Foi
assim: andava com saudade de alguns amigos e lutava comigo
mesmo pela falta de tempo para as tais “coisas boas
da vida”. Batia bastante em minha consciência
perguntando-me por que me aposentei e ando mais ocupado do
que nunca? Confesso que era um embate profundo, pois colocava
em pauta razões éticas do tipo: qualidade das
relações pessoais e humanas, respeito ao meu
próprio passado, direito de satisfação
pessoal.
Enfim, isto ocorria enquanto esperava meu computador abrir
todos os programas até chegar à povoada caixa
de mensagens. Para surpresa, entre tantas outras, havia uma
enviada exatamente por um dos personagens do inventário
saudoso. E dizia seu texto companheiro: “dia 3 minha
mulher vai lançar o livro ‘Totalmente grávida’,
se der apareça” e assinava, Mateus. Mateus é
o [Matthew] Shirts que escreve no Estadão às
segundas-feiras e dirige a Revista Geografia Nacional (recuso-me
a citar o nome em inglês), meu querido ex-aluno, pessoa
angular em minha vida, confidente de um passado que costurou
momentos excelentes e outros difíceis [Shirts é
norte-americano apaixonado pelo Brasil onde vive há
quase 3 décadas].
Complicado que sou, outro problema se abria: quero ir, mas
por causa dele ou dela? Vejam que este “teorema”
me é complexo, pois escritor nunca gostei que as pessoas
fossem aos lançamento de meus trabalhos por motivos
outros que não eu ou o meu livro. Mesmo sem resolver
o dilema, fiz um esforço enorme e fui. Mudei agenda,
menti para desviar outros compromissos e me toquei do Rio
para São Paulo.
Sabedor de que nestas situações deve-se chegar
sempre um pouco atrasado, dei um tempo no elegante shopping
center e fiz a entrada quando o público já era
denso. Primeiro, fiquei de longe observando, depois, vendo
alguns amigos caros aproximei sendo agraciado com coisas do
tipo “nossa, como você engordou!”, “está
mais careca”, “olha só esta barriga”...
Mas como foi bom abraçar o Mateus! Ele foi mais do
que simpático e, contornando outros convidados, ficou
mais tempo comigo do que deveria. Trocamos as confidências
cabíveis, falamos de amigos comuns, do passado e da
implacável fatalidade do tempo sobre nossos destinos.
Mas fui para um lançamento (também). Conheci
a simpática Luli e com o exemplar autografado saí
para tomar um café. Devo dizer que estava muito emocionado.
Fiquei de voltar logo, mas sentei-me e me perdi na leitura
do livrinho de poucas e pequenas páginas. É
lógico que me armei antes de começar: ih! deve
ser destes escritos tolos, sem conteúdo. Nada! Foi
a maior surpresa. O texto é um achado. As quase 100
páginas foram devoradas em menos de meia hora.
A lógica da proposta é exposta de maneira simples
e direta logo de saída. Li novamente e comparei a alegria
dos dizeres rápidos com a graça das gravuras,
também feitas pela autora. Como texto testemunhal,
a dedicatória não poderia ser mais explícita:
“A todas as gestantes que consideram a gravidez um assunto
sério, seriíssimo... mas sem perder o humor”.
O mais longo texto tem vinte linhas e diz a que veio “todos
os livros que encontrei só tratavam de dois aspectos
da gravidez. Ou eram depoimentos que mais pareciam anúncio
de margarina, com tudo muito lindo, tudo muito mágico,
ou então eram conselhos médicos, ‘veja
bem, estamos entrando na segunda metade da vigésima
quinta semana, o bebê está precisando de potássio,
alô, mamãe, que tal comer mais banana?”
e daí por diante a narrativa decorre fluída,
leve sem perder a profundidade. E mantém-se cheio de
picardias.
Resisti voltar para uma despedida mais condizente com o prazer
do encontro, mas detive-me, tudo tinha sido tão perfeito
que resolvi sair do café e ir direto para a casa onde
me hospedo. Não valeria a pena colocar mais nada naquele
quadro entre nostálgico e bonito, confortante e emotivo.
Valho-me desta crônica para uma explicação
e um conselho. Explicação aos caros Mateus e
Luli – pela saída louca – e para os leitores
que saboreiem o “Totalmente grávida”, publicado
pela Publifolha. Ah! Se mais alguma coisa cabe dizer é
que busquem algum velho amigo. E o abrace por mim. Caso a
visita seja para uma grávida – ou candidata a
tal – leve este texto de presente.
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