Por
Beti Cruz
betibia@ig.com.bt
uando
atendia o telefone e uma estridente voz de radialista perguntava
se era a Maria Laura, eu já sabia. Tratava-se do
Bauru querendo falar com o Zé Geraldo. Ele sempre
confundia minha voz com a de mamãe. Papai conversava
com ele dando risadas e falando alto. Quase sempre vinha
o convite para uma festa.
Embora os jovens também estivessem incluídos,
não dávamos muita importância. Nossos
programas pareciam mais interessantes do que festa de coroas.
Não íamos. No dia seguinte, ouvindo os relatos,
nos inteirávamos de que a tal festa tinha sido de
arromba. Até grupos de escolas de samba apareciam
para animar.
Uma vez, resolvi aceitar e não me arrependi. No amplo
apartamento da avenida Higienópolis não cabia
mais nem uma mosca. Alegres e elegantes convidados bebiam
e conversavam na maior animação. Gente da
sociedade, do rádio, da televisão. Alguns
deles deram-me atenção, trocando idéias
comigo. Na hora de apagar as velinhas, Bauru chamou-me para
ficar junto dele. Soube que era meu aniversário e
quis homenagear-me também. Senti-me honradíssima.
Quando as luzes se apagaram, surpresa! Do elevador saiu
um grupo cantando parabéns ao som de violões.
Depois, deram um show que todos acompanharam, afinados ou
não. Marchinhas de carnaval, velhas canções,
músicas de dor de cotovelo... Jovenzinha ainda, não
imaginava que os “velhos” pudessem divertir-se
daquela maneira.
Bauru era um coroa especial. Radialista, “a voz”
do Repórter Esso, sempre agitado e falante, monopolizava
atenções onde quer que estivesse. Era amigo
de papai desde os tempos da faculdade de direito no Largo
São Francisco. Na década de trinta, eles costumavam
freqüentar o Ponto Chic, um bar onde os estudantes
se reuniam no Largo Paissandu. Casemiro Pinto Neto, seu
verdadeiro nome, pedia então ao garçon que
fizesse um determinado sanduíche. “Tire o miolo
do pão francês e ponha umas fatias de rosbife,
que preciso de proteína”, ele dizia. “Falta
um pouco de vitamina, ponha rodelas de tomate também”,
continuava. “Agora, derreta uma porção
de queijo e acrescente por cima”. E antes que o garçon
terminasse: “Coloque aí também alguns
pedaços de pepino em conserva para dar o toque picante.”
Sob os olhos admirados dos colegas que babavam a sua volta,
o sanduíche era devorado avidamente. Com água
na boca, os rapazes começaram a pedir um igual ao
do Bauru. Tanto pediram que virou marca registrada da casa.
Com o passar dos anos, sua fama correu a cidade. Outros
bares incluíram este sanduíche no cardápio
e ele espalhou-se por todo o Brasil. Não há
boteco ou lanchonete em qualquer parte deste país
que não faça o bauru, agora modificado, com
presunto no lugar do rosbife e sem pepinos, mas guardando
sempre o mesmo nome. Atualmente, virou até pastel
em barraca de feira.
Assim como meu pai e tantos outros que lá estavam
naquela noite inesquecível, o velho Bauru já
se foi, deixando-nos como herança seu famoso sanduíche.
Entretanto, a receita original criada pelo estudante vindo
do interior, o Ponto Chic faz questão de conservar
até os dias de hoje. Pode ser saboreado na matriz
do largo Paissandu ou em uma das três filiais: em
Perdizes, Moema ou Paraíso. É uma delícia!
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