da vida política em uma democracia. Dirigentes dos mais variados partidos já foram vaiados publicamente. Os petistas adoravam essa prática quando oposição. Alguma dúvida?
Algumas pérolas da presidente…
No sexta-feira, dia seguinte ao episódio, Dilma disse que não vai se deixar “atemorizar por xingamentos que não podem nem ser escutado pelas crianças e pelas famílias”. O mundo todo assistiu e ouviu as vaias. Foram manifestações espontâneas.
As palavras da presidenta, ao contrário, faziam parte de um discurso de improviso, no dia seguinte, durante a inauguração de uma obra do PAC na capital do Brasil.
Vaias e o discurso foram registrados por gregos e troianos. A única diferença é que o coro ainda ressoava nos ouvido de Dilma quando contra-atacou.
Magoada e raivosa, a presidenta traçou um paralelo com a tortura que o regime militar lhe infringiu nos anos de chumbo (1964-1985): “Eu quero lembrar que eu enfrentei situações do mais alto grau de dificuldade. Situações que chegaram ao limite físico. Eu suportei não foram agressões verbais, foram agressões físicas (…) quase insuportáveis. E nada me tirou do meu rumo. Nada me tirou dos meus compromissos, nem do caminho que eu tracei para mim mesma. (…) Não serão xingamentos que vão me intimidar, me atemorizar. Eu não me abaterei por isso. Não me abato e nem me abaterei”.
… e do ex-presidente
Lula, o criador de Dilma, optou pela condenação do que ele chama de elite letrada. “Não é nem dinheiro nem escola nem títulos de doutor que dão educação para as pessoas”. Embora ausente do estádio onde aconteceu o jogo Brasil 3X1 Croácia, o ex-metalúrgico afirmou que o público daquele jogo seria formado, pelo menos uma boa parte, por pessoas de alto poder aquisitivo capaz de pagar ingressos de R$ 900,00 no mercado oficial. “E não era nenhum pobre. Parece que comeram até demais, estudaram até demais, porque perderam a educação e o respeito”, segundo nota divulgada pelo Instituto Lula.
Sempre que lhe convém e de olho nas eleições de outubro, o ex-presidente faz questão de omitir seu papel na formatação do espetáculo da Copa desde que conseguiu trazê-la para o Brasil. Na mesma linha, ele praticamente nega que parte do povo se encontrava na Arena Corinthians. Trocando em miúdos, para ele, quem critica o governo do PT não pode ser chamado de povo.
Dilma e Lula se merecem
Ao usar como argumento o fato de ter sido presa política torturada pela ditadura, a presidenta perdeu uma grande oportunidade de ficar calada. Se ela ainda tiver algum compromisso com sua história de vida, a ex-militante deveria considerar as vaias do povo muito, mas muito mais duras e doloridas do que sessões de choques elétricos e pau de arara. Eu falo como ex-preso político torturado na OBAN (depois DOI-CODI), no DEOPS e no quartel do 1º Exército da rua Barão de Mesquita, no Rio de Janeiro, perto do saudoso Maracanã.
Dilma, tortura física é refresco perto das vaias que a senhora levou. Tenho certeza que, no fundo do seu coração e de sua consciência política, a militante concorda comigo. Caso contrário, a senhora presidenta não merece qualquer respeito.
Ao partir para o ataque contra o público presente no estádio do Corinthians, o ex-presidente parece ter memória curta (o que ele não tem). Nunca antes na história desse País banqueiros e empresários viveram tão felizes como durante os oito anos em que Lula governou o Brasil. E se ignorância fosse alguma virtude como ele insinua ao atacar os que estudam e “estudaram demais”, ele está cuspindo no próprio prato. Afinal, porque o ex-metalúrgico não comete com a mesma frequência os erros crassos de português que cometia?
por Paulo de Tarso Venceslau
diretor de redação do CONTATO e ex-preso político entre os anos de 1969 e 1974