Quando líder operário, Luiz Inácio Lula da Silva aprendeu a afastar todos que pudessem fazer alguma sombra em seu caminho. Leonel Brizolla, em 1989, diria que ele era capaz de pisar no pescoço da própria mãe se entrasse em seu caminho. Lula, então conhecido como Baiano entre os sindicalistas, chegou lá. Além de criar um nova família – mulher e filhos assinam o sobrenome Lula da Silva – foi deputado federal constituinte antes de chegar ao Palácio do Alvorada como presidente Lula, em 2002. Em 2016, pode se tornar réu a qualquer momento.
Esse caminho vitorioso quase sofreu um tropeço no início dos anos 1980. Naquela época, um metalúrgico nascido em Sertãozinho, no interior de São Paulo, boia-fria aos 10 anos de idade, pedreiro dos 13 aos 27 anos, católico fervoroso e muito ligado aos movimentos sociais, aparecia, desde 1960, como uma expressiva liderança no movimento sindical que combatia a direção pelega que reinava há muito tempo no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, muito mais poderoso que seu similar de São Bernardo do Campo. Chamava-se Waldemar Rossi.
Em 1981 haveria eleição no sindicato paulistano e Rossi era sem dúvida a maior expressão viva de uma oposição sindical capaz de derrotar Joaquinzão, que sempre contou com o apoio explícito da ditadura militar. Rossi já havia disputado o sindicato em 1967 e 1972. Ele encabeçou a primeira chapa da oposição depois da instauração da ditadura, quando se criou o conceito de oposição metalúrgica, oposição sindical. Ele se transforma em uma referência.
Metalúrgico desde 1960, militou na política sindical e teve sua liderança reconhecida na Pastoral Operária, braço da igreja católica identificada com a Teologia da Libertação. Em 1980, foi indicado pelo arcebispo D. Paulo Evaristo Arns para saudar o Papa João Paulo II em sua primeira viagem ao Brasil
Eu estava lá no estádio do Morumbi tomado por mais de 100 mil pessoas naquela noite inesquecível, quando Rossi leu uma breve mensagem e entregou ao pontífice uma carta denúncia sobre as torturas e os assassinatos praticados pelo regime militar e sobre as más condições dos trabalhadores no campo e nas cidades. Emocionado, o Papa lhe deu um caloroso abraço.
Rossi sendo abraçado pelo Papa João Paulo II, em 1980, diante de mais de 100 mil pessoa
Esse gesto foi interpretado como o lançamento de Rossi à disputa pela presidência do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, o maior do Brasil. Porém, em São Bernardo, avaliaram que a vitória de Rossi em São Paulo lançaria uma sombra sobre a liderança de Lula, que, assessorado por Frei Betto, tentou mas não conseguiu ser recebido pelo Papa.
Em 1981, a candidatura de Rossi crescia a olhos vistos, principalmente nos bairros onde operários metalúrgicos participavam ativamente de movimentos sociais católicos.
Em outra ponta, o metalúrgico Aurélio Peres, militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), que tentava minar a força da candidatura de Rossi, lançou-se na disputa pelo sindicato. No confronto entre os três candidatos – Joaquinzão, Rossi e Peres -aconteceu o previsto: haveria um segundo turno com a participação dos dois primeiros colocados.
Nos bastidores, os comunistas até então de linha albanesa decidiram não apoiar nenhum dos dois. Em São Bernardo, os dirigentes optaram por fazer letra morta o apoio formal e burocrático. A enorme franja de operários metalúrgicos que reside na fronteira do ABC com a capital paulista pouco ou nada viu ou ouviu de campanha.
Eu não tenho a menor dúvida que o apoio de Lula naquele momento era mais que suficiente para eleger Rossi no primeiro turno. Mas até hoje ninguém sabe o que foi tratado nos conchavos e muito menos os acordos feitos entre Lula et caterva do recém criado PT e os comunistas do PCdoB.
Em Sampa, o MOMSP (Movimento de Oposição Metalúrgica de São Paulo) tentou por todos os meios derrotar Joaquinzão, mas não conseguiu. Sentindo o peso de seus adversários, Joaquinzão preferiu perder os anéis para não perder os dedos e sacramentou uma aliança sólida com o velho Partidão (PCB), com o MR8 e atraiu também pelo menos parte do PCdoB.
Rossi continuou militando na oposição metalúrgica, ajudou a fundar a CUT em 1983 e só depois se filiou ao PT para em 1986 disputar a eleição para deputado federal. Sem a força da máquina sindical, não conseguiu ser eleito, ao contrário de Lula que se tornou um dos constituintes em 1988.
Em 1989, foi indicado pela prefeita Luiza Erundina para o cargo de administrador regional, que ele exerceu por 4 anos.
Em 2004, Waldemar Rossi desfiliou-se do PT por não concordar com a linha política do partido no governo federal.
Católico fervoroso e cumpridor de suas obrigações religiosas
Após missa de corpo presente celebrada na Catedral da Sé pelo bispo emérito dom Angélico Sândalo Bernardino, foi cremado na quinta-feira, 05, o corpo do líder metalúrgico que poderia ter imprimido outro rumo ao PT, ao movimento sindical e quiçá à politica nacional. Estou convencido que só não o fez por que Lula tudo fez para impedi-lo. E conseguiu.